OS MONGES MALDITOS
CAPÍTULO XIV
KADOSH - OS GUERREIROS DA LUZ
João Anatalino Rodrigues
Jacques de Molay passara a vida sonhando com um reino templário. Esperava, ainda em sua gestão, que esse desejado projeto pudesse ser efetivado. Tudo já estava pronto e planejado para declarar parte da região do Languedoc como território autônomo, governado pelo Templo.
Sabia que iria encontrar resistências. A Igreja reagiria, Filipe, o Belo, também não iria entregar docilmente parte de seus domínios, nem gostaria de ver um estado hostil encastelado nas suas próprias entranhas. Nem o rei de Aragão, senhor de alguns feudos naquele território, iria gostar disso. Mas de Molay acreditava que a força militar do Templo, a sua riqueza e a fama de grandes guerreiros que seus cavaleiros haviam adquirido acabariam por triunfar.
Se ele fosse um pouco mais estudado, pensou, ou tivesse se preparado juridicamente para a situação, contratando bons advogados, como fizera o Hospital, por exemplo, estaria agora melhor armado para responder ás acusações de Nogaret e suportar, com mais firmeza, às invectivas de Guilherme de Paris.
Mas logo se conformou e abandonou esse pensamento. Fossem ou não verdadeiras as acusações de heresia que se fazia contra a Ordem, essa era apenas uma desculpa. Na verdade, o móvel de tudo isso era a própria Ordem, o seu poder político e econômico e sua imensa riqueza material. O Grão-Mestre rememorou todas as negociações das quais participara nos últimos dois anos, a proposta do papa, de fusão das Ordens militares, a tentativa de Filipe o Belo, de colocar um de seus filhos na Irmandade, a “bola preta” que ele dera nessa pretensão, os ensaios jurídicos produzidos pelos advogados do rei, justificando a supressão do Templo, as próprias queixas feitas por vários prelados da Igreja contra os Templários, de que eram usurários, agiotas, autoritários e violentos e que gozavam de privilégios injustos, que ás demais Ordens eram negados. E concluiu que a razão de tudo o que estava acontecendo se devia á cobiça de Filipe, o Belo, e fizesse ele o que fosse nada se alteraria.
Ainda assim, lamentou não ter dado ouvidos aos sinais de perigo. Ficara encastelado no poder que lhe conferiam os estatutos da Ordem, na independência que lhe dera a Igreja, na proteção que pensava vir do Vaticano. Afogara-se no próprio poder que pensara que tinha. Já não podia salvar os dedos, mas no caso, talvez os anéis fossem mais importantes. Por isso aquela decisão de salvaguardar o tesouro do Templo. Com ele a salvo, haveria uma esperança de sobrevivência.
Jamais imaginara que o aríete que romperia as muralhas do Templo seria a questão religiosa. Nunca dera muita importância a isso. Até porque ele se julgava um católico devoto. Sempre realizara os sacramentos exigidos pela Igreja e jamais renegara qualquer um deles e nem tampouco qualquer artigo de fé. Os juramentos que fizera ao ingressar na Ordem, os rituais que se obrigara a praticar, a doutrina que jurara acreditar, era, para ele, uma coisa profissional. Algo assim como o código de ética de um médico, um juramento de soldado profissional, a profissão de fé de um funcionário público quando é nomeado para uma função. O juramento, bem como os rituais extravagantes que se praticavam na iniciação e depois as idéias e as crenças que se disseminavam no interior da organização eram o que se podia chamar de disciplina interna corpus. Faziam parte do corpo doutrinário da Ordem e vinculavam-se á sua profissão de monge templário. Ele não achava, na inocência da sua alma de homem simples e devoto, que tudo aquilo fosse contrário á verdadeira fé. Afinal qual era a importância de Jesus ter, de fato, morrido na cruz ou não? E se não ressuscitou de verdade, no que isso mudaria a sua fé? Um homem precisa ser um Deus para que as pessoas acreditem nele? Ele pensava que não. Aprendera isso com os muçulmanos. Eles não consideravam Maomé um Deus. Ele não era parte de uma família divina, como os cristãos acreditavam que Jesus fosse. Maomé não nascera milagrosamente de uma virgem. Não fizera milagres estupendos. Não se entregara ao carrasco como moeda de troca de um estranho convênio entre Deus e o Diabo, num processo de salvação que ninguém conseguia explicar a contento.
Maomé era apenas um profeta. O maior de todos, diziam os muçulmanos. Mas ainda assim, era apenas um homem, que nasceu como todo mundo, viveu como todo mundo, sofreu e gozou como todo mundo e finalmente morreu como todo mundo. Os muçulmanos diziam que Deus o arrebatou em carne e sangue para o céu, como os judeus diziam que Jeová havia feito com Enoque e Elias, e os cristãos com Jesus, mas isso, se verdade fosse, seria um prêmio por sua conduta de homem justo e mensageiro da palavra divina, e não porque fosse um Deus encarnado. E os muçulmanos lutavam por ele com mais ardor até que os cristãos lutavam por Jesus.
Assim também era com os judeus. Moisés era apenas e tão somente um profeta. Deus o escolhera para criar, entre as nações
da terra, uma espécie de matriz da humanidade que Ele queria desenvolver. Isso ele podia entender. Na teologia judaica, Deus era como um criador, um fazendeiro que seleciona entre seus animais uma matriz, cultiva-a, trata-a, aperfeiçoa, para que dela se possa derivar uma raça melhor. Mas não se envolvia pessoalmente com ela. Encarnar então... Isso sim, para os judeus, era uma heresia sem nome. Equiparar Deus com o homem, transformá-lo em ser humano para ser desprezado, maltratado, espezinhado e morto pela sua própria criação... Essa estranha teologia era difícil de entender. Os judeus diziam que Jesus fora condenado e morto por reivindicar os direitos de um rei e as qualidades de um profeta, que como Moisés ou Davi, seria um eleito de Deus. Mas seus discípúlos foram mais longe e fizeram dele um Deus. Para os judeus, o cristianisno incorria na mesma heresia que eles atribuiam aos romanos, que davam foros de divindade ao seu imperador.
Sim, ele tinha dificuldade para entender por que Deus, sendo soberano, onipotente e único, tinha deixado que sua criação se perdesse, se maculasse, se rebelasse e depois tivesse que mandar seu próprio filho para salvá-la, a custa de tanto sofrimento e do próprio sangue. Deus, sendo onipotente, poderia fazer isso com um sopro da sua boca ou um balançar da sua cabeça. Porque usaria uma estratégia tão complicada? Ele podia entender que os homens se sacrificassem pelos bens que desejavam, pelas coisas que acreditavam. Os homens eram humanos, precisavam realizar ações pessoais para se sentirem vivos, necessários, importantes. Mas Deus precisaria fazer isso também?
Se Deus era o poder do bem, porque a humanidade era intrinsicamente tão má? Talvez a humanidade não fosse realmente cria do Deus bom, mas sim de uma entidade malévola, que para contrastar o poder de Deus, criou o homem. Sim, ele ouvira dizer que Deus criara os anjos, cujas almas eram feitas de pura luz. Mas ai outro Deus, o Deus mau, que vive nas trevas, capturou uma centelha dessa luz e encerrou-a na matéria, fazendo o ser humano. Assim o homem era um corpo, feito de trevas, e uma alma, feita de luz. Por isso os antigos mestres ensinavam que só existia salvação para o homem que conseguisse libertar seu espírito da matéria e voltando ao estado de pura luz, pudesse unir-se novamente com Deus. Ninguém poderia fazer isso pelo homem. Fé nenhuma sobre a terra seria capaz de libertar uma alma aprisionada na matéria, mas somente o conhecimento desse fato e a prática do desapego consciente e ritual desse estado de prisão espiritual em que se vive, poderia operar esse milagre. Destarte, nenhuma Igreja, nenhum profeta, nenhum padre, nem mesmo um Deus encarnado poderia fazer isso pelo homem, mas somente ele mesmo com seu conhecimento e seu livre arbítrio. Essa era a doutrina praticada pelos franciscanos, os “Pobres de Deus” que os bispos e as demais Ordens monásticas tanto odiavam porque desprezavam a riqueza que os bispos e os prelados de Roma amavam. Isso era também o que pensava o santo Bernardo de Clairvaux, quando escreveu as regras do Templo. Pelo menos era o que diziam os mestres e assim Jacques de Molay acreditava que fosse. Pobreza, castidade, virtude, desapego aos bens materiais, eram a chave para se entrar no Reino dos Céus.
Nem mesmo Jesus, pessoalmente, podia fazer isso por homem nenhum. O Reino dos Céus só podia ser alacançado imitando o seu exemplo. Afinal, se fossem mesmo verdadeiras aquelas informações que os altos dignatários da Ordem recebiam nas passagens de grau pelos Capítulos mais avançados, Jesus fora um homem comum. Nascera como todo e qualquer ser humano ─ de uma semente masculina lançada em útero feminino ─ sem qualquer intervenção divina. Aquela relíquia, que eles adoravam em seus Capítulos mais avançados, era a prova da humanidade de Jesus, e da sua morte. Ressurreição, se houve, foi somente em sua forma espiritual. O homem que os apóstolos viram, e que ficou com eles durante algum tempo e depois desapareceu, não era de carne e osso, mas sim um espírito. O homem Jesus estava tão morto quanto qualquer outro homem. Eles sabiam disso, porque tinham a prova inconteste em suas mãos. Mas não podiam mostrá-la para mais ninguém, pois toda fé a cristã, construída em cima do mistério da ressurreição, seria destruida. Não, o Templo ainda não estava preparado para substituir a Igreja. Em um futuro próximo, quem sabe..
Jesus fora um principe e pelo direito que lhe conferia o sangue da família, a linhagem de Davi e Salomão, tinha o direito a reinvidincar o título de rei de Israel, a nação modelo de Deus. Mas, em tudo isso, só havia mesmo a questão política a justificar a sua reivindicação a um reinado sobre a terra. Foi por isso que ele morrera, sem conseguir realizar a sua missão. O seu projeto de um reino messiânico havia sido abortado pelo poder de Roma e pela inveja dos sacerdotes judeus.
Implantar esse reino mil depois. Fora essa a motivação dos verdadeiros fundadores da Ordem do Templo, Geoffroy de Boillon e Bernardo de Clairvaux.
O Reino de Jerusalém, fundado pelos cruzados deveria ser o prometido reino do Messias sobre a terra. Foi com essa motivação que os francos, sob o comando do Duque de Lorena, Geoffroy de Boillon, e com o apoio da própria Igreja, marcharam sobre Jerusalém na primeira cruzada. Jerusalém seria o centro desse reino messianico, governado por um rei da linhagem de Jesus e guardado e defendido pela Milícia de Cristo. Mas esse plano falhara. Os cristãos haviam sido expulsos da Terra Santa e os Mestres do Templo, cuja vida foi dada por esse ideal chegaram á conclusão que Jesus foi um homem comum, que viveu e morreu por um belo ideal, mas ainda assim, apenas um ideal, tão humano quanto fora a utópica teocracia de Moisés e o lendário reino de Salomão. Jesus fora tão impotente para salvar os cristãos quanto Maomé o fora para salvar os muculmanos por ocasião do cerco de Jerusalém...
Jacques de Molay sabia que não podia revelar esses pensamentos a ninguém que não pertencesse ao seu grau na Ordem. E muito menos fora da Ordem. Eles o perderiam. Quanto á sua própria conduta pessoal, porém, estava tranquilo. Não se lembrava de ter realizado qualquer ato que o envergonhasse. Mantivera os votos de castidade que fizera por ocasião de sua iniciação. Jamais tocara em mulher e nem se juntara a qualquer Irmão em atos contra a natureza, como estavam agora sendo imputados aos Templários. Ele mesmo, inclusive, tinha sido acusado de praticar atos de sodomia com noviços por ele iniciados.
Por certo que ele não ignorava que em muitos mosteiros e conventos esse tipo de comportamento costumava acontecer. A regra do celibato, adotada pela Igreja, colocava muitas pessoas do mesmo sexo para viverem juntas, em regime de claustro. Nem todos tinham fortaleza de alma suficiente para suportar os apelos da carne. Assim, era bem possível que alguns Irmãos tivessem sucumbido á fraqueza. Mas ele não. Para ele, a acusação de sodomia era uma difamação imperdoável. Era uma ofensa que devia ser lavada com sangue, em ordálio. Pena que não lhe fosse permitido desafiar Guilherme de Paris, ou mesmo o ministro Nogaret, para o julgamento de Deus, através de um combate singular na liça.
Imerso em seus pensamentos, Jacques de Molay nem havia prestado atenção na argola de ferro que o carcereiro havia aferrolheado em volta dos seus tornozelos. Era a primeira vez que lhe punham aqueles grilhões. Até aquele momento, desde que fora preso no dia treze de outubro, seus carceireiros não haviam tomado aquela medida, usual para um prisioneiro que era lançado em uma masmorra. Por isso, o Grão-Mestre do Templo não tinha ainda se dado conta da miserabilidade da sua situação. Ainda tinha a esperança de que tudo não passasse de um conflito gerado por uma política mal formulada, o qual seria logo resolvido com os naturais conchavos que se fazem em casos como esse. Se fosse o caso, confessaria as práticas estranhas que se imputavam á Ordem e pediria penitência por isso. O papa o perdoaria e ele seria reintegrado ao seio da Madre Igreja. Isso era praxe nesses casos de desvios doutrinários, onde o pecador reconhecia a sua desorientação, pedia perdão e reingresso na familia católica. Não seria condenado como relapso. Não se tratava de uma questão de fé. Havia ali um objetivo maior que precisava ser atingido. A Ordem, seus planos, seus segredos e sua doutrina precisavam ser preservados. Ainda que a custo de perjúrio e conchavos.
O rei Filipe desejava a ajuda dos Templários para a realização de suas ambições de líder político no continente. Pois bem, ele poderia tê-la. Queria também o dinheiro do Templo para ajudá-lo a recompor as combalidas finanças do reino. Isso também não era problema. Afinal de contas, tudo isso poderia ainda trazer bons frutos para a Ordem. O papa Clemente V desejava fundir a Ordem do Templo com o Hospital de São João. Pois bem, ele não se oporia mais á essa medida. O Templo era mais poderoso que o Hospital. Com certeza logo o absorveria. Assim, naquela noite, Jacques de Molay foi dormir com alguma esperança. Afinal, nem tudo parecia estar perdido.
Mas logo acordou porque sonhou com o papa Bonifácio VIII. O velho Pontífice estava em seu quarto, em seu leito de morte e lhe acenava uma mão de moribundo, como que pedindo socorro. Mas de Molay não lhe estendeu a mão, tomado por um mudo e paralisante torpor. Logo em seguida, Filipe, o Belo, entrou no quarto, puchou a mortalha sobre a cabeça encanecida do velho papa e soltou uma risada de demônio zombeteiro, que lhe congelou o sangue nas veias.
Jacques de Molay acordou suando por todos os poros. Seus punhos e tornozelos, presos em argolas de ferro, chumbadas á parede, doiam. Friccionou-os com as mãos compridas e ossudas, fazendo o sangue circular. Um arrepio percorreu todo seu corpo ao recordar o sonho. Não podia deixar de sentir uma pontinha de culpa pela desgraça que se abatera sobre o velho Pontífice. Veio-lhe á memória o último diálogo que travara com ele, em fins de 1302, quando o exército Templário voltara derrotado da Terra Santa, após perder a fortaleza de Rwad, na Síria, abandonando aos sarracenos os últimos domínios cristãos na Terra Santa.
– A Ordem do Templo, meu filho ─ dissera-lhe o papa Bonifácio VIII ─ foi fundada para defender os Lugares Santos. Agora que os cristãos já não tem quase nenhum domínio na Terra Santa, talvez seja a hora de repensar as obrigações da Irmandade.
– O fato de termos perdido momentaneamente os nossos territórios na Terra Santa não significa que devemos abandonar a luta para a realização dos nossos ideais – retrucara o Grão-Mestre, pensando, não nos territórios perdidos no Oriente, mas nos próprios objetivos secretos do Templo e na idéia que tinha na cabeça, de um reino Templário na Europa.
– Pensa então que será possivel recuperar os territórios cristãos na Palestina? – perguntou, incrédulo, o papa.
– Sim, Santidade. Com a ajuda dos mongóis, seria possivel uma reconquista ─ disse de Molay, aproveitando uma idéia que lhe havia sido sugerida pelo rei Filipe, o Belo, de uma coalizão com os mongóis para lutar contra os sarracenos. Para ele era uma manobra diversionista, destinada a manter o interesse do papa no assunto.
O papa franzira a testa. – Agora a cristandade precisa se aliar aos infiéis para realizar os seus objetivos? ─ perguntou, com certa amargura.
– Não creio que nenhum reino cristão tenha, neste momento, condições econômicas e militares para iniciar, sozinho, uma nova cruzada – respondera de Molay.
O papa estava pensando na queda de Acre, a última possessão dos cruzados na Terra Santa e na descrição jereminiana que um frade dominicano, testemunha daquele massacre, escrevera naquela oportunidade: “Chorai, sobre vossos chefes, que vos abandonaram. Chorai sobre vosso papa e vossos cardeais e prelados e sobre o clero da Igreja. Chorai sobre os vossos reis, príncipes, barões e cavaleiros cristãos, que se chamam a si mesmos de grandes combatentes, mas deixaram esta cidade repleta de cristãos sem defesa e abandonaram-na, deixando-a só como um cordeiro no meio de lobos.”
O padre que escrevera essa lamentação atribuia a derrota dos cristãos à ausência de firmeza moral e ao enfraquecimento da fé, que principalmente os cavaleiros das duas Ordens militares tinham mostrado nessa ocasião. A queda de Acre e Tripoli foi computada á falta de fervor dos cavaleiros cruzados nos combates e ás disputas pelo poder, que os Templários travavam com os Hospitalários.
Foi então que surgira, dentro da Igreja e fora dela, o movimento para fundir as duas Ordens. Essa proposta tinha sido feita originalmente pelo papa Nicolau IV e sido bem aceita por toda a cristandade, mas a morte daquele Pontífice e as manobras dos Grãos-Mestres do Templo e do Hospital, ciosos de sua independência, haviam torpedeado esses planos. Principalmente porque o plano previa que com a fusão das duas Ordens, uma nova cruzada fosse financiada pelo tesouro de ambas.
– Os mongóis odeiam os sarracenos tanto quanto nós – dissera Jacques de Molay ao papa Bonifácio VIII, naquela ocasião. – Se conseguirmos agora levantar um exército para apoiá-los, com certeza eles nos devolverão Jerusalém e poderemos retomar Tortosa, para dali iniciarmos uma nova guerra de reconquista.
Mas estava-se em dezembro de 1302 e naquele momento, a unica preocupação de Bonifácio VIII era a sua briga com Filipe o Belo, rei de França, que havia desdenhado e refutado a sua bula, Unan Sancten, na qual o chefe da Igreja reclamava a “supremacia pontificia sobre todos os reinos da cristandade, para salvação de todas as almas.”
O conflito entre o rei Filipe e o papa Bonifácio VIII adiara também os planos dos Templários, de declarar sua independência e fundar um estado independente no Languedoc. Para o Grão-Mestre do Templo era interessante que esse conflito se acirrasse e que as tropas do Vaticano e do rei francês acabassem se encontrando em um confronto armado. Assim, nenhum dos dois teria força nem condições para enfrentar o Templo. Mas a inesperada fraqueza do papa e a sua incapacidade para enfrentar Filipe deixara de Molay sem ação.
Jacques de Molay sentiu que a oportunidade de fundar um reino Templário havia passado. O reino dos Irmãos da Pureza, o Ikhvan-es-Safa, dos cavaleiros Kadosh, sagrados, perfeitos e puros, como Tinturel, Galaad, Lancelot e Percival, heróis dos romances de Cavalaria, e arquétipos inspiradores dos próprios Cavaleiros Templários, era mais um sonho adiado. Mas não definitivamente morto.
Agora, talvez fosse a hora de recuar para salvar a Ordem. Depois, quem sabe...
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