sábado, 9 de setembro de 2017



UMA PALAVRA SOBRE ALQUIMIA


Por João Anatalino (Recanto da Letras)

Cabe aqui uma palavra sobre a alquimia. Simultaneamente arte, técnica e ciência do espirito, essa misteriosa ocupação tem desafiado a argúcia dos historiadores, provocado perplexidade nos cientistas e alimentado a imaginação dos amadores do insólito desde tempos imemoriais. Fonte inesgotável de tesouros literários, rendeu algumas obras primas da literatura mundial, entre os quais o clássico de Rabelais, As Aventuras de Gargântua e Pantagruel. Segundo alguns autores, os romances do Graal são alegorias alquímicas que procuram transmitir aos adeptos da arte de Hermes o seu magistério. Inspirou também famosos contos de fadas, como O Gato de Botas, Ali Babá e os Quarenta Ladrões, O Pequeno Polegar, As Viagens de Guliver, etc.e algumas boas obras modernas como as estórias de Harry Potter, O Alquimista, de Paulo Coelho, os Cem Anos de Solidão de Gabriel Garcia Marques e outros. Segundo Pawels e Bergier, mais de cem mil livros foram dedicados a essa prática, o que no mínimo a eleva a fenômeno cultural dos mais significativos.[1]

Somente essa constatação já nos parece suficiente para que a alquimia não seja levada na conta de pura divagação de espíritos fascinados pelo fantástico. Hoje não se tem muita dúvida que se trata de uma técnica, cuja origem está na prática da metalurgia antiga - prática essa, como bem demonstrou Ambelain - de caráter sagrado. Tanto na China, com os taoístas, como no Egito dos faraós, com os sacerdotes de Heliópolis, ou na Grécia clássica, com os filósofos naturalistas, foram as técnicas metalúrgicas, aliadas ao pensamento mágico que elas naturalmente evocam, que deram origem á alquimia. Daí ela se organizou como ciência da natureza e prática espiritual para o desenvolvimento de uma consciência superior.

Os trabalhos de René Alleau e Mircea Eliade demonstraram com muita propriedade que a alquimia, desde a mais remota antiguidade, é uma arte iniciática, associada aos mistérios da natureza.[2] Por isso era praticada pelos sacerdotes egípcios e hindus em seus templos, não só como forma operativa de produção de artefatos preciosos, mas também como disciplina do espírito para atingir o êxtase espiritual. Mais tarde, os filósofos taoístas e gregos a elevaram á nível de disciplina acadêmica, organizando-lhe uma epistemologia própria, fazendo dela uma arte especulativa e empírica ao mesmo tempo. [3]




No Egito essa arte era própria dos ourives, mestres na fabricação do “ouro falso”, como eram chamados os artefatos fabricados com metais comuns, submetidos a banhos dourados para imitar o ouro. Essa atividade era praticada sob a supervisão direta dos sacerdotes e tida como “arte sagrada”, comparável á arquitetura. Durante muitos séculos os gregos tentaram descobrir o segredo de tais banhos, e foi no curso dessas tentativas que eles desenvolveram a forma operativa da alquimia, especulando primeiro e depois realizando experiências de laboratório, anotando e analisando os resultados. Com isso deram á essa prática, em principio uma arte empírica, um caráter de ciência experimental.

Foi na Grécia, já no século II da era cristã, que apareceu o primeiro tratado de alquimia, escrito por um filósofo gnóstico de nome Zózimo. Mais tarde, Jâmblico e Pelágio, mais filósofos do que cientistas, ambos ligados ao pensamento esotérico, retomaram o trabalho de Zózimo, vinculando a alquimia aos Mistérios Egípcios e a tradição hermética, com a qual ela ficou identificada desde então. Associando os símbolos alquímicos á tradição esotérica, fizeram da alquimia uma ciência do espírito, e mais tarde, quando ela se integrou á cultura medieval , passou a ser também a Art d’Amour, pela interação do sonho alquímico com as tradições da Gennete [4]

Foi, portanto, a partir dos trabalhos de pensadores gnósticos, como Jâmblico, Pelágio, Olimpiodoro e outros, que a alquimia ganhou o status de arte hermética, já que foram aqueles autores que divulgaram a lenda que tais conhecimentos teriam sido legados á humanidade por Hermes Trismegisto, sacerdote que teria vivido três encarnações no antigo Egito, e em cada uma delas legado aos homens os conhecimentos necessários para o desenvolvimento da civilização. Na primeira encarnação Hermes teria ensinado as técnicas de agricultura, na segunda a arte da escrita e na terceira a metalurgia, com os segredos a ela ligados, entre eles o da fabricação do ouro e da realização espiritual através da prática dessa arte. Para os gregos, Hermes foi sucessivamente o deus Osíris, o deus Toth e o próprio Hermes grego; houve inclusive quem o visse como encarnação de Moisés e Salomão, já que eram muitas as tradições que atribuía ao rei israelita a posse da pedra filosofal.
Entretanto, os maiores divulgadores da alquimia foram realmente os árabes. Pelos menos, são muçulmanas ou mouriscas as mais fortes tradições e referências á respeito dessa prática, em épocas anteriores ao século XII, quando ela penetrou na Europa e caiu nas graças dos “espíritos de categoria”, na expressão de Pawels e Bergier.

Os métodos da alquimia 

Especializando-se nas artes da metalurgia, os alquimistas procuravam aprender os processos pelos quais a natureza produz os minerais. Com esse conhecimento, trabalhando em seus laboratórios, poderiam repeti-los e realizar transmutações de metais simples em metais preciosos. Graças a esse trabalho, muitas descobertas no campo da química, da medicina e da metalurgia foram realizadas.

A possibilidade de transformar um metal comum em ouro não era um sonho, uma fantasia de loucos possuídos pelo delírio metafísico, como muitos autores racionalistas têm definido, mas sim uma prática desenvolvida a partir de uma teoria, que, se pelo menos não era exata, nada tinha de loucura. Os alquimistas acreditavam que os metais eram encontrados na natureza na forma perfeita e imperfeita. Os imperfeitos eram aqueles alteráveis pela ação da natureza. Oxidavam-se, corroíam-se, alteravam-se pela ação do fogo e outros elementos. Os perfeitos eram inalteráveis e resistentes a esses elementos. Entre os primeiros listavam o ferro, o chumbo, o estanho, o cobre; entre os segundos, a prata e principalmente o ouro.

Todos os metais, segundo essa teoria, eram formados por dois elementos, que eram o enxofre e o mercúrio, encontrados em quantidades variáveis em cada metal, segundo sua categoria. O que conferia a cada metal a qualidade da perfeição era a pureza desses dois constituintes. O ouro era constituído por uma grande quantidade de mercúrio e uma pequena quantidade de enxofre, ambos muito puros. O estanho, o ferro, o cobre, ao contrário, eram constituídos por grandes quantidades de enxofre e pequenas quantidades de mercúrio, ambos mal fixados, ou impuros. Então, para se alterar as propriedades de um mineral impuro, tornando-o puro, era preciso submetê-lo a um processo de eliminação de suas impurezas, fazendo-o passar do estado imperfeito para o perfeito.[5]

O processo pelo qual um metal ordinário pode ser transformado em ouro é explicado por Ouspensky como sendo uma transmutação da matéria em seu estado físico para um estado “astral”, por meio da sua desmaterialização. Dessa forma o metal desmaterializado pode ser “modificado” pela vontade do operador, retornando ao mundo físico como outro metal, no caso, o ouro. Esse seria o processo pelo qual os alquimistas realizariam as suas transmutações. Convenhamos que se trata de uma explicação um tanto imaginosa para uma operação que ninguém sabe se um dia foi sequer realizada. Só vale citá-la mesmo em razão do simbolismo que encerra.[6]

Na verdade, no plano físico, a crença que está no cerne da prática alquímica é simples e pode ser explicada a nível operacional. Trata-se simplesmente de isolar, pela ação do fogo e pelas diversas recombinações da sua estrutura, o chamado “DNA” de um determinado elemento da natureza, que segundo a crença dos alquimistas, conteria a chamada “alma” dos metais. Isolada essa “alma” e aplicada em novas combinações atômicas, o metal original mudaria de estrutura.[7]

Maçonaria e alquimia

No plano espiritual, esse mesmo processo poderia ser tomado como aplicável em relação ao homem, enquanto ser físico, para transformá-lo num “ser superior”, espiritualizado ao extremo. Essa seria a fundamentação da ritualística maçônica, pois, da mesma forma que as técnicas alquímicas realizavam uma transmutação sobre as moléculas do metal, alterando sua composição, a prática maçônica obteria o mesmo resultado sobre o espírito de seus praticantes, alterando-os para melhor.

Os adeptos da arte de Hermes acreditavam que a matéria bruta, sobre a qual deveriam trabalhar, era um caos, uma treva espessa, um depositório de energias desorganizadas. Mas no seu interior habitava a chama divina, a luz dos princípios, o raio, que liberto das suas amarras físicas, daria ao seu libertador o controle sobre todas as forças da natureza. Para eles, era também essa energia, que liberada, dava a todos os corpos, minerais, vegetais ou animais, suas conformações, fazendo deles um elemento químico, uma planta ou um animal, sendo também responsável pelos graus em que se organizam seus elementos internos, dividindo-os em espécies.

Essa energia, que Aristóteles chamava de enteléquia era a matéria prima do espírito.[8] O espírito, que é luz, habitava em meio a trevas. Ao ser libertado precisava ser convenientemente dirigido. Pois assim como os núcleos atômicos de materiais pesados que são rompidos sem medidas de controle podem causar explosões imensas, com danos irreversíveis para o operador e para o ambiente, também o espírito liberado sem direcionamento, sem “magistério” próprio, pode causar terríveis perturbações.
A alquimia entrou na Maçonaria pelas mãos dos “maçons aceitos” do grupo rosacruciano, ali pelo início do século XVII. Ganhou adeptos em todas as Lojas especulativas, provavelmente pela analogia que as tradições alquímicas guardavam com a idéia maçônica, de aprimoramento do espírito através do trabalho manual.

Para os alquimistas, o trabalho de manipulação da matéria nos laboratórios provocava no espírito do operador o mesmo resultado que o trabalho de edificação trazia para o construtor de edifícios. Ambas eram práticas sacralizadas, que levavam ao êxtase aqueles que nelas eram iniciados. Além disso, a esperança alquímica de revelação divina, através da manipulação da matéria, estava no mesmo nível da esperança maçônica, de obtenção da gnose através do simbolismo de um ritual iniciático. Daí tanto se pode dizer que a alquimia era a Arte Real praticada operativamente nos laboratórios por filósofos químicos, da mesma forma que a Maçonaria era uma alquimia espiritual praticada numa Loja maçônica ao invés de um laboratório. Ambas eram derivações de antigas artes operativas: a alquimia provinha da prática da antiga metalurgia, a Maçonaria da prática da arquitetura.[9]

Que tais idéias fossem associadas a uma disciplina espiritual, visando o mesmo resultado, não causa nenhuma perplexidade. Afinal, o que pregavam as crenças religiosas e as tradições iniciáticas de todos os tempos, senão a idéia de que o espírito humano é um elemento que deve ser expurgado de suas impurezas, para tornar-se uma entidade “luminosa”, limpa, pura, capaz de alçar-se ao território das divindades e com elas conviver num nível de igualdade? E não era essa também a finalidade da religião, a meta da filosofia, a esperança gnóstica e a realização derradeira de toda experiência mística?

Porque então, pensavam os alquimistas, essa esperança não podia ser realizada através da manipulação química da matéria, que ao mesmo tempo realizava a experiência espiritual da prática religiosa e o conhecimento superior da busca da gnose, de forma especulativa e operativa ao mesmo tempo?

Foi nesse passo que a alquimia deixou de ser apenas a Arte de Hermes, destinada a apreender os segredos da natureza e aplicá-los na transmutação dos metais, para transformar-se em verdadeira ciência do espírito, capaz de realizar a iluminação do próprio operador, levando-o a um estado de consciência superior, que só um verdadeiro iniciado conseguia atingir. Essa era, pelo menos, a esperança da grande maioria dos praticantes da Art d’Amour, como ficou sendo conhecida a alquimia entre os românticos admiradores dessa arte. A esse respeito escrevem Pawels e Bergier: “Finalmente pensamos o seguinte: o alquimista no fim do seu trabalho sobre a matéria vê, segundo a lenda, operar em si mesmo uma espécie de transmutação. Aquilo que se passa no seu crisol passa-se igualmente na sua consciência ou na sua alma. Há uma mudança de estado. Todos os textos tradicionais insistem nesse ponto, evocam o momento em que a “ Grande Obra” se realiza e em que o alquimista se transforma “ num homem desperto”. Parece-nos que esses velhos textos descrevem deste modo o termo de todo o conhecimento real das leis da matéria e da energia, incluindo o conhecimento técnico” [10]

Eis, portanto, realizada a ascese espiritual, a iluminação buscada pelos místicos de todos os tempos, a gnose dos antigos filósofos e o “insight” do cientista. O operador alquímico é agora um Homem Novo, renascido das próprias cinzas, como a fênix da lenda, como a matéria prima mineral que durante anos a fio triturou, dissolveu, aqueceu no crisol e cozeu no seu forno, “matando-a’ e “ressuscitando-a” inúmeras vezes, até que, por um fenômeno de interação entre suas moléculas modificadas e recombinadas infinitas vezes, produz-se o fenômeno.

E ao mesmo tempo, enquanto o metal se purifica no decorrer do processo, o operador alquímico torna-se também “purificado”, como o metal grudado no fundo do crisol. Ele é detentor de todo saber, todo conhecimento, todos os segredos da natureza e senhor do seu próprio psiquismo. É o Homem da Terra, feito á semelhança do Homem do Céu, da tradição essênia, o Homem Desperto das crenças teosóficas, o Homem Universal da esperança maçônica.

Simbolismo alquímico e maçônico

Eis enfim, realizado o grande sonho da humanidade. Enquanto o alquimista possui agora, um artefato capaz de introduzi-lo no mais íntimo dos segredos da natureza, que é o processo pelo qual ela “fabrica” os elementos naturais, ele agora é também, como homem desperto, um verdadeiro“ eleito” na sociedade em que vive, pois possui a gnose, a verdadeira sabedoria que tudo transforma.
Essa também é a simbologia que se aplica ao maçom, homem regenerado pela iniciação, possuidor de uma consciência superior, que lhe permite “ver” e agir num domínio ampliado pelo mundo interior que a prática da Arte Real finalmente lhe assegura.

Não é sem motivo que muitos autores sustentam que o objetivo da Maçonaria é a realização de uma obra espiritual comparável á grande obra dos alquimistas, representada pela pedra filosofal. Não é também irracional a comparação que se faz entre a construção simbólica do Templo de Salomão e a obtenção dessa “pedra”, capaz de transformar minerais impuros no mais puro ouro.[11]

E não é também, por acaso, que a iniciação maçônica, e o seu próprio catecismo, são pródigos de evocações a símbolos alquímicos. E tanto se pode dizer que a Maçonaria é uma espécie de cavalaria simbólica, quanto uma forma de alquimia praticada especulativamente numa Loja, ao invés de um laboratório, tendo como matéria prima o psiquismo do praticante, e como finalidade a transmutação do próprio operador.

Bernard Rogers resume bem essa questão: “O objetivo que os franco-maçons perseguiam é a construção do Homem, isto é, da Humanidade Autêntica, concebida como projeto, a partir da construção do individuo”, escreve aquele autor. “Não causará surpresa”, prossegue ele, “o fato de que o eixo em torno do qual eles estabeleceram seu simbolismo seja a construção do Templo de Salomão, sendo o ser humano considerado como a morada da divindade. A quem venha opor esse propósito a afirmação de que há franco-maçons ateus, respondamos que nenhum desses, a menos que não mereça sua qualificação, poderia pelo menos negar sua fé na perfectibilidade do homem, cuja natureza divina- isto é- luminosa- não pode deixar de ser reconhecida por quem não tem medo das palavras e se recusa a tornar-se escravo do que esta ou aquela religião possa exigir dele”.[12]

Por acaso também não é que a disposição dos símbolos numa Loja maçônica assemelha-se, de forma notável, à quarta prancha do Mutus Líber dos alquimistas.[13] Ambas são visões simbólicas do universo. Nelas se representa a “energia dos princípios”, responsável pelas transformações internas e externas que se realizam na natureza e no homem. É na Loja que a mística da Palavra Perdida, o Verbo Divino, o Número Único, que na Cabala representa o Princípio Criador de todas as coisas, e na alquimia a “ flos coeli”,“o dom de Deus”, é captada pela alma humana no momento da iniciação. É essa energia que age, á medida que a cerimônia avança, para a realização da transmutação do neófito, conferindo-lhe um status que o eleva de sua condição anterior de profano á condição superior de iniciado.

O PISO DA LOJA MAÇÔNICA

Em tudo e por tudo o magistério alquímico guarda a mais estreita relação com a tradição maçônica. Tanto é que as cinco telas do Mutus Líber ocupam, na iconografia alquímica, a mesma posição que o piso mosaico na Loja Maçônica, onde se realizam as transmutações dos aprendizes, na passagem sucessiva das fases de iniciação nas Lojas Simbólicas. O piso mosaico, em ambas as tradições, tem a função específica de “receber e filtrar a luz” que vem do Oriente, a “Luz de Rá” das iniciações egípcias, Principio Criador de tudo que há no mundo. E as cores desse piso, em preto e branco, repetem as mesmas cores do mercúrio dos filósofos alquimistas.[14]

Diz-se que o piso mosaico, na Loja maçônica, é uma representação do piso que ornava o Templo de Salomão. Mas essa referência histórica é apenas uma informação que não reflete o seu verdadeiro significado. Na verdade, desde o tempo de Moisés, ou até antes disso, esse traçado geométrico já representava idéias de alto conteúdo esotérico. Era utilizado nos templos egípcios, nas antigas sinagogas judaicas e nos templos greco-romanos como forma de captar e filtrar a luz solar, orientando-a para um fim determinado. Dessa forma, não é estranho que os alquimistas tenham utilizado a mesma disposição geométrica para preparar o seu “filtro”, fundamentados na mesma sensibilidade que tiveram os antigos profetas e hierofantes.

As antigas tradições maçônicas dizem que o Templo de Salomão era ornamentado por um piso mosaico formado por quadrados pretos e brancos, orientados de certa forma. Essa informação consta de diversos manuscritos antigos, pertencentes ao conjunto que hoje chamamos de Old Charges (As Velhas Instruções).[15] É bom lembrar, entretanto, que em nenhuma parte da Bíblia, ou de qualquer outro documento histórico, esse detalhe foi realmente informado, o que nos leva a pensar que ele tenha, efetivamente, mais relação com o simbolismo alquímico do que, propriamente com as antigas tradições maçônicas herdadas da arquitetura medieval.

O  ILUMINISMO MAÇÔNICO

Por analogia, podemos comparar o magistério alquímico com a prática maçônica. Há uma similitude nos objetivos de ambas as tradições e no processo de obtenção de resultados, que muito se assemelham entre si. Da mesma forma que na prática alquímica se diz que o metal é regenerado a partir de uma conjunção entre a luz e as trevas, na Maçonaria essa regeneração é operada a partir do sol e da lua. Por isso esses astros estão representados no Oriente da Loja, atrás do trono do Venerável Mestre. No meio deles, no centro do triângulo, o “olho onisciente”, reina absoluto.

Essa simbologia, inspirada em tradições egípcias, é representativa da crença de que tudo no universo emana da conjunção de dois princípios, resultando num terceiro, que se propaga por todo o real existente.[16] O sol ali representado é Osíris, ou Rá, o Principio Criador de tudo que existe no universo. A lua representa Isis, a deusa-mãe em cujo ventre se opera o milagre da regeneração, e o “olho onisciente” é o olho de Hórus, o filho que nasce da união de Ísis e Osíris, após a ressurreição daquele deus. Por ele, a manifestação do Principio Criador projeta o universo real, dando forma a toda a criação cósmica. 

A trindade egípcia, pintada obrigatoriamente atrás do trono do Venerável Mestre é representativa do “mistério maçônico” que se opera na Loja, a partir do qual o maçom alcança a regeneração psíquica pela prática da iniciação. É da luz que vem do Oriente, a partir da consagração dada pelo Venerável, que o iniciado atinge a qualidade de homem renascido, após ter sofrido a morte psíquica, simbolizada por sua passagem pelos subterrâneos e sua descida ao ventre da terra.

Após ter passado um período perdido nas trevas, realizando diversas provas e viagens, o neófito “vê” a luz, no momento em que lhe é retirada a venda dos olhos. Momento limite de sua iniciação, ele percebe que essa luz lhe é conferida pelos astros ali representados, simbolizando que ele, finalmente, superou a primeira fase de sua jornada iniciática e sabe agora da existência de uma verdade maior que precisará ser descoberta. 

A correspondência entre o iluminismo maçônico e a tradição alquímica é evidente: o Aprendiz, que durante longo tempo permaneceu num estado de semente, lançada num profundo negro, evolui para o branco da regeneração, quando se torna Companheiro e conhece o vermelho da ressurreição ao tornar-se Mestre. O Mestre que renasce a partir de Hiram morto, eis o apogeu do processo que simboliza o nascimento de um maçom na sua plenitude iniciática, pois ao iniciar-se Aprendiz, e ao elevar-se a Companheiro, ele ainda está em processo de gestação. Será preciso um longo trabalho de manipulação e aprimoramento do seu caráter até que ele se torne, enfim, o Homem Universal, alicerce da nova sociedade, justa e perfeita, que a Maçonaria se propõe construir.

Essa é a alquimia que se processa no interior de uma Loja Maçônica, que nesse mister, repete o trabalho feito no laboratório do alquimista. 

[1] “Conhecem-se mais de cem mil livros ou manuscritos alquímicos” , escrevem aqueles autores. “Essa imensa literatura, á qual se consagraram espíritos de categoria, homens importantes e honestos, essa imensa literatura que afirma solenemente a sua adesão a fatos, à realidades experimentais, nunca foi explorada cientificamente. O pensamento reinante, católico no passado, racionalista atualmente, manteve em redor desses textos uma conspiração de ignorância e desprezo. Existem cem mil livros que possivelmente contém alguns dos segredos da energia e da matéria. Se isso não é verdade, eles pelo menos assim o proclamam” Pawels e Bergier- O Despertar dos Mágicos pg. 101.
[2] Mircéa Eliade - Ferreiros e Alquimistas – Ed. Flammarion,1977.
[3] Bernard.Rogers- Descobrindo a Alquimia pg. 28.
[4]Gennete é palavra francesa que designa a instituição da Cavalaria.
[5] Na imagem, o alquimista moderno em seu laboratório. Fonte: alquimia.blogspot.com
[6] P. D Ouspensky,- Um Novo Modelo do Universo. pg. 92.
[7] Serge Hutin. História da Alquimia. São Paulo, Cultrix, 1987.
[8] Enteléquia (em grego entélékhéia) significa a qualidade do ser que tem em si mesmo a capacidade de promover o seu próprio desenvolvimento. No ser humano pode ser entendida como a força que o leva a enriquecer o espírito através da aquisição do conhecimento e também a promover o desenvolvimento do seu organismo em termos físicos.
[9] Na imagem a 3º tela do Mutus Liber- Nicolas Flamel, Livro das Figuras Hieroglíficas- Vol 16- Biblioteca Planeta.
[10] Pawels e Bergier op citado pg. 99.
[11] Não é sem razão também que o nome do Rei Salomão sempre foi conectado com as lendas alquímicas. Dizia-se que esse rei era possuidor da pedra filosofal, que era a origem da sua incalculável riqueza.
[12] Bernard Rogers- Descobrindo a Alquimia, pg. 260.
[13] O Mutus Líber são pranchas ou quadros nos quais se representam, de forma simbólica, as fases do processo de obtenção da pedra filosofal. É um conjunto de cinco telas semelhantes as dos painéis das Lojas Simbólicas. Na Maçonaria essas telas têm como finalidade justamente a representação, através de símbolos próprios, do processo pelo qual o universo maçônico é construído. É muito difícil não pensar que tais iconografias não tenham tido uma fonte comum de inspiração. Veja-se, por exemplo, que os diferentes “quadros”, das diferentes “Lojas” , na Maçonaria representam cada um, um motivo ligado á uma “ fase” do “iluminismo maçônico”, que, no seu desenvolvimento e objetivo, equivale, simbolicamente, as diferentes fases do magistério alquímico. Tal como na Arte de Hermes, a Arte Real se vale desse simbolismo para transmitir suas mensagens.
[14] Na imagem, o piso mosaico de uma Loja maçônica.
[15] Particularmente o chamado manuscrito Dunfries nº 4- que estabelece como ornamentação necessária de um Templo maçônico essa forma de piso.
[16] Da mesma forma que na doutrina da Cabala, na qual o Princípio Criador se manifesta em forma de uma esfera de energia chamada Kether e se espalha pelo nada cósmico, formando a Árvore da Vida, que é o símbolo do universo físico e espiritual.
João Anatalino



MAÇONARIA BRASILEIRA-TENDÊNCIAS HISTÓRICAS E FILOSOFICAS


Por João Anatalino (Recanto das Letras)

UMA IDEIA, UMA PRÁTICA, UMA INSTITUIÇÃO 

Como todos os maçons sabem, a Maçonaria tem uma origem muito obscura. Nenhum historiador sério, até agora, ousou escrever uma história documentada da Ordem Maçônica, situando a sua origem, os seus verdadeiros antecedentes e sua razão de existir, seja na história do pensamento humano, ou mesmo como realização do engenho do homem na sua luta para organizar a vida social.
Como organização historicamente reconhecida, podemos situar seu nascimento nos idos de 1717, quando as quatro Lojas de Londres se uniram para criar a Grande Loja de Londres, a qual se tornaria o núcleo a partir qual a Maçonaria, como sociedade formalmente constituída, iria se tornar conhecida por todo o mundo ocidental. Mas, como diz a historiadora Frances Yates, antes dessa formalização como sociedade, a Maçonaria teve seus antecedentes históricos e filosóficos, os quais se perdem na noite dos tempos. [1]

Aliás, se antes de 1717, já existiam Lojas maçônicas em toda Europa, especialmente na Inglaterra, Escócia, França e Alemanha, comprovadas por documentos preservados, é lícito observar que a atividade maçônica já era praticada e conhecida muito antes desses termos. Então, as datas de 1717 (união das Lojas londrinas) e 1723 (publicação das Constituições Maçônicas, de James de Anderson) são apenas elucidativas do ponto de vista histórico, como registro da existência de uma atividade que a sociedade humana já praticava desde as suas mais remotas origens.

A Maçonaria é tão antiga como a própria sociedade humana. Mas só poderemos entender esse pressuposto se o colocarmos sobre um tríplice enfoque, que é a ideia, propriamente dita, que está na sua origem, a prática que ela originou, e a organização que lhe foi dada, para que ela adquirisse uma conformação e uma identidade na vida social das comunidades onde ela se instalou.


A IDEIA 

A ideia vem da necessidade que as sociedades têm de conservar as suas conquistas sociais. E para isso precisa congregar em círculos restritos as pessoas mais importantes, mais comprometidas e mais interessadas nessa preservação (poder intelectual, econômico, religioso e militar). Nasceram daí as instituições conhecidas como Mistérios, que por definição eram festivais folclóricos e religiosos que costumavam homenagear os deuses patronais dos antigos povos, para que estes os favorecessem com uma natureza propícia às suas atividades econômicas, sociais e de defesa. Esses festivais, que no início tinham finalidade essencialmente religiosa, assumiram, mais tarde, autênticas conotações políticas, pois se tornaram núcleos de distinção social. [2]

A PRÁTICA 

A prática se encontra no núcleo da confraria, que por definição é uma a ou conjunto de pessoas do mesmo ofício, da mesma categoria social, ou que praticam um mesmo modo de vida, ou pensam do mesmo modo, ou ainda comungam de objetivo comum. Confrarias existem desde que as primeiras civilizações adquiriram identidades próprias e se organizaram em estados, povos ou nações.

Entre os gregos antigos a noção de estabilidade social estava estreitamente ligada à idéia de Fraternidade. Os grupos familiares eram chamados de frátrias. Esses grupos congregavam as pessoas da família e todos os agregados que, de alguma forma, tivessem relação de parentesco com o chefe da família, ou qualquer ligação profissional, social ou legal, com o núcleo familial. Dessa conformação, em princípio moldada por vínculos de sangue e depois por interesses sociais, religiosos, políticos e econômicos, evoluiu a noção de clã ─ a família ampliada ─ e da reunião de clãs formou-se, mais tarde, a pólis, que era a comunidade circunscrita a uma urbe. 

Foi esta última que deu origem às cidades-estado da Gréci antiga e da península itálica. Praticamente, todas as cidades do Ocidente clássico evoluíram a partir desses núcleos familiares. Iremos encontrá-los também em Roma, na estrutura do patriciado, assim chamados os núcleos familiares que deram origem ao estado romano e foram responsáveis por uma estrutura social que sobreviveu por muitos séculos.

Foram essas confrarias que origem às cidades-estado da Grécia antiga e da península itálica. Praticamente, todas as cidades do Ocidente clássico evoluíram a partir desses núcleos familiares. Iremos encontrá-los também em Roma, na estrutura do patriciado, assim chamados os clãs familiares que deram origem ao estado romano e foram responsáveis por uma estrutura social que sobreviveu por muitos séculos.[3] E depois, já na Roma imperial, urbanizada e organizada como um grande estado, iremos encontrar os Collegia Fabrorum, confraria dos profissionais de um mesmo oficio, os quais deram origem ás guildas corporativas da Idade Média e foram a origem dos modernos sindicatos.[4]

A INSTITUIÇÃO 

Esta, como dissemos, nasceu em 1717, com a união das quatro Lojas maçônicas de Londres, e a Constituição dos franco-maçons escrita por James Anderson em 1723. Daí a Maçonaria espalhou-se pelo mundo como uma organização, em sistema de franquia, congregando diversos ritos e tradições, mas todas com um objetivo comum, que é a divulgação da ideia maçônica (preservação da ordem social) e a disseminação da sua prática doutrinária (através da formação de uma elite). Malgrado todos os esforços dos seus idealizadores, a Maçonaria nunca conseguiu escapar dos conflitos ideológicos que a sociedade humana sempre hospedou. Isso não tem sido diferente com a Maçonaria brasileira.

ILUMINISMO X POSITIVISMO 

No campo das ideias é possivel perceber, desde logo, que a Maçonaria brasileira hospedou um conflito ideológico entre as ideias iluministas, inspiradas pela Revolução Francesa e as guerras de libertação das colônias americanas (especialmente as colônias inglesas) e o recente pensamento positivista que havia se instalado entre os intelectuais que inspiraram a organização da maioria dos governos das colônias emancipadas.

O Iluminismo, como se sabe, é um movimento intelectual que surgiu no começo do século XVIII na Europa, defendendo o uso da razão e da ciência (luz) ao invés da fé e do direito imposto por quem detém o poder (trevas). Pregava a liberdade econômica, política e religiosa para todos.

Já o positivismo defende a ideia de que o conhecimento científico é a única forma de conhecimento verdadeiro. O positivismo afirma que só existe verdade quando ela é comprovada através de métodos científicos válidos.

No fundo são dois movimentos que se completam. A única diferença é que o Iluminismo admite, ainda que sob certas condições, uma presença divina a orientar a razão humana, coisa que é negada veementemente pelos positivistas. 

Esse conflito pode ser percebido na intenção de um grupo de irmãos que pugnavam por uma maçonaria não envolvida em questões políticas, mas inteiramente voltada para a filosofia, no sentido da preservar uma ética e uma moral que havia sido amplamente defendida pelos iluministas. Esse pensamento, como é óbvio, se identificava mais com as ideias reformistas dos protestantes, razão pela qual encontrou, desde logo, a oposição das figuras mais importantes da maçonaria brasileira, que eram todos católicos, e em muitos casos, ligados oficialmente á Igreja Romana. 

Haja vista que no século XIX havia um grande número de padres que eram maçons. Ressalte-se que a Maçonaria, no Brasil, só passou a ser combatida oficialmente pela Igreja Católica depois da chamada Questão Religiosa, desencadeada por um discurso proferido pelo padre maçom José Luís de Almeida, em 2 de março de 1872, exaltando os maçons e a Maçonaria como principais responsáveis pelos movimentos que culminaram com a independência do Brasil, e pela luta pela abolição da escravatura. O Bispo do Rio de Janeiro, D. Pedro Maria de Lacerda, que reivindicava para a Igreja essas láureas, exigiu que o padre abandonasse a Maçonaria e mais tarde, com a evolução do conflito, isso iria resultar em uma proibição formal de que padres se tornassem maçons. Essa querela já havia sido desencadeada, entretanto, pelo Papa Pio XI, cujo ódio pela Maçonaria vinha do fato de que foram os maçons (especialmente Garibaldi, Mazzini e Cavour) que promoveram a unificação da Itália, que acabou com o poder político do Papa e reduziu o território da Igreja a um pequeno território, que é o Vaticano. [5]


CONFLITO POLÍTICO: CONSERVADORES (MONARQUISTAS) X LIBERAIS (REPUBLICANOS) 

No terreno político a Maçonaria brasileira hospedou desde o início uma divergência política e ideológica que se revelou, ao longo do tempo, incontornável. Essa divergência começou entre os idealizadores da nossa independência, que se filiavam entre os monarquistas, chefiados pelo Grão-Mestre do GOB, José Bonifácio de Andrada e Silva e o republicano Gonçalves Ledo, que era o seu Primeiro Vigilante. José Bonifácio pugnava por um Brasil independente, mas não desligado politicamente de Portugal. Sua ideia era a do estabelecimento de uma comunidade luso-brasileiro, nos moldes do que viria ser mais tarde a Comunidade Britânica das Nações. Daí a sua luta para que a monarquia fosse preservada a todo custo. Já Gonçalves Ledo e seu grupo até aceitavam a monarquia em princípio, mas apenas como uma transição, para conquistar a independência, mas depois evoluir para a República, como nos demais países da América, que haviam se libertado de suas metrópoles.Filosoficamente o grupo de José Bonifácio adotava postulados iluministas, buscando uma compatibilização entre a ciência e a religião, enquanto os partidários de Gonçalves Ledo eram francamente positivistas e queriam um estado completamente apartado da religião. Esse, desde logo, foi um dos motivos de graves conflitos ideológicos na nascente Maçonaria brasileira, pois como se viu, havia em seus quadros um grande números de religiosos oficiais.


EVOLUÇÃO POLÍTICO IDEOLÓGICA 

Essas tendências podem ser observadas em toda a história da Maçonaria brasileira desde então. Refletiria nos principais movimentos históricos que permearam a vida do Império e depois a da República. Movimentos liberais pela República, que geraram os mais importantes conflitos armados ocorridos no Brasil, como a Confederação do Equador e a Revolução Farroupilha foram liderados por maçons federalistas como Frei Caneca e Bento Gonçalves; o movimento abolicionista, igualmente de inspiração liberal e republicano também tiveram em maçons os seus principais líderes. Entre eles o Barão do Rio Branco, Luiz Gama, José do Patrocínio e o poeta Castro Alves. Do lado monarquista-conservador estavam também vários maçons, que lutavam pela preservação da monarquia. Entre eles grande nomes, como o Duque de Caxias (Grão-Mestre do GOB), o padre Diogo Antonio de Feijó, Joaquim Nabuco e outros maçons que escreveram importantes capítulos na história do Brasil. 

A tendência liberal republicana acabou triunfando com a Proclamação da República. Muito mais pelo enfraquecimento das lideranças monarquistas, que acabaram perdendo força com envelhecimento de D. Pedro II e a falta de um sucessor confiável para o trono e principalmente com a emancipação definitiva dos escravos, que destruiu, de vez, o modelo econômico vigorante no regime imperial. Mais uma vez, seria nas Lojas maçônicas que o movimento pela mudança do regime acabaria tomando corpo e seria, afinal, implementado. Esse movimento, que teria início na Convenção de Itu seria liderado por maçons e culminaria na proclamação da República pelo maçom Deodoro da Fonseca.[6]

Embora a Maçonaria, a partir da implantação do regime republicano, e especialmente depois da ditadura Vargas, tenha diminuído sensivelmente a sua influência na história contemporânea do Brasil, ela ainda concentra uma importante parcela de poder na estrutura de governo do nosso país. É grande o número de maçons que militam no Executivo, Legislativo e Judiciário. A grande dificuldade é, hoje, como ontem, aglutinar todo esse poder em prol de um objetivo comum. Hoje, como ontem, as vaidades pessoais e a sede de poder falam mais alto e impedem a Maçonaria de alcançar plenamente seus objetivos, que é a realização de uma ordem social justa e perfeita.

[1] Francis Yates- Giordano Bruno e a Tradição Hermética- Cultrix, 1986
[2] Referência aos Mistérios Egípcios e os Mistérios de Elêusis, que muitos autores citam como legatários das mais antigas tradições maçônicas. Entre os iniciados nesses Mistérios eram encontradas as pessoas mais importantes dessas sociedades, que eram cooptados justamente pela importância (poder econômico, religioso, intelectual, militar) que adquiriam em suas vidas.
[3] Vide nossa obra “O Tesouro Arcano”, publicado pela Editora Madras, 2012
[4] Especialmente as guildas dos construtores civis, chamados de pedreiros-livres, construtores de igrejas e mosteiros, chamados de franco-maçons, que estão na origem da Maçonaria histórica.
[5] Ver Castellani e Almeida- História do Grande Oriente do Brasil- Madras, 2009
[6] A Convenção de Itú, movimento republicana que deu o pontapé de início na proclamação da República, foi liderado pelo maçom João Tibiriçá Piratininga, que organizou o Partido Republicano
João Anatalino


COSMOGONIA[1] EGÍPCIA


Revista Hiran Abif – Edição 139 – Março de 2012
Tradução: Pedreiro de Cantaria

No Egito, os primeiros criadores surgiram de um caos aquático e logo passaram a dar vida a outras divindades, que eram personificaçõs do cosmos em suas diversas partes e aspectos. Toda a vida surgiu do abismo primordial chamado Nun e, a partir desse momento, o sol continuou renascendo da água subterrânea todas as manhãs, e dessas mesmas águas subterrâneas brotavam a inundação vivificante antual do rio Nilo, identificado com Osiris, do qual dependia a vegetação. para crescer e renovar com a formação do humus deixado pelas águas quando baixavam, formando o solo fértil. Não surpreendentemente, que essas águas eram personificadas como divindades, pois juntamente com o sol (que se pensava ter nascido elas para fazer carreira diária no horizonte), formavam a fonte de toda vitalidade.

Certamente, poder-se-ia dizer que todos os deuses "procediam de Nun", uma vez que o abismo primordial era considerado o pai dos deuses, de quem o criador do mundo nasceu espontaneamente, conhecido por nomes diferentes, tais como: Atum-Re em Heliópolis, Ptah em Memphis, Toth em Hermópolis e Khnun em Elefantina, embora cada um possa se subordinar a qualquer outro em outro lugar. Portanto, tanto a ordem divina como a ordem cósmica foram estabelecidas a partir de Nun, e é provável que, sob a multiplicidade de deidades relacionadas à criação, haveria originalmente um ser supremo como a fonte transcendente de toda atividade criadora, reunindo em si mesmo os diversos atributos e aspectos do cosmos e sendo responsável pela governança de todos os processos cósmicos.

Desta forma, uma mesma raiz linguística relaciona céu, nuvens e chuva, com suas principais personificações no Criador e as manifestações Deste na natureza, como relâmpagos e trovões. Zeus ou Dyaus Pitar entre os indo-europeus, ou Teshub na Anatólia, era originalmente o deus do céu, a tempestade e a atmosfera, conhecido por vários nomes antes de assumir as funções dos diferentes deuses que se equiparavam e, no Egito, o Deus- Halcno Horus, "o exaltado", foi considerado como uma divindade do céu com capacidade criativa, antes de adquirir uma significação solar e, finalmente, um papel de Osiran. Tendo em vista a importância do sol no vale do Nilo, como dispensador de vida e como força destruidora, não é surpreendente que chegasse a ser o símbolo predominante da criação, embora Ptah de Menfis fosse criador de si mesmo e conservou sua situação como único do universo e dos deuses, sendo estes conceitos objetivados de sua mente.

A TEOLOGIA DE MENFHIS

No entanto, Ptah foi originalmente representado na teologia de Memphis como existindo antes do deus solar Atum, uma vez que os oito deuses que retiraram o sol das águas primordiais eram a criação daquele, igual eram dos oito primeiros elementos do caos, com os quais se identificava como Ptah-Ta-Tjenen "Ptah da terra emergida", ou seja, a Colina Primordial que ele removeu de Nun para transformá-lo no centro da terra. Portanto, tudo o que existe vem dele e funciona graças a ele como a causa de toda a criação. Ao pensar, enquanto “coração”, e ao ordenar, quanto à llingua, "Ptah fabricou com sua roda de oleiro um ovo, dentro estava a terra, ou, como acreditavam alguns, o modelou como se fosse uma estátua.

Dentro desta idéia mais abstracta da criação, própria da teologia de Memphis, Ptah é o "grande e poderoso criador", de quem procede toda a ordem do mundo, praticamente ex nihilo. Em seu coração e em sua linguagem, surgiu algo como a forma do Atum, e pelo processo criativo de seu pensamento, o resto dos nove deuses foram criados e colocados em seus respectivos templos. Uma vez que isso foi feito, eles foram criados de forma semelhante, pelo pensamento e palavra de Ptah, "homens, animais e tudo o que se move ou vive". Então, entende-se que seu poder era maior que o dos outros deuses, e que ele poderia descansar de seu trabalho e se contentar com tudo o que ele havia feito.

Quando Menfis, com a primeira dinastia, começou subitamente a predominar, os teólogos se deram conta de que seu deus Ptah tinha que ser maior que todos os demais deuses, incluindo o próprio Atum heliopolitano, que era representado como engendrado por si só e também Shu e Tefnut (a atmosfera e a umidade), fertilizando-se a si mesmo pela boca. Ptah, por sua vez, tinha concebido todas as coisas em seu coração (ou seja, em sua mente) e as produziu por suas palavras (ou seja, por sua "linguagem").

Para este fim, os teólogos utilizaram todos os recursos ao alcance: a idéia do deus solar nascendo do caos, a criação das oito divindades do céu e da Terra a partir do abismo, uma série de oito deuses convertidos em um dos nove (quando se adiciona ao Atum), etc. Sozinho então foi possível colocar Ptha no lugar de Atum como chefe do panteão e torná-lo o último processo criativo, estabelecendo-o como o criador desde o grande trono "e identificá-lo com os deuses originaisda Ogdóade[2]

Ptah-Nun, o pai que produziu Atum; Ptah-Naunet, a mãe que pariu Atum; Ptah o grande, isto é, o coração e a língua da Enneda, Ptah, que fez nascer todos os deuses. Tudo isso foi criado do nada, mesmo antes do caos, assim como Atum, o chefe da Enneda, com o qual começou a obra da criação quando os deuses e as forças cósmicas divinas se puseram em relação com o universo físico. Enquanto os demais deuses criavam por procedimentos físicos, Ptah exercia suas funções espiritualmente no reito das ideias, mediante o pensamento e a palavra, marchando assim por diante o resto do panteão como o “Grande e Único” ou como o “Vidente dos Dois Países”. Todos os demais deuses lhe rendiam homenagens e estavam satisfeitos por associarem-se com ele. Como a fez notar Breasted[3], parece que nestas primitivas especulações há uma antecipação da doutrina de Filón sobre o Logos, dentro do contexto da cosmologia egípcia. Era, no entanto, um cosmos em que os deuses e os homens tinham relações mútuas e participavam de uma natureza comum com o supremo criador, muito distante, todavia, do Deus transcendente do monoteísmo hebráico e da fé e culto cristão, e da primeira causa grega do universo como princípio como princípio da inteligência divina e da ordem cósmica.

O objetivo principal da teologia Menfita era consolidar Memphis como centro do estado teocrático e unificar o Alto e o Baixo Egito como uma dualidade única, governada por um faraó em quem no qual resumia tudo o que havia de divino no vale do Nilo. Embora o mento da criação tenha sido descrito em termos espirituais em relação às manifestações do pensamento do criador, como fonte de tudo o que existe, tanto humano como divino, Ptah representou em primeiro lugar o poder universal, embora sua natureza fosse mais transcendente do que imanente. Mas ele criou os deuses e cidades locais e os ordenou por hierarquias dentro de um panteão politeísta.

No entanto, a teologia de Memphis nunca obteve um consenso unânime no Egito. Era demasiada abstrata para ser geralmente aceitável, e o povo como um todo se voltou para Atum e Amon-Ra, encarnados no sol e no vento, e encarnados no monarca reinante como o centro dinâmico da ordem cósmica e política. Na mitologia solar, o sol que envolve tudo, foi representado voando sobre o horizonte como um falcão, ou como o besouro criado por si mesmo que estava empurrando a bola do sol através do céu durante o dia e à noite como um velho que andava hesitantemente a esconder-se no oeste

A terra se representava rodeada por montanhas, na qual apoiava o céu, personificado pela mesma Nut. Por debaixo estava o grande abismo, do qual o deus solar nascia todas as manhãs como no início da criação, quando surgiu o primogênito do oceano primordial, isto é, de Nun. Até Shu, deus do ar e pai de Nut, se colocou em pé sobre a terra e levantou sua filha com seus braços. O céu e a terra não estavam separados. Por sua vez, a abóbada celeste era representado como uma enorme vaca sustentada pelos deuses, e cuja barriga estava cheia de estrelas. Debaixo dela estava a Via Láctea, cruzada todos os dias pelo navio do sol tripulado pelas estrelas personificadas.

A ENNEADA DE HELIÓPOLIS

Nos reinos celestiais, Atum tornou-se supremo e exerceu suas funções criadora quando seu culto de significado cósmico alcançou o predominio no Antigo Reino sob a influência poderosa de Heliópolis. Durante a quinta dinastia (cerca de 2380 a;.C.), quando esta cidade se tornou a capital e o centro do culto solar, tornou-se chefe da Enneda e o faraó tomou o título de "filho de Reî". Havia a "Casa do Obelisco" dentro do templo, que se destinava a ser fundada na colina primitiva de areia em que Atum apareceu pela primeira vez.

Em consequência aquele lugar era considerado o centro das forças criativas que Atum reuniu em si mesmo quando se tornou o progenitor da grande Ennade; Shu (ar) e Tefnut (umidade), Geb (terra) e Nut (céu), enquanto Osiris e Isis, e Set e Nephtis eram filhos de Geb e Nut. Em torno de Atum-Re desenvolveu uma mitologia muito complicada na época das pirâmides e, como deus supremo, tornou-se o criador que se criou, a fonte da vida e da geração, então como pai dos deuses e personificação do sol em suas múltiplas formas e trades. Ele era o governante do mundo nos quatro cantos do horizonte e, ao mesmo tempo, exercia proteção especial sobre o Egito, pois o rei era seu filho e sua encarnação visível sobre a terra.

A SIMBOLOGIA DOS DOIS PAÍSES

No entanto, o símbolo cosmológico do vale do Nilo não eram os quatro pontos cardeais do mundo, mas os "dois países". De acordo com Frankfort, essa ideia da antiguidade do Reino dos Dois Países, que ressurgiu por analogia com um simbolismo dualista muito depois da unificação do Alto e Baixo Egito, atribuída a Menes, foi um fato consumado, respondia muito bem à maneira de pensar dos egípcios, que estavam inclinados a interpretar o mundo em termos dualistas, como séries de pares e contrastes em um equilíbrio estável: céu e terra, norte e sul, Geb e Nut, Shu e Tefnut. Wilson, por sua parte, chegou à conclusão de que era a dualidade dos Dois Países que produziu essa interpretação dualista. Isto não é impossível, já que o Egito sempre foi principalmente o “dom do Nilo” e que o rio, juntamente com o sol, foi a fonte e o símbolo da vida do país e dos seus habitantes.

O curso superior e o curso inferior do Nilo em si eram as divisões mais importantes, constantemente em conflito até serem unificadas como um todo dualista e depois em relação ao culto solar e à idéia de um mundo de quatro dimensões. O mundo do horizonte e o mundo dos dois países estavam frequentemente em uma situação de tensão, de choque, expressada nos mitos de Horus e Set, e o faraó atuava como mediador entre as forças divinas da ordem cósmica para o bem-estar do povo unificado e foi o centro dinâmico e estabilizador do país e quem o colocou em contato com as forças divinas e com os poderes dominantes do universo através de um processo sacramental, já que o próprio rei era uma figura cósmica e o corpo dessas forças. Na verdade, ele era o deus por cuja ação todas as coisas viviam, se moviam e existiam no vale do Nilo, e eram consubstanciales com seu pai celestial Atum-Re.

Assim, ele era como a fonte de toda a vida e de toda ordem, era também o campeão da justiça, já que viviaa por Maat, dispersando a escuridão da desordem e fazendo resplandecer o brilho de Maat no triplo sentido: cósmico, social e ético , como ritmo do universo, como bom governo promovendo harmoniosas relações humanas, promovendo a lei, justiça e verdade. O universo, de fato, era considerado uma monarquia, e o primeiro faraó egípcio e seus sucessores eram os reis do mundo em virtude de suas descendências de Atum-Re e de ter consolidado os Dois Países em uma única nação bem equilibrada, com o ritmo sazonal do Nilo seguro, que continua seu curso anual com evidente regularidade.

A OGDOADE[4] DE HERMOPOLIS

A Ogdoade de Hermópolis da mesma forma que as cosmogônias de Memphis e Helipolis, tinha em Hermópolis um Monte Primordial que teria sido exibido no começo dos tempos como uma ilha de chamas no meio das águas primitivas e uma série de oito deuses e deusas que personificavam o caos amorfo anterior a criação. O primeiro par destes oito deuses consistiu em Nun (as águas primitivas) e seu consorte Nunet (a extensão do céu acima do abismo). O próximo par foram Huh e Huker (a expansão imperceptível do primeiro caos amorfo) seguido por Kuk e Kuket (trevas e escuridão). Finalmente, Amon e Amonet, os aspectos intangíveis e secretos do caos, apareceram soprando como o vento sem indicar de onde vieram ou para onde iam.

À frente de tudo isso estava Thoth, provavelmente um antigo deus do Delta, que também era membro da Ennade de Heliópolis e que, juntamente com Horus, representavam o coração e a língua de Atum e Ptah. Embora ele nunca tenha sido um dos oito, acredita-se que estes oito deuses fossem as almas de Toth. Na forma de ibis, ele colocou um ovo sobre as águas da Nun dali nasceu o Deus do Sol, embora também tenha sido dito ter vindo de uma flor de lótus. Na sua forma hermopolita, Thoth foi autodesenhado, uma personificação da inteligência divina, onisciência e onipotência, e exerceu sua ação criativa por seu próprio poder divino, "pelas palavras de sua voz".

Mas a mitologia de Hermópolis estava tão desesperadamente confusa, que é impossível ter certeza de que Atum produziu os oito deuses ou os criou, e quanto à relação exata entre Thoth e eles e suas funções cósmicas, não é possível determiná-los com precisão. Mais tarde, no Novo Reino, Amon tornou-se chefe do panteão e até mesmo do Eneade tebana, tendo sido associado a Re de Heliópolis e ao seu culto na nova capital (Tebas), onde a cosmologia e a teologia de Amon- Re de Heliopolis e Thoth de Hermópolis foram amalgamados, deixando Ammon como suprema divindade solar. Thoth deixou de exercer funções criativas e tornou-se o Deus da Sabedoria e, finalmente, o juiz dos mortos, sendo aquele que ditava a sentença, uma vez que as almas haviam sido pesadas antes de Osiris. Suas antigas relações com a lua parecem ser a causa pela qual era considerado como contador de tempo e dos números, já que os cálculos foram feitos seguindo o curso da lua.

AMON-RA EM TEBAS

Durante o Novo Reino, Tebas chegou a adquirir proeminência como a mais importante das cidades sagradas, uma vez que o "olho do Rei" absorveu as cosmogônias de Memphis, Heliópolis e Hermópolis e seus respectivos panteões, fao fazer de Amon o corpo de Ptah e o rosto de Re, que dominava e penetrava todo o universo, dos céus ao submundo. Não havia, no entanto, nenhum deus reverenciado como o único ser supremo em qualquer lugar do Egito, exceto durante o breve período de Ejnaton, quando Aton, uma força monoteísta manifestada no disco do sol, foi temporariamente exaltada como deus Único. Mas isso foi inteiramente para a idéia egípcia do divino, e imediatamente após a morte de Ejnaton (em 1366), a combinação politeísta normal dos deuses, hierarquizados em panteões em torno de um centro primário de força criativa, com Amon-Re de Tebas como a última fonte de existência.

Os faraós eram sua representação e encarnação, mas também foram identificados com outro conjunto de deuses relacionados aos processos cósmicos e entendidos como uma unidade divina dentro das diversas formas da Ogdoáda, em que se manifestavam as qualidades, os atributos e as atividades de Amom sobre o univerm em geral e sobre a terra do Egito em particular. Tendo produzido o ser de todas as coisas, Ammon continuava a governar as estações e os dias, navegando sobre os céus e através dos infernos em seu navio, mandando nos ventos e nas nuvens, falando através dos trovões e dando vida aos homens , a animais e plantas.

E assim Tutancâmon restaurou a sucessão de Amom em Tebas, após a morte de Akenaton, e devolveu àquela cidade o caráter de capital do império. Foi então dito que ele havia expulsado a desordem dos Dois Países e que a ordem (Maat) havia sido instalada em seu lugar como nos primeiros tempos (isto é, a criação). Enquanto a sociedade era parte integrante da ordem divina do universo, que incluía a verdade e a justiça, suas leis eram idênticas às leis naturais e seus processos, e tudo isso também se originava e era igualmente governado pelo criador e pela sua encarnação na terra. Consequentemente, qualquer perturbação em um dos campos (como a heresia de Akenaton) tinha uma repercussão nas demais esferas do cosmos. Em consequência, para manter as condições do florescimento do país como nos tempos primitivos, Maat deveria ser posta no lugar da desordem e da mentira. Isto foi levado a cabo pelo Faraó e seus sacerdotes, que transmitiram essa missão a Maat a partir do mundo dos deuses, para que houvesse ordem e um bom governo na terra.


O DEUS CONSTRUTOR KHNUN

Sem dúvida, nenhum deus particular tinha o monopólio absoluto de todos os poderes e forças envolvidos nesta complexa concepção cosmológica do vale do Nilo. Enquanto em Heliópolis, Hermópolis e Tebas, o deus solar era a principal fonte, em Memphis, o deus o deus terrestre, Ptah, era aquele que reinava sobre os outros. Em Elefantina e em Philae, Khnun, um deus antigo da primeira catarata do rio Nilo, era o "criador do céu, da terra e do inferno, da água e das montanhas" e fabricou o homem com argila por meio de um torno de oleiro. Seus poderes eram tão grandes como construtor de deuses e de homens e ordenador dos fenômenos cósmicos, e ocupava uma posição importante entre os grandes criadores, não muito diferente de Ptah.

Seu símbolo era o carneiro, que se converteu na alma vivente do Rei, e também foi era representado com a cabeça de um falcão, para identificá-lo com Horus, deus celestial. Seu relacionamento com Re era tão próximo que na verdade ele às vezes era chamado Khunun-Re, e com esse personagem era uma manifestação do poder do deus solar em seus vários aspectos, particularmente em relação ao poder da procriação. E, finalmente, o rei, como o centro vital do Egito, foi equiparado a Khnun como o Deus construtor, "o engenheiro que dá alma aos homens".

A ORDEM COSMOLÓGICA

Se pensava que o universo físico, do qual o vale do Nilo era o centro, teria surgido do oceano primordial. Este, Nun, ainda subsistiu debaixo da terra e a cercou como o "Grande Círculo", o mesmoque os gregos chamavam Okanes. Que o mundo, tanto o céu como a terra, eram suportados por uma vaca, uma deusa, uma cadeia de montanhas ou uns pilares nos quatro pontos cardeais, e que o sol fisse filho da deusa celestial, o bezerro de Hathor ou o auto-criado Atum-Re-Khepri, tudo isto dependia do que fosse o principal mito cosmogônico que se aceitasse aceito e do centro cultural com o qual este mito estavivesse associado: Heliópolis, Memphis, Hermôpolis, Tebas ou Elefantina.

Os relatos da criação em que os vários deuses foram representados como a fonte primária e co-eterna de toda existência (seja Atum-Re, Ptah, Thoth, Amon-Re ou Khnun) encerravam, no fundo, apesar de suas inconsistências, a ideia de uma atividade criativa divina, que se manifestava no sol, no vento, na terra e nos céus, fazendo e moldando todas as coisas de acordo com planos e propósitos predeterminados. Isso era conseguido por um processo sexual de procriação pelo criador, ou pela projeção de seu pensamento expresso na palavra divina.

Dentro deste simbolismo cósmico, o Nilo, o sol, o céu, o touro e a vaca predominaram como a personificação dos poderes criativos divinos manifestados nos fenômenos cósmicos. As águas da inundação, que dividem claramente o país no Sul e no Norte, ou seja, o Alto e o Baixo Egito, constituem a imagem mais antiga e fundamental desses aspectos da criação renovada, enquanto o sol, particularmente no Sul, não se tornou muito mais tarde na figura dominante. De Heliópolis, a teologia solar se espalhou por todo o país, de modo que praticamente todos os deuses locais identificados de alguma forma com o deus solar e os cultos de todos os templos foram ordenados sobre a liturgia de Heliópolis, bem como sobre o seu o grande Ennade e seu Monte Primordial se tornaram o modelo de todas as mitologias cósmicas.

Junto a esta cosmologia solar, houve uma grande difusão de outra, baseada no oceano primordial, com suas várias ramificações em torno e sob a terra. Isso também se aplicava ao reino dos céus, quando a casa dos mortos se tornou o Duat ou os Champs Elyseos, na parte norte do céu, onde as estrelas polares estavam localizadas. 

O inferno de Osiris foi colocado no oeste e o próprio Osíris tornou-se a estrela Orion ("a estrela do horizonte a partir da qual Re se afasta"), nascendo e morrendo todos os dias, seguido de Isis, convertida na estrela do Cão ou Sotis. A pálida e cérea lua se identificaram com Osiris, representando sua morte e ressurreição, e a lua cheia tornou-se o olho de Horus, perdido na luta contra o Set.

Originariamente, a lua parece ter sido uma forma de Horus, o irmão gêmeo do sol, personificado como Khonsu, que apareceu em Tebas como filho de Amon e Mut. No Novo Reino, ele foi identificado como Thoth, que, no entanto, era originalmente o Deus da Sabedoria. Como Horus, ele foi representado como um jovem e muito bonito príncipe, com um disco e uma lua crescente na cabeça, carregando na mão o cajado dos pastores.

{1} - Cosmogonia = corpo de doutrinas, princípios (religiosos, míticos ou científicos) que se ocupa em explicar a origem, o princípio do universo; cosmogênese.

{2} - Ogdóade - era, na mitologia egipcia um agrupamento de oito divindades. Ogdóade é um termo de origem grega. Na língua latina dizia-se: Hemenu.

{3} - James Henry Breasted (Rockford, Illinois, 27 de agosto de 1865 - 02 de dezembro de 1935) foi um arqueólogo e historiador estadunidense. Brasted foi educado no North Central College (1888) no Seminário Teológico de Chicago, na Universidade Yale (Mestrado 1891) e na Universidade de Berlim (doutorado, 1894). Foi o primeiro cidadão estadunidente a obter um doutorado em egptologia. Breasted estava na vanguarda da geração de arqueólogos-historiadores que ampliaram a ideia de civilização ocidental ao incluir todo o Oriente Médio nas raízes culturais europeias. foi também o criador do termo "crescente fértil" para descrever a área do Egito à Mesopotâmia.









segunda-feira, 4 de setembro de 2017



O REVISIONISMO HISTÓRICO E O TERCEIRO GRAU



Autor: Ir.´. Gabriel Grande (Oriente da Argentina)
Tradução de Pedreiro de Cantaria
Revista Hiram Abif – Edição 135 – outubro/novembro de 2011

Participando de uma reunião maçônica, realizada entre família, porque não havia "quórum", por falta de MM. ‘. mas haviam muitos AApp:. e Comp:., nesta conversa e um M:. Maç:. , perguntei quantos eram os graus simbólicos e, depois de algumas respostas, tiradas à laço, um M: Maç:. deu uma explicação de acordo com sua condição. E eu simplesmente disse que o terceiro Grau não foi sempre como o conhecemos hoje, mas, acrescentei que antes ele não existia. Um grande maçom, em anos, me disse que eu estava falando sem sentido. Como ele era um homem velho, não lhe contestei, mas esclareço que uma coisa é ser ancião e outra coisa é ser velho. O ancião tem anos e também sabedoria, o velho só os anos.

A história da Maçonaria no que diz respeito a suas origens poderia ser dividida em dois ramos principais, um o místico, baseado em lendas, fábulas, expressões religiosas e outro racional, alimentado por fatos comprovados , ou pelo menos deduzido de premissas históricas

Há muitos anos eu li a biografia de Hipólito Yrigoyen, de Manuel Gálvez. Ele foi o primeiro presidente eleito, dentro da nova lei do sufrágio, conhecida como lei "Sáenz Peña". Deste Ir.´. ficaram várias impressões, por exemplo, que ele era comissário no bairro de Balbanera, sua paixão pelas mulheres, disputas com seu tio, nosso Excelso Ir. '. Leandro Alem, (que logo soube que não era pela condução do partido político, mas por problemas familiares, por um fato obscuro realizado por D. Leandro, que o levou ao suicídio. O Ir. '. Ap. '. Hippolytus, gastando sua fortuna, para fazer sua campanha política, essa riqueza não era de ascendência (herança), mas acumulada por ele, no exercício de "invernador" de gado, mas tinha uma maneira de comprar consciências, por exemplo, convidou um personagem de valia, que lhe fazia oposição política, e quando o tinha nas mãos, comentava sobre suas aspirações, sobre seus sonhos de uma pátria próspera, das grandes qualidades do fulano, e que necessitava de seu apoio para realizar o seu intento. Ou seja, quando conseguiu domar o opositor o levou abraçado e o acompanhou até a porta e comentou com atenção: “ah!, sobre esse empréstimo que lhe foi negado no Bando, dê por certo, amigo! E o primo tornou-se "Yrigoynista" até a última hora de sua existência.

Uma maneira de fazer política, própria do caudilho, o líder, que conhece a alma humana e sabe onde encontrar sua fraqueza, primeiro em sua afeição e depois no bolso. Também me lembro do luto com o eterno denunciante de Lisandro de la Torre, este foi para às espadas, e embora Lisandro fosse um espadachim eximio, don Hipólito colocou um plano em açãor e, depois de derrotá-lo, recusou-se a estender-lhe a mão, tirou seu chapéu coco e o ordenou a se mudar, deixando o também I. '. , La Torre com a cabeça partida e a boca aberta. É para entender que há muito mais lembranças sobre esse político argentino, do qual não sou correligionário, mas eu o respeito. Outro fato que me lembro, que don Hipólito, era a favor do Krausismo. Esta foi a primeira vez que aprendi sobre a existência da corrente filosófica, dominada pelo alemão Krause.

Trate de burilar esta prancha sem viorlar esse sutil mandato, de "não passar de grau".

Em 1805, Carlos Cristian Krause foi iniciado na Loja “Arquimedes”. Em 1810, recebeu o chamado do secretário da sua nova Loja "Três Irmãs", na cidade de Dresden, capital da Saxônia, citando-o ao Conselho no qual ocupou Orador. Aos trinta anos, seu nome já era de prestígio nas Grandes Lojas da Alemanha. Mas nem todos gostavam de seu trabalho. Sempre Interessado na investigação dos documentos maçônicos que tiveram relação com o pensamento e a origem da Maçonaria. Foi assim que ele entendeu a dimensão da Maçonaria e sua utilidade como ferramenta para executar o sistema filosófico que ele havia organizado em sua mente, já que ele era doutor em filosofia

Pensava sobre a maçonaria e na tarefa do maçom:

"É a única instituição histórica cujo propósito e razão de ser é o cultivo do homem em sua pura e completa humanidade", "A arte de educar o polifaceticamente homem enquanto homem, e a humanidade enquanto a Humanidade, isto é, a arte de despertar, dirigir e formar completamente sua vida; A arte de alcançar tudo aquilo para o que o homem foi chamado. E é ao mesmo tempo a totalidade de todos os conhecimentos e artes que necessariamente pertencem a esta tarefa"." Você dará à humanidade o que o Estado, a Igreja, a família e a amizade não podem lhe dar: perfeição multiforme, equilibrada e harmoniosa de toda natureza humana, alcançada em uma paz definitiva, numa sociedade linda e cheia de amor "

Para Krause, a humanidade era uma unidade orgânica, argumentando que o maior problema disso era que era muito frágil. E ele acreditava que a Maçonaria era a organização mais adequada para concentrar a população humana, com o objetivo de alcançar o bem-estar de todos. Ele sonhava com uma superintendência política, uma espécie de "Grande Confederação Universal", capaz de congregar diferenças religiosas, raciais e sociais em uma união fraterna, onde o bem comum estava acima das facções e dos interesses pessoais. Krause sabia que suas idéias incomodavam a "velha guarda" que via nele, um elemento perigoso, para a velha liderança. Grande sonhador, o Q. '.Ir.'. , Krause, era o tipo de pessoa que, apesar de tudo, se comprometeu a mudar, em busca de uma existência mais equitativa entre os homens.

Na Alemanha, como na Inglaterra, na França e na América do Norte, estavam os centros mais ativos da Maçonaria, que teria espalhado as correntes "filosóficas", alegando que a origem da Ordem remonta aos primeiros mistérios do Egito e da Índia. Multiplicaram-se os Ritos e os “Altos Graus”. Os únicos trabalhos recebidos com prazer foram aqueles que confirmaram, independentemente dos fundamentos, a relação da Maçonaria francesa com as antigas escolas iniciáticas, sejam egípcias, indianas, gregas, essênicas ou do planeta Marte. Qualquer hipótese sobre esse relacionamento era crível, mesmo que fosse ridículo.

Krause estava contra esta posição. "Recriminava que os rituais careciam de uma historiografia cientificamente analisada e acreditava que com os antigos registros poderiam ser reconstruídos, usando um critério racional, com base em uma investigação histórica imparcial. Ele acreditava firmemente que todo este labirinto esotérico não veio da Maçonaria, mas que havia sido implantado por pressões das tendências dos rosacruzes, cabalistas e místicos da época. Ele descreveu as ocorrências do Ir. '. Marquês de Ramsay, no mito templário. Ele afirmou que a origem da Irmandade nas Faculdades de Arquitetos da Roma antiga deveria ser buscada. E ele provaria isso em seu livro.

A rebeldia de Krause seria objeto da perseguição dos anquilosados[1] ​​de sempre, que se opõem a qualquer estrutura de pensamento que não se encaixa na sua estreiteza mental.

Diante do fracasso das ameaças do conservadorismo maçônico, as Lojas recalcitrantes enviaram-lhe um anúncio, dispostos a pagar um preço elevado em "medalhas profanas" por seu manuscrito, mas isso também falhou. É de se entender que o Ir. '. Krause não estava à venda. E publicou seu livro, intitulado "Os três mais antigos monumentos fundamentais da Maçonaria e sua História" (editado em Dresden, 1813), este se espalhou nas lojas alemãs e determinou a sorte de Krause. Ele foi expulso, um costume arraigado em nossa Irmandade Universal, que se orgulha de ser amante do progresso, tolerante e amorosa, de estar na vanguarda das novas ideias. Mas todos os IIr. '. que tem uma visão diferente, é atingido de forma peremptória, segundo dispõe o imobilismo.

Mas eles não puderam evitar a mudança, que o tempo esclarecedor, impõe. O historiador Gallatin Mackey comentou que esses fatos foram a página mais negra da Maçonaria alemã. Krause foi isolado e a Ordem o impediu receber o título de Catedrático. Ainda assim, Krause foi um extraordinário professor de filosofia. Continuou escrevendo e morreu excomungado por seus Irmãos e para a eterna vergonha da Maçonaria Universal, o dia 27 de setembro de 1832. Mas, a partir de então suas ideias, com o esforço de outros Irmãos, começaram a gerar uma nova literatura maçônica.

Comenta o já citado Ir.´. Gallatin Mackey:. "Krause tornou-se, ao longo do tempo, o paradigma de uma grande contradição; o de uma Maçonaria que, a partir de então, passou a possuir no seu coração ardentes partidários daquela continuidade iniciática, sem interrupções e dos revisionistas que constantemente procuraram compreender as origens reais da Ordem, investigando em fontes confiáveis, convencido de que aquela tradição iniciática se infiltrou nas Corporações de Construtores em tempos relativamente modernos. Entre ambas posições existem infinidade de teorias cuja complexidade de matizes se tornou necessária para a realização de verdadeiros trabalhos enciclopédicos.

Se recordarmos as obras clássicas da história da Maçonaria, encontraremos duas teorias bem diferenciadas que estabelecem as origens da Ordem. Uma nas escolas do mundo clássico, e outra nas grandes corporações dos construtores do período medieval. Essas obras, que surgiram principalmente nos séculos XVIII e XIX, tiveram que ajustar a direção de suas investigações de acordo com a lenda central da Maçonaria, tirada do Antigo Testamento, quero dizer, a construção do "Templo de Salomão". Essas expressões são atenuadas, embora eu seja absolutamente racional e totalmente inclinado à origem da maçonaria nas corporações medievais. Eu entendo, por outro lado, que uma instituição, especialmente a nossa, deve ter uma origem, mesmo que seja um mito. Simplesmente para reforçar o sentido do corpo, de associação, é o mesmo que acontece nos países, quando se engrandece a personalidade do herói, quando é endeusado, porque tem que ter paradigmas, impossíveis de igualar. Mas isso não justifica roer unhas. Todos sabemos que os Iir.´. San Martin e Sarmiento usavam calcinha, e eram homens, grandes homens, mas nada sobrenatural. O mesmo acontece com nossas lendas, são isso e nada mais.

A necessidade de dar caráter histórico à tradição do Antigo Testamento forçou encontrar um fio orientador que se relacionasse com as associações de construtores de todas as idades, tornando-os repositórios de uma tradição comum e de uma doutrina secreta transmitida ao longo dos séculos. Este pensamento estabeleceu então uma ligação direta entre diferentes instituições, surgidas em diferentes épocas e culturas. Este elo é cortado continuamente, por não ter sustentação em semelhante

Em uma síntese próxima, poderíamos dizer que, nesta teoria, os "Mitos dionisíacos", os "Colégios romanos", os "Construtores de catedrais" são raios da mesma roda, uns outros reais e outros imaginários que contêm um argumento exemplar. Então, através de manobras entrelaçadas, esta roda nos une aos "Trabalhadores do Templo de Jerusalém" e até mesmo com construtores muito mais antigos, chegando ao próprio Éden, são aqueles que afirmam que não só o próprio Adão foi Maçon, mas Jesus também e que foi iniciado no Egito.

A historiografia deve basear-se no uso científico dos recursos que lhe são próprios, enquanto a Tradição não precisa de fatos, mas de significados. A tradição não requer uma conexão real ao longo dos milênios, uma vez que o mito que a sustenta é inato para a humanidade e para a psique do homem, independentemente do tempo e do lugar em que se manifesta.

Por outro lado, desde o surgimento das primeiras civilizações na Ásia Menor, Mesopotâmia e Egito, nunca se parou de construir. Esta é a razão pela qual podemos ter certeza de que houve uma continuidade entre gerações de novos arquitetos de construção.

Eles reuniram a experiência de seus predecessores, mas este nexo ocorreu em áreas próximas, e eles passaram de uma região para outra em um período parcial e em um tempo, muito extenso, tão extenso quanto séculos, demasiado para toma-lo como continuidade. Claro, não existe um fio comum entre eles. Ainda não temos a menor ideia de como as pirâmides foram construídas, no planalto de Gizé.

Em oposição a esta corrente, autores como o expulso Carlos C. Krause instalaram a opinião mais razoável de que a origem da Maçonaria deveria ser buscada nas sociedades de arquitetos da Roma antiga e em corporações de construtores medievais.

O vínculo entre a origem da Ordem e as Escolas do Mistério da Índia, Oriente Médio e Egito cresceu dentro da instituição com o mesmo impulso que cresceu na sociedade europeia de ontem, as grandes descobertas arqueológicas e um forte ressurgimento com as filosofias do Oriente, que se tornaram de moda novamente. Se sustentava de forma caprichosa, que nessas civilizações, havia nascido a Irmandade Maçônica, além de que essas escolas estavam relacionadas umas com as outras historicamente.

Assim, os construtores que chamaram Salomão a Jerusalém para construir o Templo, faziam parte de uma organização muito extensa e distribuída por todo o Mediterrâneo, por sua vez entrelaçados com as grandes Escolas dos Mistérios do Oriente e do Egito. Essas corporações do Oriente Próximo daqueles tempos estão diretamente relacionadas aos essênios e às instituições dionisíacas. Algo desse ponto de vista racional impossível. Levemos em conta as distâncias, os tempos desiguais, as linguagens e a pouca mobilização da humanidade. Não esqueçamos que a vela latina, utilizada pelos árabes durante séculos, foi adotada pelos europeus nos séculos mais tarde. Foi esse avanço tecniconológico, que deu origem a grandes descobertas geográficas

Em todo caso, o que viria a unir a Maçonaria moderna com os Mistérios Antigos, é a Lenda de Hiram Abif. Mas isso tampouco é provávelo, como assinala o historiador Goblet d'Alviella em seu livro "As Origens do Terceiro Grau em Franco-Maçonaria", não há menções de Hiram, nem de sua lenda como parte do ritual maçônico em documentos anteriores ao século XVII. O mesmo se aplica aos documentos antigos, como o manuscrito "Regius" ou "Cook". Igualmente assinala este respeitado historiador que até o ano de 1757 não havia sido generalizado o Grau de M. 'Maç.'. O ritual do grau de M. não foi introduzido na Maçonaria, mas sim depois da transição da maçonaria operativa para a especulativa. A Maçonaria atual usa a lenda de Hiran na cerimônia de elevação para o terceiro grau. Até 1738, esta iniciação não era obrigatória. .

O historiador e H.Samuel Pritchard escreveu que naquele ano: "Não havia um Mason em cada cem que pagasse as despesas exigidas pela “Parte do Mestre”, se não fosse motivado pelo interesse".

Embora a Maçonaria não tenha uma sucessão histórica desde os templos de Delfosa ou Luxor não implica que a incorporação dos antigos mistérios seja uma falha, especialmente se entendemos que são de alguma forma uma fonte de conhecimento universal. Mas se os adotarmos como uma fonte inspiradora, uma forma de ensino, isso é o melhor, mas outra coisa é acreditar, ou fazer-nos acreditar, que nossa origem é daqueles tempos remotos.

Finalmente, a crença comum de que os três graus simbólicos foram obtidos pela divisão do trabalho medieval e, ainda mais antigamente, não é aceito, pois somente se encontraram documentos em Londres, onde, onde se menciona o terceiro grau. Isso aconteceu no G:. L:. de I:. em 1738, quando o terceiro grau é sancionado, como eu disse, e foi generalizado em 1757

Apesar de alguns testemunhos que remontam a lenda de Hiram no século XVII, se aceita por unanimidade que essa foi incorporada na maçonaria especulativa entre 1720 e 1723 e isso, não sem causar certa resistência. É provável que, quando Anderson foi encarregado de compilar os antigos costumes e costumes da Maçonaria Operativa, ele tenha destruído muitos documentos. Muitos historiadores descreveram isso como um verdadeiro "auto de fé", não nos esqueçamos de que Anderson era um pastor presbiteriano, capelão de um registro " e é discutido ainda hoje, se foi iniciado na G: .L: .U:. da I.´..

A partir desse momento, tornou-se muito difícil reconstruir o que eram as lendas e as tradições do período anterior. É possível que Anderson e seu genro Desaguliers aproveitassem alguns dos escritos que encontraram nesses documentos e, com eles, construíram a lenda de Hiram. É possível, ainda, que eles tomassem essa figura secundária na mitologia dos maçons "operativos" e a ampliasse para fins didáticos. . Em 1738, a lenda já se espalhara pelas Lojas. Desta forma, pouco a pouco, foi difundida pela nova maçonaria especulativa. Assim chegou a lenda ao acervo maçônico e a importância que tem na doutrina da Irmandade

"A Sombra de Salomão", assim se intitula um dos livros de Laurence Gardner, que era M. 'Maç.'. , na G:. L:. U:. da I:. - Ele tem se dedicado à pesquisa. Editou vários livros. Em seu trabalho "A Sombra de Salomão", mostra alguns dos mitos criados em torno da Maçonaria e que se encaixam com outras publicações. Se lemos o Manuscrito Regio, a menção de Euclides não parece estar errada, , por exemplo, na referência de Noé.

Este autor deixa claro algumas dúvidas sobre certas inconsistências. Primeiro, diz que o terceiro grau foi instituído após 1724. Por outro lado, a lenda de Hiram foi formulada gradualmente no período já mencionado, de 1723-1757. "A morte de Hiram não é mencionada na Bíblia, nem no primeiro ou segundo grau da Maçonaria, mas fica no centro da cena no terceiro grau. Ela é nomeada nas Constituições Anderson de 1723, mas a lenda maçônica de sua morte não é mencionada. Por outro lado, Hiram é citado em um obscuro catecismo maçônico conhecido como "Manuscrito Grahan" de 1726 e em A Maçonaria Dissecada de Samuel Pritchard", de 1730. Isso é tudo o que existe da lenda de Hiram até que ela faça sua primeira aparição nas "Constituições Revisadas de Anderson em 1738". Se o terceiro grau de Maçonaria foi introduzido ao redor do ano, 1724, isto indica que a história do assassinato de Hiram, atualmente em vigor, tem apenas 273 anos (em 03 Set 17)

O termo "Abif" não é mencionado na Bíblia, mas sua origem é atribuída ao francês como vários termos adotados pela Maçonaria e tem sido distorcidos pelas traduções. É provável que venha de Hiram a biffe, o que significa "Hiram, o que foi eliminado". Os maçons, e aqueles que não são, conhecem essa lenda, que não é um segredo, já que a lenda de Hiram é uma das mais divulgadas quando se trata da Maçonaria

Embora Hiram tenha sido colocado em primeiro plano por Desaguliers e Anderson, criando uma parafernália mitológica para apoiar e fortalecer a nova instituição e o novo grau, Gardner coloca "o tapete" alguns fatos que, à luz de suas análises, fazem mais sentido , e diz: "Antes que Hiram fosse colocado em cena, o personagem principal na representação da indústria da construção, dentro da tradição maçônica, era Noé". A história, tirada do Antigo Testamento conta que os filhos de Noé, Sem, Cam e Jafé, teriam ido ao seu túmulo para descobrir um segredo que teria sido enterrado com ele e aqui os delírios começam a surgir porque a história que se segue e que não está na Bíblia, lembra a história de Hiram e, em outras palavras os nomes dos três filhos foram substituídos por três trabalhadores do templo: Jubela, Jubelo e Jubelun.

Gardner explica assim: "Seja qual for o propósito original dessa estranha história, faltava os elementos-chave para torná-la uma boa história, por isso lhe adicionaram mais elementos, tais como: a traição, o assassinato, o martírio e uma vingança. Com essas adições, Desaguliers conseguiu um enredo emocionante, mas acreditava que seria necessário mudar o personagem central para associar a história à pedreira, em vez de um Noé que trabalhasse a madeira. Assim, a lenda de Noé tornou-se a lenda de Hiram Abiff, tendo como base a construção do Templo de Salomão.


Bibliografia
1 “Vida de Hipólito Yrigoyen” de Manuel Gálvez 
2 “Enciclopedia de la Masonería”, de Gallatin Mackey 
3 “Historia General de la Francmasonería”, de José Gabriel Findel 
4 «Los orígenes del grado de Maestro en la Francmasonería» de Eugenio Goblet D’Alviella 
5 “La Sombra de Salomón” de Laurence Gardner. 
6 “Historia de los Hermanos Tres Puntos” de Alberto J. Triana 
7 La Biblia en su “El Antiguo Testamento”

[1] Anquilose ou Ancilose (do grego ἀγκύλος, dobrado) é uma adesão anormal com rigidez de uma articulação, resultado de uma lesão ou doença.