quinta-feira, 17 de novembro de 2016


UMA VOLTA ÁS ORIGENS (MAÇONARIA)


Autor: João Anatalino

A função dos “Mistérios”


Os antigos gregos eram, sabidamente, um povo de grande potencialidade espiritual. Vivendo em um território extremamente pobre em recursos naturais, como ainda hoje é a Grécia, eles construíram um fantástico império cultural, cuja influência se faz sentir até hoje. Essa grandeza cultural não estava presente apenas nas instituições políticas e sociais que servem de alicerces para as nações modernas, mas principalmente na estrutura arquetípica que dava fundamento ao psiquismo do povo grego. Essa psicologia transparecia em seus mitos, seus heróis, seu folclore e suas crenças, os quais refletiam o caráter místico e iniciático dessa cultura, e lhes dava suporte psicológico e moral para superar as dificuldades que um ambiente hostil e deficiente em recursos naturais lhes impunha. 

Toda tradição esotérica está vinculada ao mito dos heróis. A própria palavra “herói” significa guardião, ou seja, aquele que nasceu para servir e conservar (a tradição).[1] Por isso as provas enfrentadas nos chamados Mistérios eram verdadeiros desafios, nos quais o iniciando precisava sair vivo para dar mostras de que era merecedor do beneplácito divino. Daí todas as histórias a respeito dos heróis, em qualquer tradição, estar sempre ligados á lugares comuns como cavernas ou grutas escuras (câmaras de reflexão), combates contra monstros (símbolos dos vícios humanos), passagem pela água, pelo fogo, descidas ao interior da terra e jornadas pelos elementos em fúria (como se observa no ritual de iniciação da Maçonaria).[2]

Os gregos entendiam que a verdadeira iniciação, a entrada sistemática e natural no Éden, (figurado pelo Jardim das Hespérides) era o ingresso do homem no próprio seio da natureza. E essa ação não ofendia aos deuses e não atraia nenhum castigo sobre aquele que a praticava, como visto na doutrina judaico-cristã. Para eles, esse domínio do homem sobre a natureza era mesmo uma imposição da sua própria função na sua aventura sobre o Cosmo. O homem, um dia, saiu do Éden e a ele deve voltar. Isso quer dizer que ele pertence á natureza e dela não pode dissociar-se. Só não pode assaltá-la, nem violá-la para nela reingressar. Nem deve esperar que ela lhe revele seus mistérios á força. E mesmo que venha a ter sucesso dessa forma, essa vitória nunca será duradoura. Como aconteceu, por exemplo, a Hércules e ao rei Eristeu, que roubaram os pomos dourados do Jardim das Hispérides. Os pomos roubados tiveram que ser devolvidos aos deuses porque seus possuidores não souberam o que fazer com eles. Assim é. A “sabedoria”, ou qualquer outro bem conquistado á força, ou por meios criminosos, sempre acaba destruindo seus possuidores. Lição que nossos políticos não aprenderam até hoje.

A razão do silêncio

Nessa alegoria há também uma clara condenação aos poderosos que se utilizam de “iniciados”, de mestres, para atingir seus propósitos profanos de aquisição de poder. Por isso, na tradição hermética, sempre se aconselha aos “filhos da ciência”, aos mestres, aos iniciados, que se afastem do poder político, e que não se deixem usar pelos poderosos de plantão. Essa é uma das razões do silêncio exigido pelas sociedades iniciáticas. Seus segredos, seus mistérios, seus conhecimentos não devem ser utilizados com fins profanos.
Na Maçonaria, a aquisição do conhecimento tem finalidades éticas e espirituais. Trata-se, em última análise, de promover o aprimoramento do indivíduo para que ele seja a pedra angular do edifício social e não o artífice de um poder temporal, que nada edifica de bom e duradouro, mas serve somente como alavanca para a promoção de interesses e vaidades pessoais. Essa é a razão do silêncio imposto sobre os membros da Irmandade com relação á tudo que se é tratado em Loja. Não tem nada a ver com conspiração ou heresias. Trata-se apenas de sigilo de informação. 

O significado da iniciação

Os gregos entendiam que a vida de um iniciado era, por si só, constituída de hercúleas tarefas, que deviam ser cumpridas independentemente dos resultados. Para eles, o iniciado, e queremos com isso nos referir ao próprio maçom, era um arquétipo do herói necessário, que nasce para realizar feitos importantes para a vida comunal. Ele entra na história, realiza seu trabalho sem perguntar por que o está realizando, faz o que tem que fazer, e sai de cena sem esperar pelas homenagens.[3]

Ele sabe que é muito mais importante o momento de sair do que o de entrar. Os que esperam receber homenagens, agradecimentos, troféus pelo cumprimento das suas obrigações, ganham exatamente aquilo que vieram buscar: as honras momentâneas, os agradecimentos de praxe, as congratulações de momento, que serão imediatamente esquecidas assim que eles virarem as costas. Como deles disse Jesus, “esses já receberam sua recompensa”. Mas o verdadeiro herói, aquele que cumpriu a sua obrigação e foi embora procurar outros lugares e outras pessoas que precisam dele, sem esperar pelas homenagens, esse sobrevive para sempre no ideário popular. Assim era o herói das lendas gregas, e por isso ele sobrevive, até hoje, no imaginário popular. Por isso, em todas as etapas de realização dos chamados Mistérios de Elêusis, eram destacadas aos iniciandos as disposições que garantiam a privacidade dessas iniciações e o caráter sagrado que a elas eram conferidos. Por isso era encarecido a eles, sob pena de exílio, ou até mesmo de morte, que as seguintes disposições fossem observadas, lembrando que essas disposições foram adotadas pelos códigos maçônicos atualmente em voga.

1. Manter sigilo sobre o local da iniciação, nem revelar os segredos a ele revelados a quem não for da mesma ordem e grau, ou os nomes das pessoas que lhe comunicaram esses segredos. Nesse compromisso estava o respeito á discrição exigida em toda tradição iniciática, que já foi comentada acima como necessidade imperiosa da própria atividade.[4]

2. Esforçar-se para contribuir na formação de uma sociedade justa, humana e igualitária, e primar pelo comportamento digno nas atividades públicas e privadas. Nessa disposição estava patente a clara disposição do iniciado em vencer suas paixões, abstendo-se de usar a Irmandade e os segredos que lhe foram confiados para a obtenção de vantagens pessoais.

3. Manter respeito á família, as leis e aos bons costumes, o que implica na prática de um comportamento social, familiar e sexual compatíveis com a condição de iniciado.

4. Não reconhecer outro guia que não a Razão e o Espírito de Justiça, que significa que o comportamento do iniciado deve ser sempre sensato, equilibrado, racional, jamais impensado, irresponsável e inconseqüente, pois isso é incompatível com a prática iniciática.

5. Procurar realizar o progresso pessoal e coletivo num estado de ordem, lembrando sempre que o primeiro não é possível sem o segundo. (Essa divisa, que inclusive foi adotada no Pavilhão Nacional do Brasil por influência da Maçonaria, é um imperativo do próprio processo de desenvolvimento do individuo e da coletividade, seja como organismo biológico, seja como realidade social. No organismo biológico, a saúde é um estado de ordem em que todos os sistemas que compõem o corpo humano estão em harmonia; na sociedade ela reflete a sua organização geral, razão pela qual, sem que essa ordem seja alcançada, nada pode ser realizado em termos de progresso; da mesma forma, as sociedades onde imperam a desordem, a desarmonia, as lutas internas e externas, jamais poderão realizar um progresso adequado. Por isso um dos lemas fundamentais da Maçonaria é realizar a “Ordo ab Chaos”, a Ordem no Caos.)

6. Buscar nos relacionamentos humanos aqueles que forem honrados, virtuosos, francos e produtivos, capazes de realizar o progresso mútuo e o enriquecimento ontológico dos espíritos neles envolvidos
7. Não buscar deliberadamente os cargos, as comendas, os títulos, as distinções, pois o propósito de todo iniciado é o serviço desinteressado, a construção do império da virtude e da Justiça. Nesse sentido o iniciado deve viver de acordo com uma Ética e uma Moral voltadas á realização integral do homem como criatura temente aos deuses, como uma obrigação dele mesmo, como individuo, e não como uma façanha que mereça encômios.

8. Buscar a sabedoria como forma de entender o mundo e ajudar a realizar a tarefa dos deuses na construção de um universo perfeito. (nesse sentido é bom lembrar que o termo Grande Arquiteto do Universo foi cunhado por Platão, que entendia ser o mundo traçado por Deus como arquiteto e construído pelos homens como seus pedreiros). Isso implica numa atitude não somente racional perante a vida, mas também de crença ilimitada no Princípio Soberano do qual emana tudo que existe no Cosmo. Significa que o iniciado, a par da racionalidade que deve procurar imprimir nas suas atitudes, tem que manter uma relação mística de admiração e respeito pelos mistérios da natureza e pela magnificência do seu Criador. Com isso, jamais correrá o risco de ser, como bem lembrou Anderson, “um ateu estúpido nem um libertino religioso”. Jamais se esquivará, também, de sempre buscar o auxilio de Deus, o que, sem dúvida, nunca lhe será negado. 

Os Antigos Mistérios e a Maçonaria moderna

É para isso que serve a prática iniciática, e essa é também a função da verdadeira fé. Os iniciados devem estar dispostos a arrostar mesmo os perigos do inferno quando se tratar de socorrer, de resgatar seus irmãos que estiverem lá acorrentados e que por suas próprias forças não conseguem se libertar. E não pode temer os monstros que encontrará, ou os perigos que terá que enfrentar, nem as dificuldades que terá que superar. E como o herói das lendas gregas, muitas vezes terá que conviver com a decepção de ter que devolver aos infernos os troféus que de lá resgatou. É que o destino das pessoas e o controle dos acontecimentos não estão, na verdade, nas mãos dos homens, mas pertence unicamente ao Grande Arquiteto do Universo. Mas, ainda assim, o herói, como o maçom, jamais poderá furtar-se de cumprir sua missão, pois para essa tarefa foi escolhido, para isso foi submetido a uma iniciação.

Um grande erro que algumas Lojas maçônicas têm cometido, em nossa opinião, é o fato de que, para atender a objetivos simplesmente profanos, como o são os interesses pessoais de seus membros, essas Lojas têm admitido em seus quadros pessoas não qualificadas para perseguirem os objetivos da Ordem. 

Essas pessoas entram para a Maçonaria, mas jamais alcançam, ainda que subindo todos os graus da Escada de Jacó, os verdadeiros objetivos da Irmandade. É que a Verdade da Maçonaria não está nos rituais, mas na prática diária dos seus ensinamentos. Desde que Anderson e seu grupo empreenderam a tarefa de transformação da antiga Maçonaria especulativa, simbólica e iniciática, numa sociedade formal, com o objetivo, a nosso ver, exotérico, qual seja, o de integrar os mistérios das antigas religiões com a filosofia iluminista e sua idéia de progresso, a poderosa corrente de pensamento que fluía de seus quadros começou a ser conspurcada por objetivos meramente profanos e ideológicos. A Maçonaria moderna deixou as Lojas de Companheiros, onde congregava “obreiros úteis e dedicados”, para ganhar os salões luxuosos da nobreza, onde a cortesia e a sensibilidade dos “homens de espírito esclarecido, costumes morigerados e humor agradável”, foi confundido com a galanteria concupiscente dos cortesãos. É a essa “Maçonaria de salão” que a Rainha Maria Antonieta, e também Napoleão Bonaparte, se referiram em seus desdenhosos comentários.[5]

Nos tempos atuais a situação não parece diferente. A própria oração de encerramento dos trabalhos da Loja simbólica, quando se pede ao Grande Arquiteto do Universo para que “enriqueça as colunas” da Ordem com obreiros úteis e dedicados não tem sido atendido devidamente pelos próprios membros da Confraria, que cooptam pessoas mais por amizade pessoal, interesse social, financeiro ou político, fazendo de algumas Lojas mais um clube de lazer, ou um partido político, do que propriamente uma sociedade de pensamento, destinada a promover a construção moral do individuo e o aprimoramento ético da sociedade.

Não é demais lembrar que clubes de serviço, tais como os Lions e Rotarys foram fundados no seio da Maçonaria, para servirem de “braços sociais” da Ordem em seus objetivos filantrópicos. Dessa forma não vemos por que a Maçonaria, enquanto sociedade de caráter iniciático, deveria praticar filantropia. Aos maçons que propugnam por uma maior atividade dos irmãos nesse sentido, sugerimos que entrem para um desses clubes de serviço, cuja competência nesse setor já foi sobejamente demonstrada. A nós se afigura que a Maçonaria deveria voltar ás suas velhas origens, atuando como sociedade formadora de caráter e treinamento de lideranças. Nesse sentido, sua função seria a de pesquisar todas as tendências do espírito moderno e ofertar á sociedade, além da uma crítica judiciosa, ponderada e isenta de qualquer preconceito, também um conjunto de ações tendentes a influir, de forma decisiva no processo social. Nesse sentido as Lojas atuariam como verdadeiros“ filtros” onde o pensamento seria purificado dos males que o vício, a intolerância, a cupidez, a ambição desmedida e a imoralidade acarreta aos nossos espíritos. 

Essa era a função dos Mistérios nas sociedades antigas, como bem disse o senador romano Cícero, iniciado nos Mistérios de Elêusis. “Muito do que é excelente e divino faz com que Atenas tenha produzido e acrescentado ás nossas vidas, mas nada melhor do que aqueles Mistérios, pelos quais somos formados e moldados partindo de um estado de humanidade rude e selvagem. Nos Mistérios, nós percebemos os princípios reais da vida e aprendemos a viver de maneira feliz, mas principalmente a morrer com uma esperança mais justa” escreveu o grande orador.[6]

Uma volta ás origens

Essa foi a razão que norteou os fundamentos da Maçonaria moderna, e que deveria ser recuperada pelos Irmãos de hoje. Pois a não ser assim estaremos perdendo uma idéia que tem sido desenvolvida ao longo dos séculos e pela quais muitas vidas e consciências já foram sacrificadas. É preciso pensar em melhorar a qualidade dos Obreiros da Arte Real e não simplesmente aumentar o seu número. Nisso, como em toda prática iniciática, é de bom alvitre relembrar a velha lição: o verdadeiro conhecimento, quando é compartilhado com pessoas indignas dele, se abastarda e se corrompe. Sendo fato histórico torna-se mito sem conteúdo; se filosofia ou ciência, torna-se rito vazio e sem propósito, praticado apenas como uma grosseira imitação da verdade.
É preciso recuperar as nossas origens. Aos maçons de espírito esclarecido cabe observar esse fato. Embora não exista hoje, qualquer mistério na Maçonaria oficial, e mesmo que a antiga tradição tenha sido enfraquecida pela inclusão, nos rituais, de diversos temas mais apropriados ás salas de aula de uma universidade qualquer, é ainda nas Lojas maçônicas que poderemos encontrar o velho espírito das sociedades secretas e sua aura de misticismo, que ainda funciona como um poderoso emulador para os espíritos mais sensíveis. É preciso que esse clima não se perca com disputas mesquinhas e proposituras mais apropriadas aos objetivos de agremiações políticas de baixa envergadura e escusos objetivos, mas não à Maçonaria propriamente dita.

[1] Do latim servare (conservar).
[2] É nesse sentido que a Ilíada, a Odisséia, a Eneida, as Metamorfoses, a Divina Comédia, as lendas de Ísis e Osíris, a saga de Moisés e os hebreus no Êxodo, por exemplo, são jornadas iniciáticas por excelência. Todas apresentam esses elementos em comum: a passagem pela água e pelo fogo, o enfrentamento com os elementos naturais, a luta contra monstros e gigantes, etc. Essa é a saga do herói, do eleito de Deus...
[3] Segundo Junito de Oliveira Brandão- Mitologia Grega, III volume, Ed. Vozes, São Paulo, 1998, a função da iniciação, para o herói grego, é adquirir as virtudes da timé(honorabilidade pessoal) e da areté (excelência pessoal, superioridade. Por isso todos os heróis devem ter uma formação iniciática, período em que ele se ausenta de casa para romper com a antiga vida profana e adquirir a nova personalidade.
[4] Essa exigência de segredo vem dos Mistérios Antigos, especialmente os Mistérios de Elêusis. A proibição de revelá-los a quem não fosse iniciado fazia parte do ordenamento legal da República de Atenas. Consta-se que o general Alcebíades, herói das guerras com a Pérsia, foi desterrado por ter revelado a um profano uma parte desses Mistérios.
[5] Maria Antonieta, segundo diz Ambelain, teria comentado com sua mãe, a Imperatriz da Áustria, que na França todo mundo era maçom, denotando, com isso, que a Arte Real, nos anos que antecederam a Revolução Francesa, havia sido popularizada de tal forma que não poderia ser levada a sério. Por isso mesmo é que Napoleão, conforme diz Jean Palou, também se referira aos maçons como “pessoas que gostam de brincar” de cavaleiros.
[6] Dudley Wright- Os Ritos e Mistérios de Elêusis, Madras- São Paulo, pg. pg. 24.

João Anatalino

O MESTRE DE CERIMÔNIAS


Pesquisa e compilação: Pedreiro de Cantaria (José Roberto Cardoso)

Para falarmos sobre o Mestre de Cerimônias, dada a importância do cargo, necessário se faz que tenhamos um mínimo de conhecimento sobre sua origem.

É preciso levar em conta, que nas eras primitivas, o temor ao desconhecido levava à necessidade de se acreditar em algo. A solidão, a disputa pelo poder, tudo se transformava em cerimônias de adoração, de oferta.

Esse cargo aparece já entre os gregos cerca de 3.000 anos a. C., anunciando as fases das reuniões que aconteciam nos anfiteatros. 

Na China e no Japão o Mestre de Cerimônias narrava as competições de Arco e Flecha utilizando a força e o ritmo da voz para destacar as equipes mais importantes, calcado num conceito do poder e da nobreza.

Na Roma antiga, ele surge na figura do chefe dos trombeteiros que, sobre seu cavalo, após o toque das trombetas, anunciava a passagem do imperador ou as medidas reais como aumento de taxas, maior submissão, proibições e sanções.

“Na época Medieval, o Marechal era o oficial responsável pela parte disciplinar e logística dos exércitos, mas hoje está ligado à sua mais alta patente. Como tivemos exemplo do Presidente Marechal Manoel Deodoro da Fonseca e Silva (bastante ligado a Maçonaria, chegou a ser Grão-Mestre do GOB e Soberano Grande Comendador do Supremo Conselho do Grau 33 do Rito Escocês Antigo e Aceito). Mais adiante as monarquias europeias adotaram um cargo de nome igual, mas com função cerimonial, que era responsável por anunciar autoridades e convidados em festas, cerimônias e nas mais variadas situações. Ainda hoje algumas famílias reais como a inglesa e até mesmo o Vaticano têm um cargo semelhante”.[1]

“No momento de tradução do Ritual para o português, poderia se usar tanto um como o outro nome da função (Marechal ou Mestre de Cerimônias), mas acertadamente foi escolhido o de Mestre de Cerimônias, que evita a confusão do cargo cerimonial com o militar. Ainda foi adotado um bastão como insígnia. Isto também é herança da Idade Média e que também ainda está em uso nas culturas, europeias principalmente. O Marechal Militar ou o Mestre de Cerimônias medievais usavam um bastão como símbolo do seu cargo, denotando comando e liderança. O simbolismo é o de comando, semelhante ao cetro real, ao caduceu de Hermes ou o bastão de ofício dos sacerdotes e oficiais dos faraós egípcios.”[2]

Já próximo de nossa época ele aparece na figura do Arauto. Vestido de acordo com os costumes, anunciava a entrada dos convidados em festas da nobreza batendo três vezes um bastão sobre um batente, produzindo um som alto e seco. Talvez venha daí a batida que alguns Mestres de Cerimônia dão com o bastão, no chão das lojas, para chamar a atenção. 

O Arauto

Assim, foi se firmando a figura do Mestre de Cerimônias. Sempre em posição de destaque, iniciando e conduzindo as fases de uma solenidade, hoje diríamos que é uma das pessoas mais importantes para a implantação de um evento, pois a partir de sua presença "as coisas começam a acontecer”.

É um cargo de pompa, nobre, por suas próprias características. Nunca deve ser confundido com o Chefe do Cerimonial e quando isso acontece há o acúmulo de funções, podendo tirar o brilho do evento.

O Chefe do Cerimonial cuida de detalhes, daquilo que a solenidade necessita e, volta e meia, tem que deixar o local para cuidar e resolver percalços que acontecem durante o evento.

O Mestre de Cerimônias precisa de conhecimento, treinamento e aperfeiçoamento de sua função, necessita saber o que faz, como sair de imprevistos, como se dirigir e conquistar os obreiros, sem aparecer. 

Entre nós ele surge com a ritualística maçônica que não nasceu de uma eclosão do Céu. Sua criação é artificial, humana. A ritualística, no nosso caso, nasceu dos Antigos Costumes e sua proliferação (de rituais) criará ritos e isso fará com que a vaidade, a ganância, muitas vezes ajudadas pela imaginação, faça com que a razão perca espaço. A história dos rituais é muito complexa e a recitação das cerimônias, entre nós, parece ter ocorrido na França. 

Lembremos que o cargo de Mestre de Cerimônias surgiu na nobreza, e na maçonaria ele também tem a ver com os chamados Altos Graus, por conta dos aspectos esotéricos dos ensinamentos por eles ministrados.

Os aspectos teatrais, desde o ingresso no Templo, até as iniciações, elevações e exaltações, estão permeados dos costumes da nobreza.

O Mestre de Cerimônias é o responsável pela liturgia e ritualística de uma Loja Maçônica. Executa, dirige e conduz todas as movimentações em Loja. Sempre que um qualquer dos elementos da Loja deve circular nela, fá-lo acompanhado pelo Mestre de Cerimónias (melhor dizendo: seguindo-o). Sempre que a posição ou o estado de um dos objetos com significado ritual deve ser corrigida, quem efetua essa ação é o Mestre de Cerimónias. Cumprindo instrução nesse sentido do Venerável Mestre ou por decisão própria. É o responsável por toda a circulação no espaço da Loja e, consequentemente, pela sua fluidez e correção. É ele quem indica por onde se deve ir, para se fazer o quê.

O ofício de Mestre de Cerimônias é fundamental na execução do ritual do Rito Escocês Antigo e Aceito, porque é ele quem marca os ritmos e, assim, quem agiliza ou soleniza cada cerimônia.

A joia do Mestre de Cerimônias, no ritual de 1804 era uma vara com uma espada cruzada, passando a ser uma régua graduada, símbolo do aperfeiçoamento moral, da retidão, do método, da Lei além de carregar uma gama de simbologia, a partir do ritual de Mário Behring, pois ele é o encarregado por todo cerimonial da Loja, devendo, portanto, ser um profundo conhecedor da ritualística. É um cargo de muita importância na Loja uma vez que dele depende a perfeição dos trabalhos. Simboliza o aperfeiçoamento moral, a retidão, o método.
A régua

Vale lembrar também que o Mestre de Cerimônia empunha com a mão direita um Bastão (sucedâneo da Espada e da vara usada no ritual de 1804) encimado por uma régua que nos faz recordar do cajado dos primeiros pastores.

A Régua, que tem como uso principal o traçado de linhas retas, tem origem bastante antiga. Consta que era usada para medir as enchentes do Rio Nilo. É ainda utilizada, quando chamada “Régua de 24 pole­gadas” como instrumento para marcar o Tempo, que não deve ser desperdiçado na ociosidade, mas aplicado nos trabalhos para melhoria da Humanidade.

Deve o Mestre de Cerimônias ter pleno conhecimento dos Sinais, Toques e Palavras de todos os Graus. Deve também ter o mais completo domínio do cerimonial Maçônico, nas sessões Ordinárias e princi­palmente, nas sessões Magnas. O Mestre de Cerimônias, embora não seja uma das Dignidades da Loja, tem grande responsabilidade no andamento dos trabalhos, e por isto, para exercer este cargo, deve-se escolher criteriosamente um Irmão experiente.

Seu lugar em Loja é no Ocidente, junto à balaustrada que separa o Ocidente do Oriente, no pé da esca­da de acesso a este, à frente do Ir.´. Tesoureiro. O Mestre de Cerimônias é o diretor do cerimonial e a ele cabe cumprir a ritualística contida no Ritual.


Fonte de Pesquisa, entre outras:



[1] http://www.gabinetern.com/2011/02/ja-se-perguntaram-por-que-o-mestre-de.html 

[2] Idem.

quarta-feira, 16 de novembro de 2016


O MESTRE DE HARMONIA


Pesquisa de: Pedreiro de Cantaria (José Roberto Cardoso)


Na época do clubismo na Inglaterra, antes mesmo da fundação da Grande Loja de Londres em 1717, não havia a figura do Mestre de Harmonia. 

Nas reuniões era comum a presença de músicos tocando durante os ágapes e nos momentos de refresco que hoje chamamos de recreação.

Ele não figurava no nosso primeiro ritual do Rito Escocês Antigo e Aceito de 1804, só aparecendo, no caso das Grandes Lojas, no ritual de Mário Behring, de 1927, publicado em 1928.

A música é uma das sete artes liberais e faz parte do Quadrivium (música, geometria, astrologia e aritmética). Tem o dom de preparar o ambiente para a meditação, para o culto espiritual, não só acalma, ameniza, conforta, como pode curar certos tipos nervosos e ajudar na cura de processos orgânicos. Esotericamente, os sons penetram de tal forma no íntimo dos seres humanos que lhes dão Harmonia e Paz.

Muitos dos nossos irmãos dizem que devemos tocar músicas de Mozart, ou clássicas, pelo simples motivo de ter sido ele Maçom. Isso é muito comum na Alemanha e em alguns países europeus cuja cultura assimila aquela sonoridade.

No entanto, é bom sabermos que a música é uma das mais belas criações de Deus e está no trinar dos pássaros, no rebombar das águas e no assovio do vento, aliás, ela permeia todo o Universo, basta que tenhamos ouvidos para ouvir.

A Lira é a joia do Mestre de Harmonia e apresenta registros tão antigos quanto os da flauta (e da ocarina), havendo gravações iconográficas do instrumento na cultura egípcia, mais precisamente na tumba do faraó Ramsés III (1.198-1166) a. C.) e em cavernas iraquianas (2.900 a. C). Igualmente há relatos históricos de que o instrumento era encontrado na babilônia e na Mesopotâmia por volta do ano 500 a. C e, conforme relatos bíblicos, a harpa (lira), bem como a flauta, se faziam presentes na cultura judaica, desde antes do dilúvio (Gênesis – Capítulo 4 – versículo 21: “O nome do seu irmão era Jubal, esse foi o pai de todos os que tocam harpa e flauta”) sendo instrumentos bastante utilizados nos cerimoniais e festas. Naquela época nem se vislumbrava a música clássica tocada por Mozart, mas já haviam cerimônias e rituais com músicas.

A Lira, devido ao pequeno número de cordas (de 4 a 10) e cada uma representando uma nota única durou não muito tempo, sendo substituída pela harpa sinfônica de 47 cordas e 3 pedais e, veio dela todos os demais instrumentos de corda (cítara, guitarra, entre outros).

Não há informação de quem foi o criador da Lira, notadamente pelo grande número e diversidades de locais em que foi encontrada.

A Lira – Joia do Mestre de Harmonia

Vimos que ela é tão antiga quanto a flauta, mas recentemente cientistas encontraram esses instrumentos em uma caverna no sul da Alemanha com sinais de ter sido habitada por homo sapiens. Uma delas era feita de osso de pássaro e outra, do marfim de um mamute. A região tinha muita atividade pré-histórica. Ali, várias outras descobertas da mesma época da humanidade foram feitas. Isso prova que a flauta é mais antiga, mas isso não tira o brilho da Lira. .

Flautas antigas

Música é vibração, entonação e nos atinge conforme nossa sensibilidade.

Com o passar do tempo foram criados vários estilos musicais em conformidade com o período histórico, vejamos:

Por ocasião do renascimento, na Europa, cresce o interesse pela música profana (que não era religiosa). A música também é trabalhada em várias melodias, porém, ainda as melhores composições musicais dessa época foram feitas para as igrejas.

A música barroca foi assim designada para delimitar o período da história da música que vai do aparecimento da ópera e do oratório até a morte do compositor, maestro e instrumentista Johann Sebastian Bach. A música barroca foi muito fértil contendo elaborações, brilhantismo e imponência não vistos anteriormente na história da música, fato esse, talvez, devido à oposição aos modos gregorianos até então vigentes. A criação aflorou no período barroco e diversos gêneros musicais foram criados

Logo após veio o Classicismo e a música instrumental passou a ter maior destaque, adquirindo “porte”, elegância e sofisticação. São sons suaves e equilibrados. Nesse período criou-se, ainda, a sonata, e os espetáculos de ópera passam a ter um brilho maior, bem como as orquestras se desenham e passam a ter grande relevância.

Em seguida veio o Romantismo que era diferente e buscava o equilíbrio. A música buscava uma liberdade maior da estrutura clássica e uma expressão mais densa e viva, carregada de emoções e sentimentos. Os músicos, nessa fase, se libertam e visam, por meio da música, exprimir toda sua alma.

Podemos dizer que, esse período, para a música, foi uma verdadeira revolução. O entusiasmo foi grande, inovações, criações, novidades, tendências, gêneros musicais apareceram. Foi um período rico para a música, impulsionado pela rádio, e pelo surgimento de tecnologias para gravar, reproduzir e distribuir essa arte.

Pois bem, meus irmãos, escrevemos tudo isso para dizer que a música é universal e faz parte de nossas vidas desde os nossos mais remotos ancestrais.

Os hebreus circulavam o altar dos juramentos (Ara) cantando, louvando ao Senhor, agradecendo e pedindo graças.

Os Salmos eram entoados quase ao estilo da música Gregoriana e um deles, o de nº 133, faz parte das nossas reuniões e é lido quando da abertura do Livro da Lei em Loja de aprendiz.

Os indianos cantam mantras na expectativa de que os sons emitidos sejam luz a apagar as trevas dos pensamentos negativos da humanidade.

Portanto, antes de Mozart, nosso amado Ir.´., já usávamos a música cantada ou instrumental em reuniões e solenidades de culto a uma personagem divina.

Por tudo isto, a responsabilidade do Mestre de Harmonia é enorme, pois a ele cabe manter o equilíbrio das energias vibracionais da reunião em andamento.

“O Mestre de Harmonia é uma das figuras mais insignes da Loja, pois é o seu bom trabalho, o principal responsável pela harmonização das Sessões. O Mestre de Harmonia deve ser escolhido dentre os obreiros que tiverem gosto para a função e maior sensibilidade musical para colocar a música adequada na hora correta. Um bom Mestre de Harmonia nunca deixa a Loja sem algum tipo de música, nem que seja em surdina. Cabe-lhe a tarefa de embelezar uma Sessão com músicas inerentes ao que se está realizando em Loja. Compete-lhe selecionar as músicas e fazer com que o ambiente seja de paz e enlevo. ”

Bibliografia:
http://www.arte.seed.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=122

terça-feira, 15 de novembro de 2016

O CAJADO DE AARÃO


Autor João Anatalino

Na verdade, o simbolismo da Serpente de Bronze tem origem com o episódio bíblico do Cajado de Aarão. Moisés pediu a Aarão e a cada um dos doze líderes das tribos de Israel que trouxessem ao Tabernáculo uma vara de vime e nela escrevessem o nome de cada um deles. Isso foi feito para que o Grande Arquiteto do Universo escolhesse um deles para ser o líder de todos, dizendo: "a vara de quem pela manhã estiver florida, este será o líder e não mais suscitareis discórdia entre vós".

E sucedeu que a vara que floresceu foi a de Aarão e isso confirmou a sua escolha como Sumo Sacerdote. E a Vara de Aarão, que é a Vara da Confirmação, também é uma alegoria que se liga a tradição da espada flamigera, pois é com ela que se confirmam todos os direitos adquiridos pelos Irmãos dentro das Lojas.

REFLEXÃO MAÇÔNICA


Autor: José Roberto Cardoso (Pedreiro de Cantaria)

É comum encontrar  IIr.´. discutindo a origem da maçonaria e apresentando defeitos e incompreensão com o pensamento alheio.

A busca da Verdade é inerente a todos nós e a imaginação que fazemos dela é bem pessoal.

Nossa história se perde no tempo. Nossas raízes estão fincadas nas civilizações  e culturas antigas.

O homem primitivo, ao constituir a primeira família, depois as tribos, os clãs, observou que para viver em paz necessário era o estabelecimento de regras e então criou seus códigos de leis naturais,

Observou, ainda, que na parentela haveria de ter uma liderança, uma hierarquia e uma disciplina que colocasse ordem na comunidade.

Ao mesmo tempo observava a natureza das coisas e começou a viver o dilema da sua própria existência criado pela curiosidade (quem eu sou? de onde vim? para onde vou?) e, em sua grande maioria, deduziu que tudo teve origem em um ser superior, Criador do Universo, a que chamamos de Grande Arquiteto.

Viu que para preservar a coletividade teria que criar um sistema de previdência para amparar solidariamente aquele que adoecesse e não pudesse trabalhar ou a família, caso viesse a óbito.

Desde as mais remotas eras estão presentes os elementos básicos da maçonaria que são: uma associação; hierarquia, disciplina, princípios morais e éticos; princípios transcendentais; prática das virtudes (que aprendeu a identificar) e o combate aos vícios. Estes mesmos princípios não foram definidos na idade média e nem tampouco nos dias atuais.

Na minha opinião devemos a existência da maçonaria aos antigos canteiros e artífices; àqueles que trabalharam a argila dos tijolos queimados ou lapidaram as pedras, aos adoradores do sol e dos deuses, aos místicos e esotéricos de antanho que nos fizeram herdar através do DNA contido em nossos antepassados.

Essas experiências arraigadas em nosso corpo físico, fizeram com que variadas crenças habitassem nossas mentes e corações. Alguns de nós nasceram e se tornaram ateus, outros acreditam em um Deus antropomórfico, outros em um Deus da razão, enfim.

Assim, embora alguns condenem o misticismo e o esoterismo eles estão presentes entre nós, pois em nossa caminhada através dos séculos carreamos ao nosso espírito esse aprendizado.


A história da humanidade se assenta na tradição e não é à toa que o vencedor das batalhas procurava anular a história e cultura dos vencidos, absorvendo aquilo de melhor que tinham.

A maçonaria vai se adaptando à modernidade sem que haja a necessidade de mexer nos antigos costumes, até por que, sem eles, tornar-se-ia uma sociedade comum e deixaria de ter o esplendor da Arte Real.

É comum IIr.´. criticarem o “misticismo” e o “esoterismo”, talvez por não entenderem em profundidade o que significam. O Sublime Peregrino era místico por excelência, pois os milagres que praticava não eram explicados pelas leis naturais ou físicas. Os grandes sacerdotes egípcios eram esotéricos vez que seus ensinamentos eram ministrados a grupos fechados de alunos.



Este texto tem apenas o condão de chamar a atenção daqueles que criticam por criticar sem respeitar a Verdade do outro. 

Outro objetivo é chamar os Irmãos à meditação e à pesquisa animando-os a procurar nas brumas da existência nossas raízes e com isso as origens de cada instrumento, de cada ferramenta, de cada mobília, a fim de que possamos preservar nossa tradição e transmiti-la aos que estão entre nós e àqueles que irão nos suceder.

Que o Grande Arquiteto ilumine nossas mentes.







segunda-feira, 14 de novembro de 2016


A Conexão Januária

Deuses Janus

Autor: Sérgio Koury Jerez* Loja Nova Esperança, 132 – Oriente de São Paulo



Para uma Ordem que respeita as religiões, mas que se pretende equidistante de todas elas, as menções a São João nos rituais maçônicos poderiam parecer, ao observador desatento, controversas e incongruentes. Mas não o são! A exemplo das diversas representações que a maçonaria didaticamente adota, as referências a São João têm um caráter iminentemente simbólico, embora de origem um tanto nebulosa. No entanto, a análise histórica das culturas que serviram de berço para a civilização ocidental – onde a maçonaria especulativa foi concebida – nos dá uma série de pistas e permite compor um quadro geral, ainda que com algumas lacunas, sobre os caminhos que levaram a Ordem a estabelecer vínculos com São João. Um desses caminhos, que aqui expomos e ao qual decidimos chamar, por sua relação com o deus romano Jano, de Conexão Januária, oferece uma versão consistente para esta questão, embora não a encerre, já que acreditamos que suas raízes podem remontar a um passado muito mais distante e que ainda há muito a se estudar sobre elas.

Considerações

É razoável deduzir que a simbologia construtiva tenha começado a se desenvolver a partir do momento em que os hominídeos primitivos empregaram sua engenhosidade para criar abrigos. É possível concluir também que, sem que tenha havido qualquer notória interrupção, essa simbologia veio, através dos tempos, agregando conhecimentos, ampliando conceitos e internalizando valores de inúmeros povos, sempre preservando sua meta mais importante: proteger e dignificar a vida e contribuir para que o homem cumpra seu sagrado papel na Criação. Atravessou milênios desta forma e foi assim que passou a fazer parte dos mistérios de diversas religiões, mesmo quando escamoteada sob signos alheios. E embora nos séculos mais recentes seus fundamentos exotéricos tenham sido transferidos para o mundo profano sob a forma de ciência e sofrido as interferências próprias desse meio, seu precioso arcabouço esotérico, talvez o mais sublime legado da humanidade, tem sido preservado, apesar da intolerância e das guerras e catástrofes que permeiam a evolução do homem.

Um dos pontos críticos enfrentados por este conhecimento milenar foi a introdução, em Roma, da fé cristã como prática oficial de estado. No afã de difundir sua crença e propagar seus valores por todo o mundo romano, o cristianismo, já então estruturado como catolicismo, agiu em várias frentes:
num primeiro momento, tomou conta dos templos pagãos, transformando-os em igrejas;
transferiu os atributos altruístas das divindades existentes para seus vultos mais expressivos, de modo que os fiéis pudessem, por algum tempo, continuar executando suas práticas rituais com pouca ou nenhuma mudança, apenas aceitando um novo nome para o objeto de seu louvor. Criaram-se assim os santos;
dedicou-se a desconstruir as antigas religiões pagãs, associando seus deuses e semideuses às práticas do mal, catástrofes, violências etc.

A medida se demonstrou eficiente e foi responsável pela conversão de milhões de súditos do império que, a rigor, além de adotar os sacramentos cristãos, tiveram apenas que aceitar um novo nome para suas antigas divindades[i].

O caso particular que vamos tratar neste artigo é o do deus Jano, um dos mais antigos e importantes para os romanos.

Jano, o deus das passagens

Segundo os historiadores mais antigos, Jano[ii] foi introduzido na religião romana trazido da Etrúria, onde, por sua vez, teria sido concebido por influência de deuses mesopotâmicos ou egípcios ancestrais[iii]. Suas primeiras versões parecem caracterizá-lo como um deus do Sol que trazia a luz do amanhecer. Dizia-se que era o criador das moedas e dos barcos[iv] e, neste particular, é possível estabelecer-se um vínculo bem claro entre ele e o deus Ra egípcio[v], embora isso, por si só, não seja uma garantia de hereditariedade.

Suas imagens mais frequentes apresentam-no com duas faces olhando para lados opostos. É chamado, neste caso, de Jano Bifronte, sendo algumas vezes retratado com um dos rostos jovem e o outro idoso, indicando que olhava para o futuro e para o passado. Portava uma chave numa das mãos e um bastão na outra. Em número menor, mas da mesma forma importantes, são suas versões com quatro faces, chamadas de Jano Quadrifronte, que parecem estar ligadas às quatro estações do ano e aos quatro pontos cardeais.

Consta de sua teologia que era o “deus de todos os inícios[vi]“ e, portanto, das iniciações. Com o tempo, passou a ser responsabilizado pelo sucesso das inaugurações, admissões, aberturas, passagens e transições. Portas, pórticos, portais, portões, janelas, corredores, arcos, pontes, túneis e passadiços estavam nos domínios de Jano. Por extensão, tornou-se responsável pelos limiares, umbrais e fronteiras, e assumiu o papel de guardião dos limites ou de zelador[vii] da entrada e saída dos locais, fossem casas, lugares públicos ou cidades, tendo a manutenção da paz entre suas incumbências. Talvez o fato de um dia ter simbolizado o Sol é que lhe tenha valido o comando dos solstícios[viii],[ix], inaugurando o inverno e o verão romano. Associavam-no também ao Nascente e ao Poente e aos ventos Boreal e Antiboreal. Representava o marco limítrofe entre o dentro e o fora, o início e o fim, o passado e o futuro, caracterizando o presente absoluto. É o instante atemporal e adimensional e, neste particular, lembra muito o ponto dos geômetras. Nas liturgias romanas, seu nome era sempre invocado em primeiro lugar.

Por todas estas características, tornou-se um deus muito importante, a ponto de rivalizar-se com Júpiter. Isso lhe valeu uma homenagem por parte dos romanos, que batizaram um mês com o seu nome, chamando-o de janeiro.

Certamente foi por seu perfil iniciador ou iniciático que os artesãos romanos o adotaram como padroeiro, sendo que os pedreiros e construtores ainda com maior razão, já que sob a proteção de Jano estavam o que se costuma chamar de “obras de arte” na área da construção civil, ou seja, as pontes, viadutos, arcos etc., estruturas complexas, com a função de passagem, e que exigem muito conhecimento, engenhosidade e perícia para serem erigidas.

Os collegia fabrorum

Collegia Fabrorum era a denominação que os romanos davam às corporações de artesãos ou colégios de artífices. Consta que foram criados por Numa Pompílio, sucessor imediato de Rômulo e, portanto, segundo rei de Roma. As leis romanas estabeleciam que artífices de um mesmo ramo de atividade poderiam se associar para, juntos, praticarem seu ofício. Isso os obrigava ao respeito a regras e normas definidas pelos próprios associados.

A história mostra que havia Collegia Fabrorum dos mais variados ofícios: saboneiros, sapateiros, ourives, cunhadores de moedas etc. Embora não tenhamos encontrado menção explícita a pedreiros ou cantoneiros[x], certamente existiam Collegia que agrupavam estes tipos de profissionais, pela importância que têm em qualquer sociedade.

Por tipificar a iniciação, Jano era o patrono informal de todos os artífices, pois a aceitação do indivíduo como membro de um ofício era precedida de um processo iniciático. Este patronato, no entanto, não impedia que os Collegia fabrorum tivessem um padroeiro associado às peculiaridades do ofício que exerciam. O colégio dos alfaiates, por exemplo, cultuava Marte, o colégio dos médicos, Asclépio e Hígia, e assim vários outros.

As corporações de artesãos foram de fundamental importância para o desenvolvimento e expansão do Império Romano. O fomento à sua criação acabou proporcionando o aprimoramento dos ofícios e a criação de novos métodos para realização de suas atividades. Os membros mais experientes transmitiam seu conhecimento aos demais, gerando uma corrente altruísta que induzia o aperfeiçoamento individual e a formação de quadros cada vez mais bem preparados.

Porém, com a queda do Império Romano do Ocidente e o caos que a sucedeu, a figura formal dos Collegia fabrorum parece ter se dissipado, embora o conhecimento sobre a maioria dos ofícios pareça ter avançado pela Idade Média e chegado ao Renascimento senão incólume, pelo menos forte o suficiente para produzir bons frutos através das guildas medievais. E, ao que tudo indica, a influência de Jano continuou a se fazer sentir.

As guildas europeias

Há uma grande discussão entre os estudiosos sobre se e como o conhecimento das corporações romanas de artesãos influenciaram as guildas medievais. Não obstante, e a despeito de tudo o que se escreveu até hoje sobre o assunto, uma pergunta talvez traga em si mesma a resposta a esta questão: de onde mais, a não ser dos antigos, as guildas extrairiam a base das artes que praticavam?

Não se pode imaginar que a queda de Roma tenha apagado por completo todo o saber que a humanidade havia acumulado até então. Primeiro, porque a cultura por ela emanada continuou evoluindo, vigorosa, no Império Bizantino[xi]. Depois, porque houve partes do império que foram menos afetadas pelas invasões das hordas bárbaras e, portanto, puderam manter, com razoável fidelidade, as práticas romanas. De toda forma, mesmo que tenha sido apenas transmitido de boca a ouvido, de mestres para discípulos, o fato é que este conhecimento subsistiu. Se nas guildas – às quais o clero por vezes chamava de conjurações – ou em qualquer outro tipo de associação, é irrelevante. O uso do nome guilda neste artigo é, portanto, apenas uma identificação genérica para as diversas formas de associação sob a égide das quais se reuniam, na Idade Média, os praticantes de um mesmo ofício.

Na área da construção em pedra, que é aquela que nos interessa mais de perto, as guildas erigiram, durante o período medieval, mosteiros, fortificações, cidadelas, moradias, templos e castelos por toda a Europa. Se, com raras exceções, até o final do primeiro milênio não apresentavam a sofisticação, a grandiosidade e a perfeição das mais importantes obras romanas, é porque não havia concentração suficiente de riquezas que permitisse gastos com opulência e refinamento arquitetônico. Só mais tarde, com a unificação de feudos, expansão das rotas comerciais e aumento do poder da Igreja é que as obras mais elaboradas e equiparáveis às romanas tornar-se-iam viáveis novamente.

As guildas de pedreiros eram formadas para fazer frente à demanda por mão-de-obra qualificada para realização das construções, onde quer que fossem necessárias. A exemplo dos colégios romanos de artífices, tinham, em geral, regras de conduta rígidas e mantinham fundos de amparo e auxílio funeral para seus membros. Tudo indica que os novos integrantes eram admitidos através de iniciação e que guardavam para si os segredos e mistérios da profissão, que eram transmitidos gradualmente aos demais segundo sua proficiência e habilidade, ao longo de períodos variáveis. Pelo menos em parte da Europa, na noite de 26 para 27 de dezembro, dia de S. João Evangelista[xii], faziam entre si juramentos de sigilo e de união. Promoviam, então, imensos banquetes onde comiam e bebiam até se fartar.

Ainda que toda a literatura analisada não apresente evidências materiais de uma possível transmissão de conhecimentos[xiii] – e valores – das corporações romanas de artífices para as guildas, é muito provável que estas sejam as sucessoras naturais daquelas, com todas as implicações que possam advir disso. Afinal, é difícil imaginar que as guildas de pedreiros possam ter herdado o uso de ferramentas e as técnicas construtivas utilizadas pelos romanos, sem que, junto com elas, lhes tenham sido transferidos também os saberes, costumes, tradições, ritos, lendas e mitos que envolviam o ofício de construir.

Desde o ano de 590 – portanto, pouco mais de 100 anos após a queda do Império Romano, há documentos que comprovam a existência de guildas de construtores na Itália. A dos mestres comacinos, por exemplo, possivelmente originária da Lombardia, primava pela mútua proteção e desenvolvimento de seus integrantes. Outro exemplo de que os conhecimentos romanos permaneceram vivos nos é dado pelo bispo Wilfrido de York que, em 598, associou-se ao abade de Wearmouth para mandar enviados à França e Itália, pedindo que os pedreiros retornassem e retomassem as construções “de acordo com a maneira romana”.

A indicação da existência de pedreiros-livres aparece pela primeira vez em manuscritos dos séculos XII e XIII, quando são chamados de Sculptores lapidum liberorum[xiv] ou Latonii vocati fremacconi[xv].

É neste contexto que surgem as lojas de São João.

As Lojas de São João

Coerente com a implantação do cristianismo no Império Romano, suspeita-se que a escolha das datas de 24 de junho e 27 de dezembro para as festas em homenagem a S. João Batista e S. João Evangelista, respectivamente, deva-se ao fato de que elas são próximas dos solstícios, cujo patrono em Roma, como já foi visto, era Jano. A razão para isso, embora possa parecer banal, deve ter sido a pronúncia em latim de ambos os nomes, Jano e João, que é muito semelhante. Tal identidade fonética certamente colaborava para a transferência das devoções dos fiéis de Jano para os santos católicos. No caso de São João Batista, em particular, esta transferência deve ter sido até mais fácil, pois existe um vínculo simbólico entre os dois, já que João Batista iniciou Jesus através do batismo e que Jano era o patrono das iniciações[xvi].

De qualquer forma, é possível identificar três motivos que teriam levado os trabalhadores da construção a adotar um ou outro João, ou ambos, como padroeiros:
1) O vínculo com Jano e os solstícios;
2) A associação do Batista com a iniciação e do Evangelista com o amor fraternal e a solidariedade[xvii];
3) A escolha do patrono de uma cidade como protetor de uma guilda[xviii], o que era muito frequente;

Há muitas provas de que os construtores medievais tinham apreço pelas datas solsticiais.[xix] Se isso, de fato, era decorrente da adoção de Jano como seu padroeiro, é difícil saber, porque numa época em que a Igreja era fundamentalista e implacável, não seria razoável externar o culto a um deus pagão. Desse modo, mesmo que a reverência ao deus romano tenha prosseguido após a queda do império, deve ter permanecido cifrada nos mistérios do ofício. E assim se encontraria até hoje, velada pelos Sãos Joões.

A associação de João Batista com as iniciações e a importância destas para os ofícios é óbvia. Quanto à importância de João Evangelista – considerado o apóstolo do amor – para os construtores, é preciso ter em conta a relevância da solidariedade e da fraternidade entre os integrantes das guildas de pedreiros. Aqueles artífices, não raro, exerciam o ofício em lugares ermos e distantes de suas cidades, e, a exemplo dos colégios romanos, a ajuda mútua e o auxílio às famílias em caso de acidente ou falecimento eram fundamentos rigidamente obedecidos por todos e tratados como pontos de honra.

A guilda medieval de pedreiros e carpinteiros vinculada à catedral de Colônia, na Alemanha, adotava João Batista como padroeiro. Já os obreiros da Loja de Edimburgo[xx], na Escócia, trabalhavam, no século XV, sob a proteção de João Evangelista, como era comum para boa parte das guildas de construtores escocesas.

Desde a época das Cruzadas, João Batista era reverenciado como padroeiro da Ordem de São João de Jerusalém, de grande destaque na realização de obras arquitetônicas. Esta ordem, também chamada de Ordem dos Hospitalários, foi a primeira instituição cristã de caridade especializada. Estabelecida na Palestina por volta de 1080 – portanto pouco antes da Primeira Cruzada – tinha por objetivo o apoio e a assistência médica aos peregrinos cristãos que se dirigiam à Terra Santa. Após a Cruzada, o fluxo de romeiros para a região aumentou enormemente e a Ordem de São João, administrada por leigos, enriqueceu, expandindo-se pelas rotas de peregrinação, onde construiu inúmeras fortalezas. Uma das remanescentes é a de Krak dos Cavaleiros, perto de Homs, na Síria, considerada Patrimônio Mundial pela UNESCO.

A adoção de São João como patrono daquela ordem decorreu do fato de que o seu primeiro abrigo foi construído próximo à Igreja de São João Batista, na Cidade Santa, onde os hospitalários faziam suas orações. Embora neste caso pareça não haver qualquer relação direta com o deus Jano, a hipótese de que essa relação exista, ainda que de difícil comprovação, não pode ser sumariamente descartada, pois a cultura do Oriente Médio está impregnada de referências solsticiais.

No século XVIII, quando a nossa Ordem ainda tinha muitas referências cristãs, São João Batista e São João Evangelista eram tidos como santos patronos da Maçonaria inglesa. Dos dois, São João Batista era considerado o principal. Seu simbolismo é tão importante que a primeira Grande Loja, formada em 1717, escolheu seu dia como data de fundação. Por outro lado, antes mesmo da formação da Grande Loja Unida da Inglaterra, em 1813, era costume as Lojas instalarem os Veneráveis a cada seis meses, e o faziam em 24 de junho (dia de São João Batista) e 27 de dezembro (dia de São João Evangelista). A antiga Grande Loja da Inglaterra, em particular, sempre realizava suas instalações no dia 27 de dezembro.

De lá para cá, as referências maçônicas aos dois Sãos Joões têm sido mantidas. Muitas Lojas de vários países se assumem dedicadas a ambos os santos. No Rito Sueco, os três primeiros graus são conhecidos como graus de São João. No começo do século XIX, algumas Lojas francesas abriam seus trabalhos em nome de São João da Escócia, mas, a despeito do que possa parecer à primeira vista, não há um santos escocês de nome João, de onde presume-se que esta tenha sido uma maneira indireta de reverenciar o padroeiro das guildas escocesas, S. João Evangelista. O Rito de York Antigo, mais ou menos na mesma época, dedicava a Loja aos dois Sãos Joões. No R.E.A.A., até hoje, todos se dizem oriundos de uma Loja de S. João, em honra do qual os trabalhos são abertos e fechados.

Conclusão

Ainda haveria muito a se falar de Jano, colégios de artesãos, guildas e Lojas de São João. Existe uma vasta literatura a respeito, parte da qual é apresentada na bibliografia a seguir. Não obstante, e como sempre acontece com as pesquisas sobre simbologia maçônica, alguns vazios permanecem, dada a carência de fontes quando nos aprofundamos no passado. De todo modo, esperamos que este trabalho motive outros Irmãos a preenchê-los com seus estudos.

Não há dúvida de que, desde os primórdios, o homem se preocupa em entender a natureza. Poder antever as alterações climáticas provocadas pela mudança das estações e, com isso, preparar-se para o plantio, colheitas e caça, e proteger-se das intempéries, era uma questão de sobrevivência e garantia da manutenção da prole. Passaram-se dezenas de milhares de anos até que ele pudesse identificar os solstícios, e foi buscando perpetuar este conhecimento que passou a registrá-lo em pedra. Inúmeros templos e construções trazem em si esta sabedoria primordial, que só chegou aos dias atuais porque encontrou pedreiros dispostos a traduzi-la pela ação de seus maços e cinzéis. No Templo de Salomão, eram representados pelas colunas J e B, e, no império romano, através das portas solsticiais, estavam associados a Jano, de onde vieram até chegar aos dias atuais personificados pelos dois São João.

Esta tese, evidentemente, está aberta a contestações. Ainda assim, é preciso considerar que na tradição cristã não existe qualquer ligação desses santos com os ofícios construtivos, nem há indicação de que seu patronato seja fruto de imposição ou preferência religiosa. Ou seja, ainda que a maçonaria não fosse equidistante das religiões, do ponto de vista da hagiologia[xxi]cristã – e exceto pela fraternidade apregoada pelo Evangelista – não haveria porque ter qualquer dos São João como patrono. Quanto à hipótese de que a adoção dos santos pela maçonaria seja uma mera homenagem ao padroeiro de alguma cidade medieval, carece da ancestralidade característica dos símbolos maçônicos e, por isso, mesmo que não se possa refutá-la, é pouco provável que seja verdadeira.

Os hermetistas associam o solstício de verão à “porta dos homens” e o de inverno à “porta dos deuses”[xxii], que são as portas zodiacais de Câncer e Capricórnio. São os momentos a partir dos quais há, respectivamente, diminuição e aumento da intensidade da luz solar, reproduzidos simbolicamente na vida do maçom da iniciação em diante, conduzindo-o das trevas à luz. Diz a antiga filosofia que a alma humana descia dos céus e passava pela Porta dos Homens para encarnar na terra. Na morte, após deixar o corpo, ela passava pela Porta dos Deuses e retornava aos céus. E era Jano quem detinha a chave que abriria estas portas.

Ao olharem para os solstícios, as duas faces de Jano estão, portanto, zelando para que o ciclo da existência se cumpra e permitindo, com isso, que o homem se torne partícipe da criação. Se uma das faces pode ser associada a São João Batista e a outra a São João Evangelista, sob o aspecto estritamente simbólico isso talvez não seja tão relevante. Os símbolos são importantes pelo que representam, não pelo nome que se dê a eles. E os solstícios continuarão a existir independentemente de como os chamemos.

O passado é só uma lembrança e o futuro ainda não chegou. Jano, transfigurado nos Sãos Joões, continuará a nos remeter ao aqui e agora, que é o tênue e fugaz momento que estabelece a ponte ou a passagem entre o que já foi vivido e o que ainda resta viver. Ou, se preferirmos, o olhar sobre o que já foi plantado e colhido e a incerteza se haverá um novo plantio e uma nova colheita.

Ele já nos abriu uma porta. Em vão esperaremos que tenha perdido a chave da outra…


Notas

[i] Só num momento seguinte, já bem mais tarde, uma nova iconografia seria criada para proporcionar aos devotos uma representação “palpável”, e as estátuas das divindades romanas foram substituídas por imagens de santos para os quais eles podiam canalizar suas orações e súplicas.

[ii] Do latim Dianus (com a mesma raiz de dies – dia) ou Ianusou Janus.

[iii] Jano pode ser um eco longínquo do acádio Usmu ou do egípcio Nehebkau.

[iv] As moedas romanas mais antigas trazem de um lado a efígie de Jano e, do outro, a proa de um barco. Ao tirarem cara ou coroa os romanos diziam capite aut navim (cabeça ou barco, em latim)

[v] Uma moeda é, em última análise, uma representação do círculo solar, que, na mitologia egípcia, era identificado com Ra, cuja barca fazia o Sol se mover no firmamento.

[vi] deus omnium initiorum, em latim.

[vii] Em vários países adota-se a palavra janitor para identificar os responsáveis por zelar pelos edifícios ou propriedades em geral e que, por isso, detêm suas chaves.

[viii] Do latim sol sistere, que significa parada do sol ou sol estático.

[ix] No templo de Salomão, as colunas J e B indicariam a posição do sol nos dois solstícios.

[x] Pelo menos nos documentos consultados pelo autor.

[xi] Também chamado de Império Romano do Oriente.

[xii] Data onde também ocorria a festa do deus nórdico Jul.

[xiii] Ao contrário, alguns autores refutam esta hipótese.

[xiv] Escultores de pedras emancipados, em tradução livre do latim.

[xv] Latonni (Cultuadores de Apolo ou Diana) chamados de pedreiros-livres, em tradução livre do latim.

[xvi] Do ponto de vista de iconografia, no entanto, dois dos principais símbolos de Jano, que eram a chave e o barco, passaram, curiosamente, a ser associados a S. Pedro, que, como o deus romano, é o patrono católico dos construtores de pontes.

[xvii] Entre os séculos XV e XVIII, em Paris, existiu uma guilda de impressores e livreiros, chamada de Guilda de São João Evangelista, dedicada quase que exclusivamente à ajuda mútua e benemerência.

[xviii] Florença, na Itália, considerada o berço do Renascimento e, portanto, mantenedora da mais importante guilda de construtores da Europa Ocidental na época, tinha São João Batista como padroeiro desde o começo do segundo milênio.

[xix] Um exemplo é a catedral de Chartres, na França, construída no século XII. No solstício de verão, os raios de Sol atravessam o vitral de São Apolinário e projetam um círculo de luz sobre uma estrutura de metal no piso da igreja.

[xx] Nos manuscritos Edinburgh Register House, de 1696, eChetwode Crawley, de 1717, que são reconhecidos como exemplares dos Antigos Deveres, os aprendizes diziam jurar por Deus e São João, pelo Esquadro e Compasso…

[xxi] Estudo os santos.

[xxii] Diz a antiga filosofia que a alma humana descia dos céus e passava pela Porta dos Homens para encarnar na terra. Na morte, após deixar o corpo, ela passava pela Porta dos Deuses e retornava aos céus.



* Contatos pelo email jerez_sergio@yahoo.com



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ENSAIOS SOBRE AS ORIGENS DOS RITUAIS E GRAUS SIMBÓLICOS


Autor: André DORE 33° – setembro 1979

Tradução – S.K.Jerez

As ignorâncias e as incertezas são os principais obstáculos enfrentados pelos pesquisadores que analisam a história da Maçonaria. Daí a singular complacência a que se permitem os assim chamados historiadores, para com uma verdade obstinada que se esconde atrás de uma sucessão de lendas operativas, templárias, salomônicas, rosacruzes, herméticas, etc., religiosamente repetidas por dois séculos e meio. Pois, apesar de alguns fatos específicos, tudo permanece obscuro quanto à origem da Ordem Maçônica, o que fez com que se levassem adiante muitas colocações do tipo “Parece que…”

O que é chamado de Maçonaria especulativa se organiza em Londres, em 1717. Diz-se que é filha da Maçonaria Operativa. Na realidade, ela sucede uma Maçonaria “aceita”, criada como tal no final do século XVI para admissão, no seio das confrarias de pedreiros, de pessoas estranhas ao meio e que serão chamados, na segunda metade daquele século, de “Maçons Aceitos”. É certo que as Lojas[1] – já que havia Lojas na corporação – de bom grado adotavam um protetor, de preferência um nobre ou religioso, que se tornava responsável pelo trabalho administrativo que o canteiro de obra exigia, pois os trabalhadores eram quase todos analfabetos. Às vezes, este protetor era um capelão, e, mais tarde, fornecedores que gravitavam em torno do empreendimento. Este processo nasceu na Escócia, mas embora naquele país os pedreiros aceitos fossem apenas uma pequena minoria durante o século XVII, na Inglaterra aconteceu o contrário, criando-se Lojas estritamente “aceitas” e que, desde os primeiros anos, já não tinham mais profissionais do ofício. Parece que a mais antiga remonta a 1600, mas, a partir do segundo quarto daquele século, a sua existência é comprovada por documentos indiscutíveis. Elas coexistiram com as semi-operativas, “semi-aceitas” e viram, pouco a pouco, desaparecerem os profissionais da força de trabalho destas, devido à diminuição dos grandes canteiros de construções religiosas e feudais, que foram se transformando, com algumas exceções, em lojas especulativas entre 1700 e 1730. Então, surge a pergunta: que justificativa dar ao fato de ter estranhos ao ofício integrados aos agrupamentos profissionais, se não existiam lojas, ou se não houvesse ofício a apoiar?

Os documentos não respondem, mas seu conteúdo, confrontado com o clima intelectual da época em que estão inseridos, provavelmente sugere as explicações exatas. Sobre isso há quatro tipos de documentos, rigorosamente autenticados:

Primeiro, os manuscritos – cerca de 150 – relativos às condições e as regras que regiam a vida das confrarias de pedreiros, ditos operativos, tendo este termo chegado tardiamente no vocabulário maçônico, no final do século 18. Eles se espalharam a partir do século XV até o início do século XVIII, e é a partir deles que a Grande Loja Unida da Inglaterra fará emitir os famosos e sacrossantos “Landmarks”.

Em seguida, as Atas de três Grandes Lojas: a Loja Mãe de Kilwining, que datam de 1598; a Grande Loja de Edimburgo, de 1696 até os dias atuais, sem interrupção; a Grande Loja da Inglaterra, de 1723 aos dias de hoje; além dos muitos arquivos de Lojas do início do século XVIII.

Depois, as obras conhecidas como “revelações[2]“, que pretendiam revelar os segredos maçônicos. Muitas vezes panfletárias, demandam uma crítica severa do seu conteúdo.

Finalmente, toda a série de rituais, todos os manuscritos, que estão na casa das centenas apenas para período que vai da década de 1750, quando eles surgem, até 1800, e cuja exegese revela, com demasiada frequência, aberrações litúrgicas.

Jamais descobrimos os profundos motivos que fizeram com que, no final de junho 1717, alguns membros de quatro Lojas em Londres formassem a Grande Loja de Londres, que logo viria a se transformar na Grande Loja da Inglaterra. Não sabemos nada sobre a origem dessas oficinas, salvo a sua existência, uma em 1696 e as outras após 1700, e que eram apenas “aceitas”, como mostram as Atas da Grande Loja da Inglaterra que reproduzem seus quadros em 1723. Três delas eram compostas apenas de artesãos e comerciantes, nenhum dos quais tinha direito, após o seu nome, à referência “Esquire[3]“, que indicaria um nível social acima do comum. A quarta Loja, ao contrário, incluia dois duques, três condes, um marquês, três lords, um barão, quatro cavaleiros militares de altas patentes, ministros religiosos, vinte e quatro ” Esquires”, além de George Payne, Desaguliers e Anderson, que não são citados em nenhum lugar antes desta data. Destes, muitos estudiosos, membros da científica Royal Society, onde Newton ainda tinha assento. Quem pode dizer por que esses personagens nobres se associaram com “gente miúda” – sem que esse termo tenha nada de pejorativo – e por que, ao fazê-lo, tomaram emprestado o modesto caminho dos entalhadores de pedra? E por que 1717?

Talvez tenha sido para evitar a confusão que ameaçava se estabelecer em razão do número crescente de Lojas espalhadas especialmente na Inglaterra.

Ou para “ser o centro de união” como iria escrever alguns anos mais tarde o pastor Anderson, sob a direção de Payne e Desaguliers, o que atendia a uma necessidade latente de sociabilidade, depois das tempestades que abalaram o país durante as décadas imediatamente precedentes[4].

Ou como resposta ao desejo de dar uma doutrina para esses grupos praticamente isolados, mas que alegavam a mesma identidade sob a cobertura de um segredo ilusório e inexistente, e que se reuniram para festejar, participando assim do modismo geral impressionante conhecido na época como sociedades lúdicas e baquistas.

Ou, então, para descobrir este segredo que especificava algo muito vago do passado e que era capaz de reconectar os espíritos às certezas tranquilizadoras. Como aconteceu com os estudiosos membros da Loja “Au Gobelet et Au Raisin“, já sujeitos a algum tipo de disciplina científica que, necessariamente, os levava a centralizar, organizar, dirigir. Mas o enigma permanece intocado.

De qualquer forma, a Grande Loja da Inglaterra se espalhou muito rapidamente por todo o Reino, fosse por criar novas Lojas, fosse por reunir as que já existiam e estavam dispersas. Enquanto isso, ela sufocou a Grande Loja de York, operativa e moribunda, e depois a exportou.

Parece que a França foi o primeiro país a se beneficiar da novidade. Primeiro por ação dos stuardistas, escoceses no exílio. De acordo com as memórias de De Lalande, por muito tempo considerado suspeito, mas reabilitado por Pierre Chevallier como resultado de uma pesquisa recente, quatro maçons ingleses conhecidos e claramente identificados, defensores de Charles-Edward Stuart, constituíram uma Loja em Paris, em 1725 ou 1726, sob o nome de Saint- Thomas, em memória de Thomas Beckett. Charles Radclyffe, futuro conde de Derwentwater, em 1731, e que mais tarde se tornou Grão-Mestre das lojas francesas, foi, provavelmente, Mestre de Cerimônia e Venerável da Loja. Jamais soubemos onde foi recebido maçom, ou mesmo se ele o foi. Supõe-se que Ramsay teria dado a ele tal condição, embora este último tenha sido admitido em março de 1731 na Loja Horn, de Londres, e Radclyffe tenha nascido em 1693 e deixado a Inglaterra em 1716. Quanto a Maclean, também Grão Mestre após o Duque de Wharton (1728-1731) – e antes de Derwentwater, que assumiu o posto em 1736 – nasceu em Calais, viveu em Edimburgo até 1721, depois em Paris (1721-1726), voltou a viver na Escócia entre 1726 e 1728, e retornou à França, onde serviu no exército francês. Não se sabe onde foi recebido maçom.

O estabelecimento da Maçonaria de deu lentamente durante os anos seguintes à criação da Loja Saint-Thomas. Isso ainda é muito confuso. Se nos ativermos apenas aos documentos autênticos, duas novas lojas nasceram, uma em 1729 – a Arts Sainte-Marguerite – e outra em 1730, embora, de acordo com o registro da Grande Loja da Inglaterra de 17 de março de 1731, tenha sido constituída regularmente em 03 de abril de 1732, sob o número 90 e a denominação de “The King’s Head” Butcher Row, at Paris, que poderíamos traduzir como ‘”Sob a Ensígnia do Rei” Rue de la Boucherie’. Vemos nela a Loja Saint-Thomas em Louis d’Argent, ou Saint-Thomas no 2, porque veio de uma divisão da primeira Loja com esse nome, ou ainda “Au Louis d’Argent”, devido ao fato que os nomes King’s Head[5] e Louis d’Argent[6] devem ter tido origem na moeda de prata usada na época, que trazia estampada a imagem do rei da França. Em seguida vem a Loja do duque de Richmond, sabendo-se que ela estava em funcionamento em 1734, fosse em Paris ou em Aubigny-sur-Nère, na antiga província de Berry, na casa de Louise Kéroualle, Duquesa de Portsmouth, onde recebeu Desaguliers, Montesquieu e outros. Depois vem a Loja de Bussy-Aumont, de 1735, e a Loja Constos-Villeroy, cujo nome vem de dois de seus veneráveis, de 1736.

Quanto às Lojas das províncias, as encontramos em Bordeaux (1732), em Valenciennes (1733), em Metz (1735) etc. De acordo com a Tabela de Lojas do Reino de França, de 06 de novembro de 1744, havia, desde 1726, 20 Lojas em Paris, 19 nas províncias e, surpreendentemente, 5 Lojas militares, ou seja, 44 no total. E é a partir desse momento que o que viria a se tornar a Ordem Maçônica na França ganhou ímpeto.

Não podemos dizer quando foi formada a primeira Grande Loja da França. O mais antigo documento conhecido, datado de 1705, não a menciona. Seu título: Règles et devoirs de l’Ordre des Francs-Maçons du Royaume de France[7]” e nele MacLean é chamado de “atual Grão-Mestre da Mui Honrada Fraternidade dos Franco-Maçons do Reino de França”, e seu antecessor, o Duque de Wharton, de “Grão-Mestre das Lojas do Reino de França”. E também há o texto que autoriza o Barão Scheffer a formar Lojas na Suécia, que dizia: “… eles serão subordinados à Grande Loja da França”, indicando que a congregação “em Grande Loja ” era nada menos que a reunião dos veneráveis oficiais e vigilantes de algumas ou de todas as Lojas de Paris sob a presidência do Grão-Mestre. Mas nem os regulamentos de 1743, nem as constituições definidas na Loja de Lodève, em 1744, nem os estatutos de 1745 preparados para a Loja Saint-Jean de Jérusalem de Paris, nem mesmo os de 1755, mencionam a Grande Loja da França como autoridade dirigente suprema. As Lojas, em sua quase totalidade, especialmente as da província, colocavam-se sob a obediência do Grão-Mestre do qual buscavam proteção e, especialmente, garantia de regularidade, critério fundamental na época. Esta tendência se generalizou a partir de 1743, após o Conde de Clermont ter assumido o Grão Mestrado. Foi por seu incentivo que foi estabelecido “… no segundo dia da primeira semana do terceiro mês do ano da Luz de 5747 e 1747 da era vulgar” o documento que iria consagrar a hegemonia de um órgão central de todas as Lojas do Reino da França, que parece ter escapado à sagacidade dos pesquisadores.

“Regulamentos da Mui Respeitável Grande Loja da França, estabelecidos por todas as Lojas regulares do Reino, sob os auspícios do Mui Sereníssimo Irmão Louis de Bourbon, conde de Clermont, Grão-Mestre da Ordem na França”.

Este é um manuscrito de 15 páginas, de números 36 a 50, com 121 itens numerados de 1 a 121, que termina com as seguintes informações:

“Ato deliberado e aprovado (sic) (na) reunião Loja T.R da França regularmente no segundo dia.

Cópia compilada (sic) por nosso secretário-geral do documento original, assinado por procuração, Labadie.

Extraído da cópia enviada para o Loja de la Douce Egalité do Oriente d’Avignon”.

Nada se sabe da Loja de La Douce Egalité, cuja existência, no entanto, é confirmada por outros dois documentos. Labadie (ou Labbady ou Labady) mestre da Loja l’Ecossaise de Salomon, personagem conhecido e agitado, foi substituído por providência do secretário-geral da Grande Loja da França, Zambault, em 1765. Não podemos, com essas simples informações, definir uma data específica para esta cópia. O texto de 1747 é importante na medida em que determina pela primeira vez um procedimento para a identificação de todas as Lojas do Reino e seus membros, dando-lhes “… constituições e estatutos gerais para estabelecer a uniformidade do Trabalho” encarregando-se ela, Grande Loja, de repassar a Tabela Geral da Obediência a seus componentes. Além disso, uma série de medidas fixando minuciosamente o funcionamento das Lojas, estabelecendo as relações que poderiam ter entre si e com a Grande Loja, as condições para a sua regularidade e a de seus obreiros. Através dos artigos um embrião de Secretaria Administrativa, com seis inspetores, que circulou por toda a França, e foram reembolsados de suas despesas o tesoureiro, o secretário etc.

O texto de 1747 não tem nada em comum em sua redação com o das versões de 1755 e 1760, nem mesmo em suas principais disposições, e estes dois últimos estatutos parecem ignorar que havia uma Grande Loja da França. Apenas em 19 de maio de 1763 foi criado o primeiro selo, ao mesmo tempo que surgem os novos estatutos que institucionalizarão a Grande Loja da França. Ainda assim, até a criação do seu sucessor, o Grande Oriente – que irá se instalar em 12 de agosto de 1774, alugando as instalações do Noviciat des Jésuites – ela não possuirá secretariado permanente ou qualquer lugar para seus arquivos. As reuniões se davam na casa dos membros que se dispusessem a recebê-las.

Embora vinda da Inglaterra, em nenhum momento a maçonaria francesa teve uma Grande Loja inglesa da França, isto é, uma Grande Loja Provincial da França sob controle da Grande Loja da Inglaterra, embora que esta última não tenha deixado de reclamá-la. Outra constatação, e um tanto estranha: em nenhum lugar na sucessão de regras e regulamentos, encontramos qualquer seção que institui a Ordem Maçônica, dando-lhe uma meta ou um propósito. Os textos são destinados apenas a determinar as condições de regularidade administrativa das Lojas e seus membros. Nem os “statuts de l’Ordre Royal de la maçonnerie en France“, primeiro ato legislativo do Grande Oriente da França, em 1773, nem os estatutos de 1777 e 1787 da segunda Grande Loja da França – chamada de Clermont, dissidência do Grande Oriente ocorrida após a supressão, por esta última, da inamovibilidade dos Veneráveis de Loja – ou os textos a partir de 1806, mostram uma vocação para a Maçonaria. Talvez se satisfizessem com o que dizia o Livro das Constituições de Anderson e, assim, não parecem estar muito preocupados. É por isso que, em 1776, uma circular do Grande Oriente proclamava: “Nosso objetivo consiste em estabelecer, entre os nossos adeptos, uma comunicação ativa do sentimento de fraternidade e ajuda de todos os tipos, em fazer reviverem as virtudes sociais, em recordar as práticas, em tornar, enfim, nossa associação útil para cada um dos indivíduos que a compõem, e útil para a própria humanidade.” Portanto, só em 1826 um texto legal especifica formalmente o propósito da Ordem: “Da Constituição, art. Primeiro: A Ordem dos Maçons tem por objetivo o exercício da caridade, o estudo da moral universal, das Ciências e das Artes, e a prática de todas as virtudes.”

Será que isto significa que durante um século as lojas trabalharam no vácuo? As atas que dão conta da atividade das oficinas e da obediência justificam essa dúvida. A solidariedade para com os irmãos necessitados era real os atos de caridade e se estenderam rapidamente em favor dos pobres e desfavorecidos. Com a evolução dos rituais, a recitação de catecismos introduzirá a afirmação de regras morais que maçons se obrigam, pelo menos teoricamente, a observar. No entanto, parece que não havia obras no sentido maçônico moderno do termo. Isolados, e tardiamente, alguns apartes de irmãos oradores mostravam um desejo de reflexão, sem que obtivessem resposta. Ao contrário, tudo mostra que a vida secular não perdeu nenhum dos seus atributos.

E então surge a questão da natureza da mensagem que a Maçonaria trazia aos homens e que foi capaz de atrai-los, independentemente da sua condição, para que se tornassem maçons. O que nos leva ao passado, muito longe no tempo.

As Confrarias de ofício existentes desde a alta Idade Média, encarregavam-se de organizar a profissão, de proteger seus membros e ajudá-los em caso de necessidade. Esses construtores deixaram muitos vestígios, alguns dos quais datam do século XI. Desde meados do século XIV, até o início do XVIII, é possível acompanhar a sua evolução sem interrupções significativas. Nenhuma justificativa permite dizer, de acordo com uma lenda que ainda prevalece, que eles descendem dos Colégios Romanos, ou, mais tarde, dos Comacini, filiação refutada até mesmo pelo homem que a sugeriu. Trata-se aqui apenas das associações britânicas, relacionadas, ainda que superficialmente, à maçonaria especulativa. Não há nenhum vestígio na França de algo que se assemelhe ao que aconteceu do outro lado do Canal da Mancha. A Irmandade de entalhadores de pedra e pedreiros de Estrasburgo, chamada de Steinmezten, não deixou de atrair a atenção. Ela agrupou os trabalhadores do território alemão ocidental em 1459 e deixou a chamada Carta de Ratisbonne, que regulava as relações de membros da Associação no exercício da sua profissão, tanto entre si quanto como com seus empregadores. Uma alteração feita em 1628 permitia “aos homens piedosos” integrá-las. Não sabemos nada mais sobre a atividade interna da Associação.

Os canteiros de obras, quer religiosas quer civis, foram muito importantes e tinham um número considerável de trabalhadores. Daí a necessidade de uma busca pela própria natureza das coisas. Eram quatro categorias de trabalhadores – diaristas, aprendizes, aprendizes “aceitos”, companheiros – todos sob a direção de um empreiteiro, o que significava um ou dois vigilantes para ajudar. Este sistema não ficou solidamente estabelecido até o final do século XVI. Cada canteiro instalava uma “Loja[8]“, que servia também de oficina (embora as pedras fossem esculpidas no local de sua extração), refeitório ou sala de estar, onde discutiam os acontecimentos do dia e todo mundo recebia as instruções relativas à sua tarefa. A Loja e era uma unidade com as suas próprias regras, estabelecidas em conjunto entre o gerente de projeto, a assembleia ou alguém que tivesse sido colocado no comando. Muitas vezes ela mudava de um canteiro para outro, embora tivesse a obrigação de concluir o que havia sido empreitado. A falta de dinheiro frequentemente interrompia os trabalhos, levando ao deslocamento do canteiro e à dispersão parcial dos membros da Loja. A vida coletiva que isso implicava, a ajuda mútua que os trabalhadores mantinham, a responsabilidade do mais hábil ensinar ao menos hábil, despertava sentimentos de solidariedade que eram rapidamente transformados em verdadeira fraternidade. Os costumes instaurados tinham força de lei e eram uniformes, embora diferentes em detalhes. Eles regulamentavam o uso e posse de ferramentas, as condições de trabalho, os benefícios em espécie concedidos além do salário. Os diaristas, recrutados no local e quase sempre por requisição, permaneciam fora da Loja. Os aprendizes, sob contrato, submetiam-se a um estágio probatório ao final do qual ou eram rejeitados – e voltavam a ser diaristas – ou admitidos, sempre como aprendizes, mas, ainda assim, deviam pagar sua admissão, que era concretizada por uma recepção. Esta, muito simples, era realizada a portas fechadas, pelo Mestre da Loja, diante dos companheiros e aprendizes antes admitidos. A admissão incluía a primeira leitura das regras que regiam a profissão, o juramento que obrigava o aprendiz “registrado” como “aceito” ao mais absoluto segredo, a comunicação de uma “palavra”, a “palavra do pedreiro”, sussurrada em seguida junto com os presentes, e se apresentava cada um dos sinais de reconhecimento, sendo concluída com um banquete. Textos sugerem que, antes ou durante a refeição era feito uma espécie de “trote” ou intimidação com o recém-admitido. Isso acontecerá com os operativos até por volta de 1710 e critica-se Desaguliers por tê-lo suprimido por julgá-lo incompatível com a dignidade das pessoas “aceitas”.

O manuscrito no 1 na Grande Loja da Inglaterra, datado de 1583, dá o procedimento do juramento: “… um dos antigos toma o Livro e aquele ou aqueles que prestam o juramento[9] colocam suas mãos sobre ele, e os preceitos são lidos.” O livro em questão não é especificado. O termo é ambíguo e há dúvidas quanto à sua identidade, Bíblia ou Regulamento da profissão, mas mais provavelmente este último. A primeira referência inequívoca à presença da Bíblia ocorre um século mais tarde, em 1685, no manuscrito Colne no 1. Em nenhum lugar, nem nas atas mais antigas da Grande Loja de Edimburgo, que remonta a 1598, nem nas da Loja Chapel Saint Mary, de 1599, nem nas da Loja-Mãe Kilwining no 0, de 1642, consta que havia uma Bíblia no material da Loja. Isto é confirmado pelos textos das lojas mais recentes que permaneceram operativas, como a Aldwick (1701), a Swalwell (1725), etc. A primeira menção existente da compra de uma Bíblia, acompanhada por dois livros de canções, está contida em uma ordem emitida em 1766 pela Loja-Mãe de Kilwining, embora a proposta para aquisição já houvesse sido feita em 1726, 1744, 1749, mantendo-se sem resposta. E embora Prichard a mencione em sua revelação de 1730, apenas na década de 1750-1760 seu uso se tornará generalizado. Na França, ela era muitas vezes substituída pelos Evangelhos. O Recueil Précieux da maçonaria adonhiramita, de Guillemain Saint Victor, de 1781, afirma que “… o juramento é pronunciado com a mão direita sobre o Evangelho”, enquanto um manuscrito do final do século XVIII traz “…sobre os Santos Evangelhos”. O Grande Oriente, nos Rituais do Rito francês, estabelecidos em 1782, não manteve esta condição, e os juramentos são prestados sobre o Livro das Constituições.

Há dois tipos de segredos: aqueles que decorrem da profissão e que o aprendiz vai descobrindo aos poucos à medida em que se qualifica profissionalmente e aqueles que consistem dos meios e sinais de reconhecimento, especialmente da “palavra” do maçom. Os primeiros diziam respeito ao talhe bem preciso da pedra, assentamento de blocos, construção de arcos, abóbadas, cúpulas, etc. Eram diferentes da geometria pura utilizada pelos companheiros para preparar desenhos e planos. Os maçons “aceitos” não tinham o que fazer com tais ensinamentos e, assim, seus elementos foram se perdendo pouco a pouco. No início do século XVIII, os “especulativos aceitos” haviam conservado apenas alguns fragmentos desses segredos que “ganharam uma nova roupagem”, sendo atribuído a eles um significado moral ou simbólico extraído de toda a massa de ciência estranha que inundava a Europa. Os segredos operativos não deixaram nenhum vestígio de conhecimento especulativo de caráter esotérico.

“A Palavra do Maçom” continuou a intrigar os historiadores ingleses da maçonaria. O uso de uma “palavra” é muito antigo, uma vez que ela é encontrada nas tradições egípcias, hebraicas e mesmo védicas; na Idade Média, os homens do Ofício se reconheciam por ela. É de origem escocesa e não há certeza de que existissem nas Lojas “aceitas” inglesas, no primeiro quarto do século XVIII, fora da região de fronteira com a Escócia. Sua presença é garantida pelos “operativos aceitos” das Lojas Saint Mary’s Chapel, Aïtksonhaven, Dunblanc, etc. a partir do século XVI. Vimos que a comunicação era um dos elementos essenciais na Recepção de Aprendizes. Era única para todos os membros. Com o tempo, ela emigrou para a Inglaterra devido à troca ininterrupta de trabalhadores entre os dois países. Os “aceitos” a desdobrarão, talvez para distinguir-se dos operativos. Eles criaram uma (ou conservaram a existente) para os aprendizes, uma para os companheiros, e mais tarde, tendo se tornado especulativos, uma para os mestres. Este desvio da “palavra” de origem escocesa, que, lembramos, não tinha em si qualquer valor esotérico, gerou, a partir dos anos 1735-1740, toda uma série de palavras ditas “sagradas”, criadas pelos inúmeros graus que vieram em seguida e que constituirão o que chamamos de Escocismo. O modo de reconhecimento foi transformado em um símbolo, de uma “verdade perdida”, ou de uma “palavra perdida”, juntando-se assim às famosas fórmulas orais encontradas nos contos de fadas, cujo poder misterioso abre todas as portas. Em 1753, o virulento propagador irlandês da Maçonaria dita “dos Antigos”, Laurense Dermott, a definiu como “a medula[10] da Maçonaria.”

A maçonaria operativa conhecia apenas dois graus, além de uma função, a do Mestre de Loja, que era escolhido por seus companheiros, pelo menos até 1710. A presença do Templo de Salomão na lenda da Ordem faz parte dos enigmas não resolvidos. Das 150 versões de manuscritos já mencionadas, apenas dois falam disso: o Regius (1390), poema em versos, e o Cooke, mais explícito do que o seu antecessor e a mais antiga referência aos “Deveres Operativos”. Narra brevemente a história do ofício da Maçonaria, assumindo parcialmente o que é dito na Bíblia. Dá um papel muito mais importante à Torre de Babel e a Nimrod do que a Salomão e seu Templo. São 76 linhas de texto contra 28, e menciona os dois pilares sobre os quais foram gravadas as sete artes liberais de Ciências e Artes (das quais, entre parênteses, encontramos vestígios no grau 30 do Rito Escocês). Dois pilares dos quais um não poderia brilhar e outro ficar sob sombras, a fim de protegerem o precioso conhecimento da época da destruição ou da vingança de Deus.

É apenas no início de 1700 que eles retornam timidamente nos raríssimos “Antigos Deveres[11]” ainda em uso, mas logo desaparecem em benefício das duas colunas de Solomão. No mesmo período, no registro da Grande Loja de Edimburgo, à pergunta: “… onde existiu a primeira loja? “, responde-se “… no pórtico do Templo de Salomão.” Pouco antes de 1700, a Grande Loja de York menciona as festas celebradas na inauguração do famoso Templo e a morte de Hiram, seu arquiteto, sem qualquer menção ao seu assassinato. Dez anos depois, o manuscrito Dumfries no 4 dá às duas colunas tiradas da sombra um sentido religioso cristão que será retomado posteriormente.

Então, por que Salomão? E por que depois de um silêncio que durou 300 anos?

A causa que provocou este efeito terá sido o fato de que, em 1665, Jacob Jéhu Leon, um judeu espanhol, exibiu em Londres um modelo muito bonito do Templo de Salomão, que atraiu enorme atenção (a exposição continuou com o mesmo sucesso até 1765, ou seja, um século depois)? Ou seria a publicação, em 1688, de um livro “Le Temple de Salomon spiritualisé“, do escritor anabatista John Bunyan, autor conhecido e respeitável?

Vindo após esses dois eventos, parece que teria sido George Payne, por pouco tempo Grão-Mestre da Grande Loja de Londres, que, em 1721, ao apresentar o manuscrito Cooke, de 1410, na Reunião da Saint Jean d’Eté, se tornaria o iniciador de uma lenda salomônica desconhecida tanto dos operativos escoceses quando dos “aceitos” ingleses do século XVII. É lá que estamos, 1720-1730, à beira de uma maçonaria especulativa cujo simbolismo não conhecerá limites antes do final do primeiro quarto do século XIX.

Paradoxal e estranha e a anomalia que configura a completa ausência de ferramentas do ofício nos manuscritos que relatam a recepção de aprendizes e companheiros. Elas aparecem pela primeira vez em 1696 na ata do Registro de Edimburgo, a propósito do juramento: “Juro por Deus, pelo esquadro e pelo compasso.”, fórmula repetida nos mesmos termos em 1710 e 1714. Em 1710, o manuscrito Dumfries no 4 também cita pela primeira vez três pilares sem qualquer relação com as duas colunas de Salomão, indicando que eles significavam Esquadro, Compasso e Bíblia. Teria sido este o prenúncio das três luzes que encontramos um pouco mais adiante? E foi entre 1720 e 1730 que se introduziu a gama completa de ferramentas – régua, tesoura, maço, malhete, prumo, nível, trolha, etc. – que, pela graça dos especulativos, se transformariam em símbolos totalmente desconhecidos para aqueles que diariamente, durante séculos, por dever de ofício, as manipulavam. Ocorre o mesmo para os dois símbolos fundamentais da maçonaria, pedra bruta e cúbica polida. Eles jamais existiram nem entre os operativos nem entre os aceitos, e as primeiras Lojas especulativas do século XVIII os ignoravam. Devem ter nascido na França, por volta de 1740, sendo timidamente divulgados mais tarde, mas sem que um significado lhes tenha sido atribuído. No máximo, eles diziam: “… uma pedra sobre a qual as ferramentas são afiadas”, e é esta iconografia particular que nos anuncia a sua existência.

Então o que resta da lenda da qual somos os herdeiros, de cuja tradição operativa ancestral e simbólica nos tornamos veículos e à qual nos referimos com orgulho e reverência?

O maçom “aceito” era o elo entre operativo e o especulativo, mas, já no século XVII, os “usos” e não os ritos diferiam significativamente entre operativos e aceitos, e o fosso acentuou-se até que eles se tornam quase estranhos uns aos outros. Apenas os escoceses parecem ter preservado por muito mais tempo os elementos antigos, muito simples na verdade, que tentaram manter no seio das Lojas inglesas. É provavelmente essa contribuição, renovada ao longo do tempo graças aos movimentos dos maçons escoceses, que sugere, por analogia com o que tinha acontecido anteriormente, o porquê dos novos graus que surgiram na Inglaterra, em 1730 – sem que eles estivessem envolvidos – terem sido atribuídos à maçonaria escocesa. Eles receberam o epíteto de Escoceses e a partir desse momento este termo cobre todos os graus – além de aprendiz, companheiro e mestre – que surgiram mais tarde.

Assim sendo, qual foi a maçonaria trazida, em junho de 1726, por Charles J. Radclyffe e seus amigos? Nada diferente do que existia na época e que estava descrito tanto no Registro da Grande Loja de Edimburgo como nas Constituições de Anderson, em 1723. A maçonaria com dois graus, de simbolismo apenas esboçado, mas já equipada com um propósito, muito vago é verdade, de “Ser o Centro de União”, com um sistema administrativo relativamente estruturado, mas limitado a critérios de regularidade, possivelmente uma lenda histórica gloriosa que lhe conferia nobreza, tudo acompanhado de um segredo misterioso sobre a natureza do qual todos ficavam perdidos, inclusive aqueles que o possuíam.

O manuscrito de Edimburgo descreve o desenrolar das reuniões: as poucas formalidades na convocação dos membros, a definição da multa para os ausentes, as admissões (cujo cerimonial perpetuava o que os operativos deixaram), o trote durante a refeição, a análise de multas anteriores, os eventuais julgamentos de delitos, os empréstimos de dinheiro para assistência, a eleição anual de oficiais e, finalmente, o banquete. Estes procedimentos foram definitivamente fixados em 1640 e continuaram sendo aplicados nos primeiros anos do século XVIII. Em algumas Lojas a recepção foi acrescida de uma leitura da história – lendária – da maçonaria. A obrigação permaneceu moderada; sem ameaça de sanção por violação ao juramento. O manuscrito Chetwode Crawley, por volta de 1700, o Haugfoot (1702), o Kewan (1714), etc., que revelam este procedimento, são de grande interesse porque mostram a transição que ocorreu entre os últimos “operativos aceitos” e os primeiros especulativos: nenhum manuscrito anterior se compara a eles, e não haverá outros depois deles.

Não parece que na França tenha sido diferente; e, se não temos documentos que nos apoiem ou contradigam, como dizer se foi ou não diferente? Uma Loja, em 1726, uma segunda, em 1729, uma terceira em 1730, todas de origem inglesa. Admitamos assim esta simplicidade[12], mesmo porque ela terá duração muito curta e não pode ser comparada com o que vai aparecer nos dez anos seguintes.

Os “costumes” se transformarão em “rituais”. Sua proliferação desordenada criará ritos. Credulidade, vaidade, ganância, muitas vezes ajudadas pela imaginação, farão com que a razão perca seu espaço. O simbolismo maçônico vai se entregar a um caminho insano, às vezes dogmático, do qual não sairá senão depois de um século, retendo algumas sequelas. E, como tal afirmação exige provas, lembremos que o telhamento de Ragon, que foi dignitário do Grande Oriente, aponta mais de 1450 graus, com 1450 rituais diferentes, incorporados a 48 ritos maçônicos praticados por 54 ordens, incluindo 24 mistas e 6 acadêmicas.

A história dos rituais é extremamente complexa, tanto na variedade de itens que serão incorporados quanto pela ignorância que temos de sua origem, data e local de aparecimento. Dois exemplos marcantes: a incorporação da lenda salomônica citada acima, e a lenda de Hiram, chave de toda a maçonaria especulativa escocesa, que ignorou completamente tanto a maçonaria operativa quanto a “aceita”, e cujo assassinato é estranho à Bíblia, sem que saibamos quando ou através de quem ela apareceu. Mas foi ela que originou o sistema de três graus da maçonaria simbólica e sua extensão nos Altos Graus do Rito Escocês antigo e aceito, sem que jamais se fosse capaz de determinar as condições precisas em que se estabeleceram.

Podemos, sem medo de errar, fixar o ponto de partida da maçonaria especulativa na década de 1720. O que sabemos de suas primeiras cerimônias vem de “revelações”. Tudo o que é misterioso atrai; elas faziam um enorme sucesso e seu número não parava de crescer. Quanto ao conteúdo, quanto mais revela, mais é suspeito, embora concorde-se que isso depende de uma análise rigorosa dos textos que permita identificar o que é genuíno e o que não é. Eles se roubaram descaradamente tentando suplantar uns aos outros. Serviram como um auxílio à memória, e através de sua difusão é provável que tenham contribuído muito para o estabelecimento de rituais cujo desenvolvimento se estendeu por anos, fornecendo elementos mais ou menos simbólicos de todas as procedências e que se instalaram na mente dos maçons.

A primeira revelação apareceu em um jornal de Londres, o “Flying Post”, a partir de 13 abril de 1723, sob o título de “A mason’s examination“. Este panfleto sem grande alcance foi reproduzido em cartazes afixados nas ruas da cidade. Seguido, em 1724, por “le Grand Mystère dévoilé“, que foi republicado em 1725, juntamente com uma versão impressa de um pretenso “Old Charges” conhecido como “Briscoe Text“, completamente absurdo.

Muito mais grave foi, em 1730, o trabalho “A Maçonaria Dissecada”, de Prichard, que foi recebido maçom posteriormente. Certamente aborreceu a Grande Loja da Inglaterra, que tacha imediatamente o trabalho de “impostura”. Ele trouxe muitos elementos, reconhecidos como válidos mais tarde, sob a forma de perguntas e respostas com, e pela primeira vez, uma versão muito simples da Lenda de Hiram. O conjunto compreende tudo o que poderia constituir um ritual de três graus.

Em 1735, uma edição pirata das Constituições de Anderson, de 1723, apareceu sob o título de “Pocket Companion” mas não trouxe nada de novo. O livro de Prichard, reeditado muitas vezes, foi a única “revelação” inglesa durante os 30 anos seguintes, até 1760.

A França foi muito mais prolífica tanto no número de livros, quanto na diversidade das revelações. A primeira, “La Reception d’un Frey-Mason“, publicada em 1737, por Hérault, tenente de polícia, teve um grande impacto. Era um trecho de um relatório tirado das declarações de La Carton, uma dançarina do Opera de Paris, que havia obtido suas informações de seu amante, Lenoir Cintré. Se o texto é bastante insignificante, pois traz poucas novidades, a dezena de Revelações que se seguiram revelaram quase todos os “segredos” entre aspas, da Maçonaria, segredos estes até desconhecidos pelos próprios maçons ingleses, o que lhes dá um certo sabor.

Citamos, depois de Hérault (1737), outras revelações:

La Réception des Francs-Maçons 1738 ;

La Réception mystérieuse des Francs-Maçons, 1738

Le catéchisme des Francs-Maçons, 1740 (revista e corrigida 1749) ;

L’Almanach des cocus, 1741

Le Secret des Francs-Maçons, 1742

Le Sceau rompu, 1745

L’Ordre des Francs-Maçons trahi, 1745

Les Francs-Maçons écrasés, 1747

Algumas deram origem a várias edições. Só o “Trahi” teve umas umas trinta, além dos plágios. A bibliografia maçônica de língua francesa do período de 1730 a 1790 contém mais de 900 obras.

Algumas tiveram direito a tradução para o inglês e o alemão e foram inflacionar o simbolismo maçônico estrangeiro, que não necessitava disso.

Não havia rituais como os conhecemos, mas narrativas claras através das quais é fácil reconstruir o cerimonial das reuniões. Os catecismos e a resposta às perguntas, que se tornarão as “Instruções” baseadas nas de Prichard (1730), incluirão regularmente, a cada edição, elementos novos, entre os quais, “as palavras” com o motivo para a sua introdução e seu significado simbólico. No início do século, o mais antigo catecismo não apresentava mais que quinze questões. Em 1730, apenas no grau de aprendiz, apresentava mais de uma centena.

A iconografia começa por volta de 1740: painéis de Loja para os diferentes graus, gravuras de recepção, importantes pelo que aportam em complementação aos textos. As figuras extraídas dal’Ordre des Francs-Maçons trahi (1742), do Catéchisme des Francs-Maçons (1749) e da La Franc-Maçonnerie démasquée(1751) enriquecerão todas as obras publicadas posteriormente. Hogarth e Watson divulgarão aspectos pouco conhecidos, às vezes imaginados, da vida das Lojas na Inglaterra. A partir de 1750, os aventais maçônicos, magnificamente bordados, se revelarão verdadeiros “livros mudos”, trazendo, para a sagacidade dos curiosos, todo o simbolismo de sua época.

De 1700 a 1725, as Lojas se reúnem em tabernas das quais também obtêm seu nome. Na França, elas se veem sob a proteção de um santo, geralmente aquele cujo prenome era igual ao do Mestre da Loja, e começam a partir de 1735. O mundo profano não era adequado para reuniões, e, sendo assim, precisavam sacralizar locais onde nenhum dos elementos herdados do século anterior existia. Isso foi remediado pelo painel da Loja. A data de seu aparecimento é incerta. Mas os textos indicam que no primeiro quarto do século XVII a imagem da Loja era desenhada no chão, com giz e carvão, sendo apagada no final da reunião. Tinha a forma de uma cruz e se tornou “alongada” com “…as inovações introduzidas recentemente pelo Dr. Desaguliers e alguns outros modernos” (fim de uma citação de 1726).

Sacrílegos, eles substituem o giz e o carvão por fitas, tachas e letras móveis. Os tapetes das casas senhoriais onde se reuniam as Lojas com certas figuras importantes, explicam o novo procedimento. De acordo com um catecismo da época “as fitas eram brancas e tachadas, com as letras E para Leste e S para Sul”. Mais tarde, a decoração deu lugar a um tapete, e, em seguida, a um painel: nele vemos as colunas de Salomão, o sol, a lua, as ferramentas do ofício, as duas pedras, etc., sem que isso fosse regulamentado por qualquer texto.

Se, no tempo dos “aceitos” a loja era iluminada por uma chama que saía de uma terrina “triangular” na qual se queimava álcool de vinho, os especulativos usavam tochas. Note de passagem que os operativos e aceitos do século XVII nunca usaram o triângulo como um símbolo e que a terrina relatada acima era uma inovação. Segundo manuscritos de 1700 a 1720, as tochas que viriam a se tornar “As Luzes”, eram sempre em número de três, não mais. Para a Loja de Edimburgo, que é primeira a mencioná-las (1698) elas são o mestre, o vigilante e o companheiro. O manuscrito Sloan (1700) dá uma outra versão: são o sol, o mestre e o esquadro. Para o Dumfries (1710), estas três tochas tornaram-se três pilares: o esquadro, o compasso e a Bíblia. Dois textos de 1724 e 1725 dizem que é o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Depois, um grupo de três textos corajosamente propõe doze luzes que são, na ordem: Pai, Filho, Espírito Santo, o sol, a lua, o mestre maçom, o esquadro, a régua e as ferramentas mencionadas na época. Repare a ausência muito importante da Bíblia e do compasso.

Elas crescem em números, e em meados do século um grau escocês terá oitenta e uma. Sua posição dentro do Loja varia constantemente. Prichard (1730) e o manuscrito Wilkinson (1730) fazem-nas viajar e lhes atribuem o sol, a lua e o mestre da loja. É assim que a França as interpretará de 1730 a 1760. A partir dessa data haverá uma nova variação, e elas serão seis: três grandes luzes, bíblia, esquadro e compasso, e três pequenas luzes, sol, lua e o Mestre da Loja.

Talvez já fossem seis em 1730, quando Prichard e Wilkinson, citados agora, diziam: “três pilares sustentam a Loja: sabedoria, força e beleza”, fórmula vista pela primeira vez em um texto maçônico. Sentença puramente simbólica, sobreposto ao grupo de três luzes, sol, lua e mestre maçom, com a qual elas não se confundem. O destino desses símbolos se tornará definitivo em 1760, quando eles serão, respectivamente, associados ao mestre da Loja, ao primeiro e ao segundo vigilantes. Naquela época, vários dos diplomas das Lojas emitidos para os seus membros continham o lema “Força e Estabilidade”, parecendo que se aplicava à Igreja visando garantir sua perenidade, mas isso só foi encontrado na França e só neste tipo de documento.

Nós não temos nenhuma explicação satisfatória para a presença do pavimento mosaico na Loja apesar de ser um simbolismo bastante óbvio. Parece que na época em que se desenhava o painel da Loja no chão, era preciso enxergá-lo, provavelmente para situar oficiais, companheiros e aprendizes, e assim foram desenhados os quadrados pretos e brancos para distinguir os locais, embora não haja provas disso.

Na Inglaterra, o tapete em mosaico tinha a borda azul e a orla dentada em vermelho, terminada nos quatro cantos por uma borla. Guardará semelhança com a borla dentada que ilustra o Catecismo dos Maçons, edição de 1747, representada por uma longa corda terminado com duas borlas e que rodeia a parte superior do painel? Hiram era o filho de uma viúva. Nós, seus irmãos, somos os “Filhos da Viúva”. Na heráldica francesa, as armas de uma viúva são cercadas pela mesma corda descrita acima, e, a moldura do painel que contém estas armas, decorada com triângulos pretos e brancos. Assim se poderia esclarecer o significado deste símbolo, que tem sobrevivido em relativa obscuridade.

Desde sua origem os maçons especulativos se inscrevem na Ordem cósmica. Provas: o sol, a lua, os quatro pontos cardeais desenhados no painel da Loja, a orientação deste, as direções nas quais se espera que os maçons de desloquem (De onde vindes? Onde ides?), as viagens feitas ao longo da recepção de um candidato no sentido da rotação do sol, a Estrela Flamejante do segundo grau, o céu estrelado, um dossel azul escuro salpicado de estrelas. Tudo isso materializa a vontade de fazer da Loja uma representação do universo. Isso desde 1710, no manuscrito Dumfries no 4 e no manuscrito do Trinity College de Dublin (1711). O catecismo de Prichard em 1730, etc. confirma que, à pergunta: “Qual é a altura do Loja? “, responde-se: “tão ilimitada quanto o céu e suas estrelas”.

O mobiliário da Loja foi mais reduzido. A mesa do Venerável, de nível. O patamar com três degraus virá muito mais tarde com o mestre e o livro; em sua parte inferior, uma pequena mesa baixa em que foram colocados o esquadro e o compasso: no momento do juramento, o candidato pousava o joelho direito sobre essas duas ferramentas, e assim formava um esquadro com a outra perna.

O painel da Loja, já citado, e suas tochas – três ou três grupos de três, igualmente arranjados nos cantos do tapete, de acordo com a época e lugar. Nem cadeiras nem mesas. Os irmãos ficavam em pé e o venerável sentado. Mais para o fim do século, os vigilantes também se beneficiaram de uma mesa cada um, com uma coluna de cerca de 25 centímetros sobre ela.

Quando as circunstâncias permitiam, as duas colunas de Salomão ladeavam a porta da frente: eram encimadas por um capitel (Bíblia, Reis 3 – 15,2) coberto com romãs. Salomão tinha denominado a primeira, à esquerda, de Boaz, que parece ter sido um de seus antepassados, e a outra de Jakin, mas o texto não fornece qualquer explicação. Esquerda-direita, direita-esquerda? A inversão da posição ocorreu na Inglaterra entre 1730 e 1735 de uma injunção que se seguiu à revelação das palavras sagradas para o mundo profano, a fim de evitar sua utilização por personagens que não tinham sido admitidos regularmente.

Uma gravura inglesa, de 1750, mostra uma mesa, enorme, ocupando quase toda a gravura, em torno do qual os irmãos estavam em pé, com a cabeça descoberta, participando da recepção de um aprendiz: numa das extremidades o venerável, malhete na mão e coberto com um chapéu de três pontas, com um livro e um esquadro diante de si. Três pequenas velas em triângulo nos cantos da mesa. A atitude dos irmãos, vestidos com um avental longo, abetas para baixo e muito descontraídos, sem dúvida sem saber o que fazer com as mãos, além de colocá-las nos bolsos. Mais tarde, em 1787, um célebre quadro retrata a entrega de um prêmio ao Ir\ Robert Burns, poeta e escritor, durante uma sessão solene da Loja Cannongate de Edimburgo. Os irmãos, em número de três, estão espalhados ao redor da sala. Não ousamos dizer que é o templo, embora haja uma plataforma elevada no Oriente, com três bandejas. De pé, sentados ou descuidadamente deitados, conversando em volta das mesas espalhadas por toda parte. Curiosa imagem de uma reunião maçônica que se parece muito mais com um encontro profano da pequena nobreza, mas eles estavam revestidos de seus aventais e sem colar.

Os aventais eram de couro branco, emoldurados por uma fita azul ou branca, como havia decretado a Grande Loja da Inglaterra, em 17 de março de 1731. Anteriormente, a 27 de junho de 1726, ela havia ordenado que os Mestres de Loja e os vigilantes “usassem as joias da maçonaria” penduradas em uma fita branca em torno do pescoço, os mestres com o esquadro, os vigilantes com o nível e o prumo”. Em 17 de março de 1731, as joias tornaram-se de ouro ou douradas e a fita passou a ser azul. Esta decisão nem sempre foi respeitada, e, em 1739, a Loja Antiquity manteve o “colar verde de acordo com os antigos costumes”. Para outras ele era amarelo, e avental branco, mas emoldurado de vermelho. A joia-compasso é descrita no manuscrito Dumfries no 4, em 1710, e no frontispício das Constituições de Anderson, em 1723, mostrando o Duque de Montaigu, grão-mestre da Grande Loja, passando-a ao Duque de Wharton, seu sucessor. A cor das pontas do compasso em cobre e a do corpo em aço determinarão que, daí em diante, o colar será amarelo e azul, o que o “Trahi” de 1745 também confirma. Tornar-se-á azul em seguida, e aquele do mestre de banquetes continuará a ser vermelho, assim como seu avental. Em 1742, o venerável porta o esquadro e o compasso, os outros oficiais apenas este último. Não era obrigatório, mas é a primeira menção na França deste uso que permanece até hoje.

O colar tinha apenas um objetivo: pendurar as joias e assim distinguir os oficiais. Não tinha qualquer significado simbólico. Em 1759, uma gravura mostra que os colares eram portados da esquerda para a direita, o que parece dizer que ele não era feito para portar da espada em Loja, mas sim simbolizava a Igualdade. Nenhum dos personagens representados nas gravuras, incluindo os oficiais, ostenta luvas.

Duas questões sobre o ritual. A palavra não aparece em nenhum dos estatutos e regulamentos das Grandes Lojas. Parece resultar daí a natureza dos “eventos” maçônicos descritos nos relatos fornecidos pelas “revelações”. Quanto à “coisa” ritual, isto é, à recitação das cerimônias, parece ter sido codificada no final do século, pelo menos na França.

A maior dificuldade encontrada no estudo dos rituais provém do fato que, até 1858, a sua impressão era proibida, e, portanto, todos eles são manuscritos, sem data e sem origem. A única edição impressa antes desta data foi a do Régulateur Maçon (1801) reproduzindo exatamente os rituais para o rito francês estabelecidos pelo Grande Oriente em 1782, mas que era desconhecida por este. A partir de1800, uma série de “Thuileur[13]“, que, do ponto de vista maçônico, era ilegal, apareceu sob a assinatura de maçons frequentemente proeminentes. Reconheçamos também que nenhum estudo “científico” da ritualística maçônica jamais foi realizado e que sua abordagem permanece delicada.

A abertura e fechamento do Loja só foram estabelecidos entre 1742 e 1760, e primeiramente na França. O venerável, mestre da loja, e cujo título foi emprestado da Ordem dos Beneditinos, se fazia avisar pelos vigilantes que ela iria ser aberta. Só ele estava coberto e retirava o chapéu na abertura, e, em seguida, o colocava de volta. Mas o “Trahi” de 1745 traz duas gravuras onde todos os assistentes estão intimidados. Então vinha a recitação do catecismo pelos oficiais. Em 1730, à pergunta “Sois maçom?”, o vigilante respondia: “me consideram como tal” seguido de “onde se encontra o primeiro vigilante? Qual é o seu dever?”. E assim por diante, para cada um dos cargos. Os visitantes eram “telhados” (o termo parece já existir na época), duas vezes: antes de entrar e, em seguida, na Loja antes de ocupar o seu lugar. A presença de um profano, mesmo na sala dos passos perdidos, era relatada pela fórmula “chove”.

Na Inglaterra, no final do século, a reunião era interrompida por refrescos, anunciados por qualquer um dos vigilantes que deitava a coluneta no seu lugar, como já foi mencionado. O “trabalho” entre aspas, cessava, bebidas eram servidas, bem como, às vezes, a refeição. Em seguida, os trabalhos eram reiniciados com o erguimento da coluna. Não parece que naquele tempo a França conhecia este procedimento, substituído – pode-se dizer que com vantagens – pelas lojas de mesa e seu ritual particular. A partir de 1786, os trabalhos não tinham início sem que os vigilantes tivessem pedido aos irmãos as palavras, sinais e toques. Também nesta data foi introduzida a leitura do traçado dos trabalhos anteriores e a adoção das observações do irmão orador, um oficial que a Inglaterra ignora até hoje. O fechamento da Loja logo foi ritualizado como a abertura, porque numa se fazia a cadeia de união – encontrada, pela primeira vez, em 1744 – e, na outra, se separavam sob o “Chant des apprentis[14]” que veio das Constituições de Anderson. Em 1760, “… no final de cada verso cantado, eles se juntavam as mãos cruzadas para formar uma cadeia, sacudindo-as para cima e para baixo, enquanto batiam com força a sola do pé no chão, o que causava surpresa para os de fora.”

Catecismo, benemerência e recepções eram a maior parte da atividade das Lojas. Mas, durante muito tempo, o banquete era ainda mais importante. Em 1750, foi instituída a leitura da história da maçonaria, retomando um costume dos antigos operativos. A imaginação desenfreada e entusiasmada, ajudada pela proliferação anormal de altos graus, trazia alegria aos corações. Se formos admitir, a rigor, que o famoso discurso de Ramsay (1737) afirmando a influência dos cruzados sobre a origem da Ordem e sobre o desenvolvimento de seu simbolismo, tenha fornecido uma tese plausível para esta história (Émile Mâle demonstra a sua incontestável contribuição no domínio da arte), ficamos loucos diante de Deus instalando sua Loja pessoal, para si mesmo, antes mesmo de Adão constituir a dele para ser, sem dúvida, “o Centro da União”.

Ao contrário, o que não pode ser negado é a influência que as surpreendentes divagações dos altos graus do Escocismo em plena evolução tiveram no desenvolvimento da liturgia dos três graus simbólicos, em particular nas duas recepções – aprendizes e mestres – dois psicodramas que devem ser examinados em suas vicissitudes.

Em que os especulativos do século XVIII transformaram as recepções simples de aprendiz das Lojas operativas e as também despojadas dos “Maçons Aceitos” do século XVII?

Damos a esta cerimônia o nome de iniciação, mas ao longo de décadas ela tem servido como entrada ou recepção, não como iniciação. A palavra “iniciação” fez a sua forte aparição timidamente em 1801, no prefácio do “Régulateur Maçon” e apenas no caderno do venerável, que reproduzia às escondidas do Grande Oriente e sob seu selo, os rituais do Rito Francês em sete graus e quatro ordens que ele havia estabelecido em 1786. Teria sido devido ao trabalho intitulado “Recherches sur les initiations anciennes et modernes[15]“, publicado em 1781 pelo Ir\ Jean Baptiste Claude Robin, membro da loja “Les Neuf Soeurs” do Oriente de Paris, e divulgado durante uma sessão memorável relatada por Dixemerie? Não se pode tomar ao pé da letra a frase “…os verdadeiros iniciados” encontrada em itálico (pág. 7 e 12) no texto de um panfleto anônimo publicado em Haia, em 1745, chamado “«Le Tonneau jetté ou réflexions sur la prétendue découverte de l’Ordre des Francs-Maçons[16]» refutando a “l’Ordre des Francs-Maçons trahi“, do abade Perau. Também é sintomático que a Convenção da Philalethes organizada em 1785-1787 pela Loja “Les Amis Réunis“, do Oriente de Paris, dedicada ao estudo da “ciência maçônica”, suas origens e seus objetivos, em nenhum momento tenha considerado uma pesquisa sobre as iniciações ou uma eventual reaproximação com os antigos “mistérios”. Só uma intervenção, feita pelo Ir\ Westerholdt na sessão de 19 de abril de 1785, faz menção à sua “…alta antiguidade” e acrescenta: “… a Maçonaria, tendo uma analogia perfeita com as iniciações”. Mas este estímulo não trouxe nenhuma reação por parte de uma platéia composta pelos maçons mais proeminentes e os mais cultos de toda a Europa. De qualquer forma, a palavra “iniciação” só se tornou oficial, maçonicamente falando, em 1826 (Art. 217 da Constituição do Grande Oriente de França).

Quando houve “iniciação” no sentido iniciático do termo? O máximo que se pode ser sugerir é que foi ao longo da década de 1780, após tentativas de codificação de rituais, feitas em primeiro lugar pelo Grande Oriente da França, em 1786, e também pelas Convenções de Lyon, em 1778, e de Wilhemsbad, em 1782, para o Rito Escocês retificado.

Certamente havia “iniciação” antes desta última data. Mas isso só afetou os círculos de Lyon, cujo misticismo declarado era expresso sob a forma maçônica. Desde 1767, Willermoz e seus seguidores dedicaram, através de um sincretismo que combinou os sistemas de Saint Martin e Martinès de Pasqually, a implantar estranhas cerimônias ao mesmo tempo religiosas e mágicas, destinadas a devolver ao homem decaído a sua pureza original. Uma carta enviada a João Batista Willermoz por seu irmão Pierre Jacques, datada de 1768 e preservada em Lyon pela coleção W. 5471, diz “… queremos iniciá-lo na a hora certa”, mostrando que havia “iniciação”. Elas não eram restritas só aos Altos Graus, reservados para uma elite cuidadosamente escolhida e, portanto, muito pequena. Um documento altamente secreto, acessível a poucos eleitos, “L’Instruction des Grands Profès[17]” último grau do Regime Retificado de Lyon, de 1778, publicado recentemente em um trabalho de Antoine Faivre sobre a obra de Le Forestier, confirma este fato (Lyon – Coleção W. 5475). Este tipo de cerimônias, deixando de fora aquelas muito diferentes, referem-se aos três graus simbólicos. No entanto, a seriedade e o rigor próprios da execução da cerimônia de iniciação dos altos graus – rigor tornado necessário por seu lado mágico – leva a se pensar que ela contribuiu para fortalecer e estabilizar a liturgia das recepções de aprendiz, companheiro e mestre, destinadas mais tarde a se tornarem iniciações.

O aspecto esotérico do ensinamento ministrado nas oficinas de vocação superior, dedicadas à busca do desconhecido e do secretismo que isso envolvia, necessariamente levou à sacralização do ritual em todas as suas modalidades. Ocorreu insidiosamente, poderíamos dizer pouco a pouco, e, assim, instaura o caráter “iniciático” das recepções dos três graus simbólicos. Mas então surge a pergunta: que tipo de iniciação?

Não há nada que o homem tenha criado que não seja em resposta a uma necessidade profunda de seu consciente e, mais ainda, de seu inconsciente. A universalidade no tempo e no espaço dos impulsos que o movem, ilustra o conceito de arquétipos inerentes a toda a espécie. Parece que estes últimos se impõem às várias formas de vida animal. A repetição contínua de atitudes, gestos, torna-se uma linguagem que se transforma, sem que percebam, em códigos especiais para cada um deles. No ser humano, o surgimento da palavra ocorreu pelo controle da voz, e o pensamento que se seguiu levou-o a uma tomada de consciência do mundo e de seus inúmeros perigos; a reflexão analógica e as práticas mágicas que disso resultarão, farão com que se unam. A eficácia destas últimas repousava sobre uma execução rigorosa do seu gestual. Nascia a ritualística, com seus rituais de todos os tipos. Sob múltiplas formas, ela tem continuado a se desenvolver, tanto nas relações sociais quanto no que se refere às abordagens do mundo não-manifestado, substância do “sagrado”.

A morte e o desaparecimento que ela implica deverão aparecer como o maior perigo a que o homem poderia ser submetido, daí sua ansiedade, a recusa de aceitar, e a esperança de sobrevivência em um além diferente. Portanto, a morte era apenas uma passagem que leva a um renascimento neste mundo não manifestado, mas pressentido, e que era domínio do sagrado. Uma passagem, como a do nascimento à vida, da infância para a adolescência, desta última para a masculinidade pelo exercício da sexualidade, tudo sacralizado durante cerimônias rituais. Sendo o rito a única forma de acessar a estes diferentes níveis de ser, todas as civilizações, da mais primitiva à mais sofisticada, sabiam, e ainda sabem, que estas práticas são mantidas em segredo porque espera-se que tragam um poder considerável para aqueles que são seu objeto.

Estamos no século XVIII. Um saber estranho circulava por toda a Europa sedenta de luz. O oculto reinava supremo nas mentes. Transmitido pelo rosicrucianismo, que prometia a imortalidade, pela alquimia, que prometia a riqueza, pelo hermetismo, que daria o poder, e pela Cabala, que traria o conhecimento, tudo adequado a um mistério próprio para despertar todas as curiosidades, este mesmo mistério que parece haver nas Lojas Maçônicas, tão antigas, ou pelo menos pensávamos que sim. A tentação de confrontar esse conhecimento com o que tínhamos, e adquirir outros, era grande. Na realidade, as Lojas tinham poucos, muito poucos, e sua pobreza intelectual e esotérica era decepcionante. Era necessário alimentá-las, dar-lhes uma razão para ser qualquer outra coisa, que não sociedades “vazias”. A lenda de Hiram chega justamente num momento que se formava o conteúdo doutrinal da maçonaria especulativa nascente. Vimos antes que não se sabe sua origem e que ela apareceu em algum lugar na Inglaterra ou na Irlanda. Ela é implantada gradualmente, tendo lugar, em 1738, na segunda edição das Constituições de Anderson, embora tenha tido de esperar até 1760 para ser admitida de forma permanente, pelo menos na Grã-Bretanha, porque na França o processo de integração foi mais rápido. Ela gerará toda a série de Altos Graus que envolverão totalmente o mundo maçônico. Era óbvio que o assassinato de Hiram não podia ficar impune. Assim nasceram os graus de vingança e as cenas grandiloquentes que deram lugar às recepções que se seguiram, tornando-se necessário, para lhes dar um tempero, a introdução dos graus cavalheirescos. Ele – o assassinato de Hiram – é incorporado ao grau de mestre surgido antes dele por desdobramento do de companheiro, e sem que ninguém saiba por que ou como, foi completamente absorvido.

A incrível popularidade dos Altos Graus e, especialmente, a dramatização das admissões e, decorrente delas, uma necessária estruturação da liturgia apropriada à recepção de aprendiz, para a qual se trouxeram elementos de todos os tipos, o que se estende de 1740 a 1850.

Nenhuma doutrina propriamente dita: nada da muito vaga filosofia Rosacruz, nem da mística judaica, introduzida furtivamente e aos poucos no rito bem cristão dos “Antigos” estabelecido na Irlanda por Laurence Dermott, e depois propagado por ele na Inglaterra antes de 1750, apesar da adoção em rituais de uma série de palavras hebraicas que ainda hoje representam problemas semânticos não resolvidos.

Somente símbolos …

Muitas vezes díspares, emprestados daqui e dali, aos quais foram atribuídos múltiplos significados, um tanto absurdos, incompatíveis com qualquer raciocínio lógico ou mesmo analógico. Alguns deles surgem tipicamente da magia cerimonial, como é caso do malhete do venerável – forma especial da varinha, sinal do poder e da soberania (lembremo-nos que as ferramentas não eram consideradas símbolos pelos maçons operativos) – das “insígnias” britânicas, aventais, cordões, joias, ornamentos, como roupas e os pentáculos, das baterias, dos lances com o pé (agora extintos, mas mantidos no companheirismo) da cadeia de união, das circunvoluções de caráter cósmico, das repetições – verdadeiros “mantras” destinados a mexer com o inconsciente, do gestual – que se identifica com os “mudras” da Índia (o do grau de mestre é encontrado naquele país e figura nas esculturas da civilização pré-colombiana do México), etc. etc ..

Queríamos reconstituir os primeiros cerimoniais de recepção de aprendizes, companheiros e mestres da Maçonaria especulativa. O manuscrito Graham (1726) e duas revelações, “Exame do Maçom” (1723) e “A Maçonaria dissecada”, de Prichard (1730) fornecem os elementos através de perguntas e respostas, corroborados pelo testemunho de John Coustos, em dezembro de 1736, em Lisboa, durante seu julgamento no Tribunal da Inquisição. Aquilo que era relativamente simples no começo se complica singularmente no início de 1740 e a França não ficou de fora nas inovações que se seguiram.

Todos os textos insistem no fato de que o candidato requer sua admissão de própria vontade e se exige que forneça as razões do seu pedido. É necessariamente apadrinhado e a Grande Loja da Inglaterra torna isso obrigatório em 15 dezembro de 1730. Na recepção, o padrinho o põe em um quarto sem luz, completamente escuro, onde ficam juntos por algum tempo sem que uma palavra seja pronunciada. No final de sua estada lhe é perguntado duas vezes se é de sua vontade ser recebido. Sua resposta afirmativa faz com que ele seja levado “… com os olhos vendados, despojado de metais, nem nu nem vestido, nem calçado nem descalço, mas de forma decente” diante da Câmara de recepção, em cuja porta ele dá três golpes que são repetidos a partir de dentro. Em seguida, é introduzido pelo padrinho, que o entrega “… pobre, sem dinheiro, cego e ignorante dos nossos segredos” e é recebido pelo aprendiz mais novo da Loja.

O “nem nu, nem vestido” não é encontrado em nenhuma parte dos documentos operativos, fazendo parte apenas dos “aceitos”. Parece que vem da tradição templária e provavelmente era usado para verificar o sexo do candidato. Não há explicação para o pé descalço, nem para o ombro, apesar da evidência de que o símbolo diz respeito aos metais, rejeitados por todas as mitologias e pela própria Bíblia, que os considerava nefastos, o que parece que foi ignorado pelo “Catéchisme” (1740), pelo “Secret” (1742) e pelo “l’Anti-Mason” (1748), etc. que diziam “… desprovido de todos os metais, porque quando nós enviamos os cedros do Líbano para o Templo (de Salomão) eles iam todos cortados, e não ouvimos nenhum golpe de martelo ou de outras ferramentas quando construímos aquele edifício.” É evidente que falta se arranjar uma justificativa. De acordo com William Preston, em “Illustration of Masonry” (1772), a iniciação afasta qualquer caráter maléfico dos metais ” … o metal (a moeda) não pode fazer a diferença entre os maçons, cuja ordem é baseada na paz, virtude e amizade”.

A câmara escura é a ancestral da Câmara de Reflexões. Ela era, e ainda é, totalmente desconhecida pela Maçonaria inglesa. Também permaneceu um certo tempo na França. Ninguém sabe onde e quando ela foi introduzida na recepção, mas, mais provavelmente, foi entre 1765 e 1770. As Lojas a utilizaram entre 1776 e 1780 e o Recueil Précieux de la Maçonnerie adonhiramita, de 1783, escrito por Guillemain de Saint-Victor, dá uma descrição semelhante à dos rituais do Grande Oriente estabelecidos em 1786. Um quarto escuro com paredes escuras, iluminado por uma única vela, um banco, uma mesa sobre a qual há um crânio e todos os ingredientes – sal, enxofre, água, pão (o vitriol virá mais tarde). Nas paredes, os emblemas da morte e uma série de sentenças escritas em branco invocando a fragilidade da vida e a insignificância das coisas terrenas, além da ameaça caso o candidato não vivencie sua admissão com o coração puro. Há uma certa analogia entre este retiro de silêncio no “quarto escuro” e a reclusão do aspirante a cavaleiro às vésperas de seu juramento. Ele também era convidado a escrever um testamento. Em 1786, um manuscrito do Grande Oriente acrescenta uma inovação: as questões ditas “de ordem”: o que um homem honesto deve a si mesmo? E aos seus semelhantes e à sua terra natal? Elas desapareceram em 1858 e reapareceram no final do século XIX.

O manuscrito Dumfries no 4 (1710) indica que o candidato entrava na Loja com “a corda no pescoço”. Para a pergunta que seu mestre lhe fazia, respondia: “para enforcar-me se eu trair meu juramento”. Esta é a primeira menção de tal símbolo vinda de uma “Loja” de aceitos. Apenas em 1760 foi retomado, e apenas na Inglaterra. Não aparece em qualquer das gravuras da série das “Réceptions“, de 1745, nem nas do ” Recueil précieux ” (edição de 1787), já citado, nem no quadro de Maler, de 1786, Réception dans une Loge de Vienne en Autriche, do acervo do Kuntshistoriches Museum de Viena, Áustria.

A recepção prosseguia com as viagens. De acordo com Prichard (1730) havia apenas uma, feita desde a entrada, no sentido dos ponteiros do relógio, e que terminava com três passos diante do Mestre da Loja para a realização do juramento. Na França, a “Réception d’un Frey-Maçon” informa três “em torno da área marcada no chão, onde estão desenhados a lápis um grande J e um grande B”, prenunciando o painel da Loja que seria estabelecido definitivamente entre 1740 e 1745. Sua decoração variava em função do grau, assim como a disposição dos símbolos (o esquadro e o compasso, em particular, encontraram o seu lugar definitivo durante o século XIX), mas igualmente de acordo com os autores. É por isso que, para o aprendiz, temos “um painel da Loja de aprendiz, em seguida o verdadeiro painel …, depois o painel de verdade”, etc. cada qual superando o anterior. A intromissão hermética é muito clara, e a obra de Lenglet Dufresnoy, Histoire de la philosophie hermétique, em três grandes volumes publicados em 1742, desempenhou um papel considerável na criação e evolução do pensamento esotérico em gestação. Provavelmente se deve a ele a confirmação do caráter cósmico do que viria a se tornar o Templo Maçônico, com a presença do sol, da lua, da abóbada estrelada, da estrela flamejante, e a introdução de circunvoluções de acordo com as formas desta última. Surpreende, por isso, que nenhum dentre os catecismos, tão prolixos em suas explicações, fale sobre o sentido das viagens impostas ao candidato. Mas se não o faz, é porque sem dúvida este sentido não existia!

É apenas na década de 1780 que eles informam que a primeira viagem “… é feita em câmaras subterrâneas; a segunda, nas galerias superiores; a terceira, ao redor do templo”, mas não há qualquer explicação do por quê. E só em 1832 elas foram relacionadas às três fases da vida, através do Ir\ Vassal, dignitário do Grande Oriente, interpretação que se manteve.

Foi também por volta de 1780 que os três elementos, água, ar e fogo, foram associados às viagens. O processo de dramatização vindo dos altos graus as transforma de provas simbólicas e purificadoras em testes reais, imitando as antigas iniciações que o trabalho do abade Robin, já citado, popularizou. Isso foi feito sem ordem ou diretrizes. Nada está estabilizado: as variações de um ritual para outro são inúmeras e as vagas explicações que acompanham as viagens revelam a indigência de um pensamento que se pretende iniciático, mas que ainda não está firmemente estabelecido. O sentido moral prevalece, e o objetivo buscado e admitido é intimidar o candidato, talvez para verificar a firmeza de seu caráter. Ainda que o breve contato com as chamas da prova de fogo pudesse impressionar, a prova da água era inócua e que a do ar não passava de uma ameaça. O manuscrito do ritual do Loja Mãe escocesa de Marselha o explica assim:

“Senhor, você ainda tem (esta é a terceira viagem) que se submeter a uma prova, muito mais intensa e mais dolorosa que outras: é necessário que você viaje no ar. Você não tem medo de ser lançado na atmosfera aérea e não se dá conta das consequências fatais de uma queda à que você se expõe?”

“Tendo o Recipiendário dito que não, todos os irmãos pedem que seja poupado de uma viagem tão perigosa.” Havia a marcação do selo com um ferro quente, claro que um simulacro. A prova de sangue com o qual ele tinha que assinar seu juramento é tão assustadora para o candidato, aos olhos dos irmãos, que um destes, bem-intencionado e cheio de piedade, gritava “graça” no momento da preparação, que era concedida. Esta mesma prova viria se tornar a mistura de sangues, ainda praticada[18] hoje de uma forma simbólica. Havia o cálice da amargura cuja interpretação não traz nenhuma dificuldade. Veio da Alemanha, através do rito retificado praticado em 1755. A prova da Terra, vivenciada na câmara de reflexões, só aparece como tal no decorrer do século XIX. Tudo isso, completamente ignorado anteriormente, surgiu de repente na década imediatamente anterior à Revolução Francesa e se perpetua por trinta anos após a “retomada de 1794[19]”. O Grande Oriente tinha aprovado essas inovações e deu a elas deu um sentido exclusivamente moral, incluindo-as em seu ritual de 1786 e depois no Régulateur Maçonde 1801, mas sem abrir mão de sua natureza intimidatória.

“A primeira viagem deve ser a mais difícil. Deve ser feita devagar, muito lentamente, com uma caminhada muito irregular que deverá se utilizar da disposição do local para torná-la difícil, por obstáculos e dificuldades criados com esmero, mas sem o uso de qualquer meio que possa ferir ou molestar o recipiendário. Faz-se com que caminhe a passos lentos, às vezes um pouco mais rápido. Faz-se, de tempos em tempos, com que se abaixe como se fosse entrar em um subterrâneo, onde será levado a dar um passada larga como se fosse atravessar um fosso, e por último vai andar em ziguezague, de modo que não possa avaliar a natureza do terreno em que viaja. Durante esta viagem, lançar-se-á sobre ele granizo e trovões a fim de imprimir em sua alma uma sensação de medo.”

A explicação desta viagem: as vicissitudes da vida humana. Se até então a Maçonaria simbólica havia escapado da dramatização exagerada dos altos graus escoceses, parece que o convite para encher de dificuldades a recepção ao grau de aprendiz teve como resultado a junção do grotesco à tragicomédia.

Uma enciclopédia do início do século XIX reproduziu o artigoFranc-Maçonnerie l’admission d’un candidat. Dizia que, durante a primeira viagem, o candidato “…é conduzido à beira de uma armadilha que lhe dizem ser um precipício, no qual é convidado a saltar. Caso se recuse, é empurrado e cai da altura de vinte pés sobre dez lâminas de papelão a dois pés de altura uma da outra, que se arrebentam em sucessão, fazendo um barulho terrível. Na parte de trás se encontram os colchões que o receberão.”

A cena do perjúrio merece ser incluída na antologia das cerimônias escocesas de antes da Revolução:

“Uma mesa, no meio da qual fazemos um buraco redondo, é colocada em um canto da Loja. É coberta com um manto que vai até o chão. Um irmão, geralmente o mais pálido, é colocado debaixo da mesa, se ajoelha e coloca a cabeça pelo buraco que é tapado por um prato de estanho cujo fundo foi removido e a cabeça é envolta em um pano tingido de tinta cor de sangue, produzindo a ilusão de uma decapitação”. Segue a descrição da cena em que a venda do recipiendário é removida, com os comentários de costume e a conclusão do redator “essa prova terrível causa grande impacto”. Grande parte dos fatos descritos pode parecer suspeita, embora seja retirada de uma famosa enciclopédia. São estas descrições e outras da mesma ordem que permitiram a P. Méjanel, de modo realista, ilustrar as obras do famoso Léo Taxil contra a Maçonaria. E como não mencionar a história surpreendente que consta da monografia de uma Loja de Paris, ativa ainda hoje, publicada em 1830 e disponível na Biblioteca Nacional, que diz que durante uma iniciação entre os anos 1806 e 1810, o candidato foi convidado a decapitar um cadáver real, trazido para o Templo com essa finalidade. Houve um escândalo …

Sem querer pôr em dúvida a realidade dos fatos apresentados, seria imprudente generalizar estes poucos e raros episódios cuja execução, além de tudo, trazia problemas materiais difíceis de resolver. Jogo duvidoso, um pouco perverso, bem próprio de uma época em que os heróis eram comuns, ou simplesmente desejo de impressionar os espíritos para valorizar uma pseudo-iniciação de misticismo ambíguo, com a qual os atores identificavam-se inconscientemente?

Mais reservado e fiel às instruções do Grande Oriente, a Loja Isis Montyon, do Oriente de Paris, especialista em iniciações extravagantes, inventou a “prancha de bolas[20]” e a introduziu com a balança, em 1810, nas recepções de aprendiz!

A prestação do juramento, tornada obrigação no século anterior, era acompanhada de ameaças terríveis em caso de perjúrio. Elas eram obra dos especulativos, pois os operativos jamais as fizeram. Os manuscritos de 1696 a 1710 indicam que havia penalidades na obrigação de aprendizes registrados, mas não dão sua natureza e se há “a corda no pescoço” citada no manuscrito Dumfries no 4 (1710), pois parece que ela era apenas um símbolo.

A língua e o coração arrancados, a cabeça decepada de Prichard (1730), e os funerais impostos entre a maré baixa e a maré alta, eram as penas infringidas nos séculos XVI e XVII por crime de traição e até apareciam no código penal britânico da época; a França, que as recebeu, preservou-as até perto de 1780. Não há exemplos de que tiveram de ser aplicadas.

Na Inglaterra, desde o início do século o juramento era prestado sobre a Bíblia. Entre 1727 e 1730, o candidato segurava um malhete na mão direita e uma espátula (trolha) na mão esquerda. Na França, o faziam sobre a Bíblia, mais frequentemente sobre os Evangelhos ou o Evangelho de São João, perante Deus, segundo o “Recueil Précieux (1782)”, geralmente diante do Grande Arquiteto do Universo, que permanecerá Deus por um longo tempo antes de ser considerado um símbolo. Em 1786, o Grande Oriente adiciona em seguida ao Grande Arquiteto, os termos “…sobre os Estatutos da Ordem e sobre esta espada, símbolo de honra.”

A cerimônia de juramento e consagração que se seguia sofreu muitas variações. Em atitude solene os assistentes ficavam todos de pé, de espada na mão. Dois oficiais conduziam o neófito, sempre com os olhos vendados, ante a mesa do Venerável (não diziam altar ou plano). Ele ficava em pé, com joelho direito apoiado em uma almofada sobre a qual era colocado um esquadro. Com a mão esquerda, segurava um compasso aberto com as pontas sobre sobre o peito esquerdo, a mão direita apoiada no “Livro” e às vezes levantada para o céu. Em seguida, repetia a fórmula que lhe era transmitida pelo Venerável.

Ao longo de todo o século XVIII, o juramento era prestado nos três graus. Era, por vezes, embora raramente, feito apoiando-se os dois joelhos sobre a almofada, às vezes variando: joelho esquerdo, aprendiz, joelho direito, companheiro, ambos os joelhos, mestre ou mesmo aprendiz; esta diversidade durou na Inglaterra até 1814. Às vezes as mãos do recipiendário eram colocadas sobre o “Livro” enquanto o venerável mantinha um compasso sobre seu peito. A cena de perjúrio foi uma invenção do século XIX. Não parece ter sido praticado em todo o século XVIII, e a renovação do juramento era feita após a queda da venda (Régulateur Mason, 1801). Isto acontecia depois que o candidato era reconduzido ao Ocidente. A seu pedido, e ao golpe do malhete, lhe era dada a luz. O momento podia ser impressionante. Alguns irmãos “portando tochas com mechas embebidas em álcool de vinho, no corpo das quais havia sido colocado pó de licopódio. Ao serem agitadas, o pó se espalhava, inflamando o álcool que queimava e produzindo uma chama muito alta de luz muito brilhante.” O neófito, então, se dava conta de que todos os maçons ali reunidos estavam apontando suas espadas contra ele. Depois de uma pausa, o Venerável tranquilizava o novo aprendiz, dizendo que essa atitude deles doravante lhe garantiria ajuda em caso de necessidade.

Os demais regressavam às suas colunas, e de pé e com a espada na mão, o Mestre da Loja procedia à consagração. Esta era feita, de acordo com a época, o lugar e a Loja, pelo malhete, depois pela espada, pelo malhete e a espada e, às vezes, pelo malhete e pelo compasso. Uma vez o neófito em pé, ou em pé com um joelho sobre a almofada e o esquadro que havia sido usado para a Obrigação, o Venerável o constituía aprendiz maçom, “para a glória do Grande Arquiteto do Universo”, de acordo com uma fórmula um pouco semelhante à usada hoje, confirmando em seguida sua admissão na Ordem ao aplicar-lhe na cabeça pequenos golpes de malho ou espada por três ou três vezes três vezes. Após um abraço, era-lhe entregue o avental e as luvas. Naquela época e ao longo do século XVIII, a abeta do avental de aprendiz ficava para dentro, invisível. A dos companheiros, às vezes adornadas com os utensílios, ficavam levantadas e abotoadas a fim de se manterem assim, e as dos mestres, abaixadas. Até o colar do mestre fazer sua entrada em loja nos anos 1775, só a posição da abeta permitia identificar o grau de um irmão. Na Idade Média, o uso de luvas estava associado a cerimônias religiosas e militares.

Entre os operativos, o empregador oferecia um par ao “aprendiz registrado” quando de sua recepção, sem que haja qualquer explicação sobre isso. O “The Maçon’s examination“, de 1723, indica que o recém-admitido recebe dois pares de luvas brancas, um “para ele e um para uma mulher”, sem mais comentários. Prichard (1730), nada menciona a respeito. Mas Hérault, naRéception d’un frey-maçon (1737) acrescenta “…o segundo par é para a mulher que ele mais considera.” Em 1760, ao entregá-las, o Venerável dizia: “Um pedreiro jamais deve mergulhar suas mãos na iniquidade” e, em 1786, orientava ” as luvas, por sua brancura, vos lembra da candura que sempre deve reinar na alma de um homem honesto, e da pureza de nossas ações “. Quanto à mulher “…nós rendemos homenagem às suas virtudes.” E Goethe mostrava que o grande valor deste presente residia no fato de “…que um pedreiro poderia fazê-lo apenas uma vez em toda a sua vida “. Tendo o costume se tornado tradição, a oferta de luvas continua até hoje.

Em seguida, vinha o convite para o reconhecimento do novo aprendiz, a comunicação dos sinais, da postura, da marcha, das palavras. A primeira era manifestada pela bateria e pela aclamação vivat, vivat, et semper vivat, substituída em meados do século por Huzzé nas lojas escocesas. Na Inglaterra, os trabalhos eram interrompidos, fazia-se um brinde no local, ao novo irmão, e retomavam-se os trabalhos. Na França, instituiu-se um costume de fazer com que o(s) recém-chegado(s) oferecesse(m) um banquete após a recepção; os abusos foram tantos que acabaram desistindo dessa prática.

A origem dos sinais maçônicos permanece misteriosa e sua introdução na maçonaria especulativa é desconhecida. O reconhecimento dos maçons operativos residia na “palavra do maçom” e nada indica que houvesse um gesto que a acompanhasse. É quase impossível considerar o “sinal de ordem”, conhecido aqui e ali na estatuária medieval, como sendo a indicação da existência de tradição “maçônica” entre os talhadores de pedra. Ou então, deveria ter-se em conta a descrição precisa dada por Philo de Alexandria em “A Vida Contemplativa” e Flávio Josefo em seu “Antiguidades Judaicas“, no primeiro século de nossa era. Não podemos sequer considerá-la, a exemplo do sinal de sofrimento do Mestre, quase universal, como um tipo de arquétipo da espécie humana.

Os passos e a marcha são relatados em textos antigos de 1724, 1725, 1729 e 1730, mas sem a sua descrição. Em 1737, o registro do julgamento de Coustos, em Lisboa, indica que se entra na loja com três passos, não descritos. Só em 1745, na França e na Alemanha, é que, ao ficar em pé, é dito que os pés deveriam estar unidos calcanhar contra calcanhar e que cada passo era feito em esquadro, e o “Sceau Rompu[21]“, que traz esses detalhes, acrescenta que a marcha do Mestre consistia de três passos em ziguezague. O “L’Anti-Maçon” (1748) mostra, em um diagrama, três passos para cada uma das marchas, pés em esquadro, mas claramente separados, em uma linha reta para o aprendiz, em ziguezague para os dois outros graus, com a diferença de que, na marcha de Mestre, durante o 2º e 3º passos um dos pés não encostava no chão, um ponto a que voltaremos ao falar na recepção de mestre. Na verdade, não havia uma regra fixa e a confusão vai durar até depois de 1800. Em 1760, o “The Three Distinct Knocks“, expondo a prática dos “Antigos”, indicava um passo para os aprendizes, dois para os companheiros e três para os mestres, sem especificar como eles deveriam fazê-lo. Confirmava, assim, o protesto de Laurence Dermott, que em “Ahimon Rezon” mostrava-se indignado com o fato de que os modernos teriam mudado a marcha, o que, a se tomar como verdade o “Jakin and Boaz“, de 1762, que, sempre em nome dos “Antigos”, definia, em ordem crescente de grau, 1, 2 e 2 passos. Além disso, nos anos que se seguiram tivemos 1 + 2 + 3 ou 3, 5 e 8 ou 12 + 3, etc. etc. Nunca houve qualquer explicação sobre um possível sentido da marcha dos maçons …

Vimos a origem de “palavras”, descendentes ilegítimas do misterioso ” Mason’s Word ” dos operativos, tiradas da Bíblia presumivelmente na primeira década do século XVIII. As atribuídas aos três graus simbólicos não sofreram as vicissitudes dos outros componentes da Ordem Maçônica. A inversão das colunas e, portanto, dos vocábulos que as designam, tornada necessária por razões de segurança, foi apenas um episódio menor, e certamente não valem o barulho feito a respeito pelos “Escoceses”. No máximo, podemos dizer que algumas Lojas inglesas escolheram a palavra “mahabone” para o terceiro grau ao invés do termo que usamos atualmente. E é preciso lembrar que o Grande Oriente criou a palavra semestral em 23 de outubro de 1773.

Quando é que os aprendizes maçons passaram a ter três anos e por quê? Todos os catecismos até 1750 dizem “menos de sete anos” assim como os companheiros também menos de sete anos, porque entre os operativos era o tempo que se levava para passar de aprendiz a companheiro-obreiro, ou companheiro-mestre, tendo este último, consequentemente, “sete anos e mais”. Um documento de 24 de junho de 1765 fez uso de uma fórmula usada repetidamente até hoje, “P\L\N\N\Q\S\C\[22]” para os números que nos são conhecidos. De essência pitagórica, vinda, por meio do forte hermetismo em voga naquela época, mascarava, sob um aspecto misterioso que lhe conferia importância, uma ignorância que parece não ter desaparecido.

Costumava-se acolher o novo irmão com algumas breves palavras de boas-vindas, com o que se encerrava a recepção. Ela era seguida pelo banquete já mencionado, chamado ” Loja de Mesa”, que merece um estudo especial profundo.

Até 1730 havia praticamente só dois graus, e a recepção do segundo consistia de uma obrigação, da comunicação de um sinal não descrito, de uma palavra até hoje secreta e dos cinco pontos do companheiro. Documentos anteriores a 1727, como oManuscrito Edinburgh Register House, de 1696, o Manuscrito Trinity College de Dublin, de 1711, o The Mason’s examination, de 1723 e o Manuscrito Graham, de 1726, explicam muito bem o cerimonial de passagem do grau de aprendiz para o de companheiro, assim como aqueles publicados até 1750, depois de Prichard (1730), sobre a contribuição simbólica ocorrida a partir dessa data. Além do próprio episódio do assassinato de Hiram, é fato que o terceiro grau foi estabelecido por sucessivas divisões dos dois primeiros, apropriando-se, em particular, dos principais elementos do grau de companheiro. Alguns deles voltaram mais tarde para a sua fonte original.

O aspirante a companheiro tinha de ser instruído nos “Mistérios” da Maçonaria. Assim, ele era interrogado, por um lado, sobre as circunstâncias da sua admissão, sobre o cerimonial usado e o porquê dele, e, por outro, sobre aquilo que havia aprendido.

As perguntas e respostas eram breves. Na verdade, recitavam “de memória” o catecismo sem pararem para pensar, num rigoroso exercício de memorização. Há os 90 pontos de Prichard relativos à orientação, à aparência e ao mobiliário da Loja, ao papel de seus oficiais, ao “segredo”, à linguagem corporal. Este texto revelador é precioso e podemos aprender com ele, guardando dele somente isto: “Que o fundamento desta câmara sejam três colunas ou pilares, força, sabedoria e beleza”, que o teto “seja um céu de nuvens embelezado por cores de todos os tipos”, que o pavimento” seja decorado com obras de mosaico”, “que no centro haja um cometa (a estrela flamejante)” e que “ao redor da Câmara haja um forro com um brocado de ouro que constitua a cerca ao seu redor “. Todos estes elementos, além de alguns utensílios, foram incluídos no painel da Loja. Além disso, dizia “que o ponto Je, ou ponto central, impeça qualquer erro do mestre ao fazer a circunferência, a linha um comprimento sem largura, a superfície um comprimento com uma largura e que um corpo compacto (volume) envolva tudo”.

Há também enigmas. Assim, o mestre está “vestido com uma jaqueta amarela e calças azuis” (empunha um compasso, que na época era o seu atributo), e os segredos estão escondidos “no peito esquerdo (do maçom), a “chave” que permite o acesso está fechada em uma “caixa de osso osso[23]“, a qual “se abre e que não se fecha a não ser com uma chave de marfim” pendurada e amarrada “a uma correia de seis polegadas[24]“. Solução do enigma: a boca, o palato e os dentes, e se o idioma é a chave de marfim (?) o que se chama de “guardiã do palavreado” são as palavras.

Um aprendiz não pode passar a companheiro sem haver “servido a seu mestre”, o que ele faz “com cal, carvão vegetal e uma pá”, significando respectivamente “liberdade, seriedade e zelo” (tradução da edição de 1743) ou “com giz, carvão vegetal e o recipiente de preparar argamassa” ou “Liberdade, fervor e zelo” (1788). Esta interpretação livre dos símbolos, expressão de um humor muito britânico neste caso, não haveria de satisfazer tanto o abade Perau, cujo aprendiz em “Trahi“, de 1742, tinha trabalhado com “cal, pá e tijolo”, ou seja,” liberdade, confiança e zelo “, porque ele pensava adicionar, em uma nota:

“É preciso que o maçom sinta a precisão destes emblemas.” No entanto, a se acreditar no prefácio do livro de um de seus concorrentes na literatura maçônica, ele tinha sido “iniciado” de autoridade, e para aquela ocasião o termo “iniciado” é adequado, porque havia se feito introduzir indevidamente em uma loja e, descoberto, havia sido antecipadamente “colocado sob uma goteira ou (sob uma bica de calha durante uma chuva forte) para que a água o penetre da cabeça aos pés e encharque os seus sapatos” punição reservada para curiosos e formulada nos catecismos.

Se bem que “nem nu, nem vestido,” sem a venda e a corda no pescoço, ainda estejam em vigor no rito de emulação, nem os textos nem a iconografia existente sugerem que tenha sido assim durante a maior parte do século XVIII. Deve ter sido um presente dos “Antigos” para os “Modernos” da segunda metade do século, confirmado na fusão de 1813. Na França, e bem depois, alguns poucos rituais escoceses o adotaram. O aspirante tinha provado que havia sido instruído nos mistérios maçônicos, aprendido que se tornara companheiro “por causa da letra G” ou “pelo amor da letra G”, e reiterava, da mesma forma que antes, o juramento proferido em sua admissão ao grau de aprendiz.

Não parece que tenha havido qualquer viagem durante a recepção ao segundo grau, a menos que se identifique como tal os cinco passos praticados pelo Rito de Emulation, que os traz do século XVIII. As mencionadas pelos catecismos não têm a característica da marcha bem específica do aprendiz, e parece puramente simbólica.

Você já viajou alguma vez?, pergunta o Grão-Mestre (que se tornará o Venerável)

Fiz viagem no Oriente e no Ocidente.

e, em outra versão “de Leste para o Oeste”.

Você alguma vez já trabalhou?

sim, para a construção do Templo.

Onde você recebeu o seu salário?

Na câmara do meio.

Como você pode entrar na câmara do meio?

Pelo pórtico,

ou “passando por uma antecâmara”.

O que você viu pelo caminho?

Dois grandes pilares …

E o candidato, em seguida, toma contato com os dois pilares de Salomão cujos nomes ele tinha aprendido sem saber a que aplicá-los, e as suas dimensões, conforme a descrição dada pela Bíblia (Reis I. cap. 7).

Como você chegou na câmara do meio?

Por uma escada oculta em caracol,

ou “por uma escada oculta em espiral de lance duplo.”

Quantos degraus naquela escada?

Sete ou mais …

“… porque sete ou mais compõem um colégio perfeito, ou fazem uma loja justa e perfeito”.

Sinal, palavra e toque são necessários para franquear a porta, muito alta, da câmara do meio, onde ele vê “algo parecido com a letra G”.

O que significa este G?

Geometria ou a ciência.

ele tinha dito no início do catecismo. Mas esta questão não era pertinente nem poderia receber outra resposta. Prichard, ou os autores dos textos, talvez tomados de remorso ou pela inquietude de eliminar Deus, o que, em uma época em que os poderes estavam sob a tutela das igrejas, era um perigo considerável, acrescentou um pouco mais tarde, à mesma pergunta:

“O Grande Arquiteto da roda do mundo, ou aquele que foi enviado sobre o topo do Templo” (tradução, palavra por palavra, da edição de 1743).

ou “o Grande Organizador do Universo, que foi colocado no ponto mais alto do Templo” (tradução da edição de 1788)

Duas frases que merecem uma análise …

A letra G estava traçada no centro da câmara do meio. Em 1740, duas gravuras no “Dialogue between Simon and Philip” a representam. Uma, fechada em um contorno “de diamantes”; a outra, no meio de um sol radiante que não pode ser confundido com a Estrela Flamejante, que também pertencia à panóplia[25]do grau de aprendiz. Todas duas fizeram sua primeira aparição, em 1726, em uma etiqueta que anunciava uma série de palestras sob o título de “The Antidiluvian Masonry“, criadas a dar o significado da letra G, da Estrela Flamejante etc., inovações introduzidas por Desaguliers e outros, e para se levantar contra a indignidade que constituía o fato de excluir o quadro de Loja com vassoura e balde ao final da reunião.

A aparente simplicidade do significado da letra G, geometria, Grande Arquiteto (God) faz esquecer ela que é a terceira letra do alfabeto hebraico, o número 3 em si, o da trindade divina, e que está, portanto, ligada ao simbolismo Cabalista. Desde a sua origem ela é o único elemento estável do segundo grau e ainda mantém os seus dois sentidos primitivos. A eles juntamos outros: um catecismo manuscrito anterior a 1750 a define como: “glória, grandeza, geometria, a 5a ciência, ” glória ao grande arquiteto, grandeza para o mestre da Loja, geometria para os irmãos”. Contrariando isso, outro manuscrito que data da década de 1780 cita somente a geometria e elimina o Grande Arquiteto. Um acidente, sem dúvida, porque o ritual do Grande Oriente, de 1786, reimpresso no Régulateur Maçon, em 1801, depois no Régulateur Symbolique, de 1839, diz que “ela é o monograma de um dos nomes do Altíssimo, fonte de toda luz e de toda ciência.”

Quando a Estrela Flamejante foi associada com a letra G? Uma menção em 1726, uma segunda que a inclui na mobília da Loja de aprendiz, em 1730, uma terceira no “Dialogue between Simon and Philip“, em 1740, que atribuem sua paternidade a Desaguliers e seus amigos – o que deve ser verdade – e sem qualquer significado especial. Ela parece ter seguido o caminho da abóbada estrelada, surgida em 1711. Mas os Reis Magos ficaram muito tempo vagando na estrada, como diz o “Trahi“, edição de 1767. Em ambos os painéis, de aprendiz e companheiro, mostrados no primeiro “tal como foi publicado em Paris, mas impreciso”, aparece a letra G na estrela que arde, e, no segundo, “o verdadeiro plano de recepção”, a estrela sempre flamejante sobre uma esfera ao pé da qual está a letra G. No “Les Francs-Maçons Écrasés“, de Larudan (1778), nos painéis de aprendiz e companheiro, a estrela arde, sem a letra, aparece sem chamas no painel do Mestre, e o G não aparece em nenhum dos três. “A estrela misteriosa” – ela permaneceu – havia adquirido notoriedade durante o período de separação dos dois graus, companheiro e mestre, e da estabilização de seus respectivos rituais, por volta de 1760. Ela foi confirmada desde o momento em que a tradição hebraica penetrou na maçonaria e introduziu o iod no seu centro, o que a tornou divina. O Grande Oriente a consagra definitivamente entre 1773 e 1786, quando estabeleceu o chamado rito “francês”.

Em meio à comunicação ao novo companheiro dos sinais e toques, devemos prestar uma atenção especial aos “5 pontos do maçom” que passaram a ser chamados depois de 5 pontos do mestre. Em 1730, Prichard os incorpora a este grau.

“Como Hiram foi elevado?

Como todos os maçons quando recebem a palavra de mestre.

“Como assim?

Pelos 5 pontos da confraria.

“Quais são eles?”

Mão contra mão 1, pé contra pé 2, bochecha contra bochecha 3, joelho contra joelho, 4 e mão no dorso 5.

Note-se que não são os gestos feitos para levantar o corpo de Hiram que criam os 5 pontos, mas que são eles, os da “confraria”, que lhes dão essa finalidade, já que parece que eles existiam antes do assassinato do mestre. Isso é comprovado por seis textos entre 1696 e 1727, isto é, muito antes do episódio de Hiram tornar-se parte da maçonaria especulativa.

A primeira descrição do sinal data de 1696, no Manuscrito “Edinburgh Register House” quando da recepção do segundo grau, nos dias em que havia apenas dois. Perguntado sobre quantos pontos tem o Maçom, o recipiendário respondia:

“5, quais sejam, pé contra pé, joelho contra joelho, coração contra coração, mão contra mão, orelha contra a orelha”.

Existem variações, tanto na forma como eram praticados – manuscrito Sloane 3329 (de cerca de 1700), manuscrito Trinity College de Dublin (1711), “Mason’s Examination” (1723) (onde havia seis pontos: pé, joelho, mão, orelha, língua, coração), “The grand Mystery open” (1726) (pé, joelho, peito, a mão apoiando as costas, testa, bochecha) – quanto na ordem em que eles ocorrem. O “The Mason’s confession“, refere-se a uma Loja na Escócia, em 1727, que começa com “mão contra mão,” e o manuscrito Graham (1726) traz (pé, joelho, peito, bochecha, mão).

Nenhum documento, manuscrito ou impresso, fornece qualquer explicação, nem sobre a origem nem sobre o significado a ser dado a este gesto, que, para dizer o mínimo, é incomum. Em 1760, o “The Three Distinct Knocks” trará o significado do primeiro ponto, o que não resolverá o problema puramente simbólico e moral de cada um dos pontos. O mundo operativo os desconhecia: materialmente, não podia ser um sinal de reconhecimento e nas Lojas não havia esoterismo. Agora são os “aceitos”, que, no final do século XVIII e início do XVII, relatam os pontos do maçom e é possível que a sua presença seja anterior a 1696. Porque, em sua maior parte, os “aceitos” eram pessoas educadas, muitas vezes eruditas, que tinham a Bíblia como a base de sua cultura. Relatamos aqui dois casos de ressurreições ocorridas através de um contato muito próximo entre os mortos e os vivos que estavam unidos contra eles a fim de trazê-los de volta à vida. Dois profetas do século IX a.C. ressuscitaram pessoas assim. Um foi Elias, que ressuscitou uma viúva que o acolhera com fome; outro, foi Eliseu, seu sucessor, era filho de uma mulher de Sunam. A história do milagre é explícita. (Livro IV Reis, 34 e 35). “Ele subiu na cama, pegou a criança e colocou sua boca sobre a boca dela, os olhos sobre os olhos dela e suas mãos sobre as mãos dela. E deitou-se sobre ela e a carne da criança se aqueceu. E ele tornou a subir na cama e se deitou sobre a criança e a criança bocejou sete vezes e abriu os olhos. ”

As razões para a incorporação, em uma recepção maçônica, de processos “mágicos”, poderão fazer com que um evento tão miraculoso permaneça obscuro e até mesmo misterioso. Pelo menos 35 anos antes da lenda de Hiram surgir, eles fornecem uma justificativa plausível para o cenário do desenrolar do funeral de seus heróis. O estado de decomposição do corpo, descoberto vários dias após o assassinato, certamente não contribui para uma manobra “pé contra pé, peito contra peito, bochecha contra bochecha”, que tenha em vista levantá-lo. Mas, se esta operação tinha a intenção de trazer o mestre de obras de volta à vida, e, assim, recuperar o segredo que ele tinha levado para a sepultura, os “cinco pontos do maçom”, recuperam um sentido e uma lógica que se fazia muito necessária. É pouco provável que o companheiro, e depois o mestre que os herdou, estivessem cientes de seu conteúdo. É o destino dos símbolos atravessar os séculos ignorados, alvos da incompreensão, incoerência e, então, um dia, ressurgir do esquecimento e encontrar a sua luz.

Detalhes sobre a entrada do número 5 no grau de companheiro? A resposta é difícil. Os documentos manuscritos da ritualística não são datados e são bastante raros até os anos 1770. As revelações impressas de Prichard, Perau, Larudan, aos quais se juntam os ingleses, são publicadas a partir de 1760. O “cinco” não aparece em parte alguma antes de 1750. A estrela com cinco pontas, comprometida devido ao seu nascimento ilegítimo, não desempenhou nenhum papel até que a contribuição do hermetismo, das doutrinas conjuntas dos pitagóricos e cabalistas lhe permitiram fazer carreira. Aparecia na idade, nas viagens, nos passos e nos degraus do altar, embora para o Régulateur du Maçon as menções a ela fossem sete. Tudo praticamente foi estabilizado em 1786, com o ritual do Grande Oriente. As ferramentas que acompanhavam as viagens migraram um para o outro por opção das Lojas, mas os comentários que suscitavam, onde a moral teria um lugar de destaque, não ficou sem valor. Um ritual da Loja Mãe Escocesa de Marselha, posterior a 1770, fez executar as cinco viagens sem ferramentas ou explicações, mas colocou os companheiros dispostos em cadeia, cada um com a mão direita sobre o ombro esquerdo do anterior e fez com que batessem na pedra cúbica um após o outro. A cada uma das batidas, havia uma parada diante da estrela flamejante e comentários. Na Inglaterra, ciências e artes liberais fazem uma tímida aparição nos catecismos de aprendiz do “Three Distinct Knocks” (1760) e do “Jakin and Boaz” (1762), e, em seguida, são passados para o segundo grau, em 1769. Em 1775, William Preston, em “Illustration of Masonry“, acrescenta muitas explicações. A França vai recebê-las apenas no início do século XIX, assim como os sentidos que terão lugar importante durante as viagens, incorporando-os.

Embora se saiba de fonte segura que o primeiro grau da maçonaria operativa apareceu no início do século X, e o segundo, nos primeiros anos do século XVI, não podemos definir com precisão quando nasceu o grau de mestre. A primeira menção a ele remonta a 12 de maio de 1725. Naquela data, uma sociedade paramaçônica, a Philo Musicae Architecturæ Societas Apollini, elevava vários maçons ao terceiro grau. Ela havia sido criada em fevereiro 1725 por oito irmãos, amantes da música e da arquitetura. Seus regulamentos obrigavam todos os membros a serem maçons, o que levava os profanos que eram admitidos a serem recebidos na maçonaria quando de sua entrada na Sociedade. Este procedimento irregular levou a um protesto, que não foi considerado, da Grande Loja da Inglaterra. A Philo Musicædesapareceu em 1727. A segunda menção de uma elevação ao terceiro grau aconteceu em 25 março de 1726, na Loja “Dumbarton Kilwining no 18″, da Escócia, fundada em 29 de janeiro daquele ano, seguida, em 27 dezembro de 1728, pela Loja “Greenock Kilwining no 12″, que, naquela ocasião, introduziu a cobrança de taxas para a elevação nos dois graus. O sistema de três graus se propagou lentamente: a Loja “Antiquity no 2″, criada em 1717, o adotou em abril de 1737, e a Loja “Dundee no 18 “, fundado em 1728, apenas em 1748. Talvez existissem na Escócia no final do século XVII e na Inglaterra nos primeiros anos do século XVIII, a julgar pelo que sugerem, de um lado, o manuscrito Sloane 3329, e, de outro, a Philo Musicæ… – cujos fundadores pertenciam à Loja no 14 que se reunia na Head Tavern, situada naGreat Queen’s Street – que, pelo menos em 1724, fazia uso desta prática. O manuscrito Trinity College Dublin, de 1711, comprova que ela era conhecida, se é que já não estava em vigor, na Irlanda, naquele ano, e seu catecismo trazia “os segredos próprios de cada grau”. O “The Mason’s examination“, de 1723, faz uma breve alusão ao aprendiz, ao companheiro e ao mestre. O ponto a se destacar desta inovação, e que é de importância fundamental, é que em nenhum lugar aparece a lenda de Hiram.

A primeira versão conhecida dela surgiu em 1730, por meio de Prichard, em seu “A Maçonaria Dissecada” e somente no catecismo, através de perguntas e respostas. A segunda foi publicada na França, em 1740, sob a assinatura de Leonardo Gabanon, pseudônimo de Louis Travenol, em um livro intituladoLe Catéchisme des Francs-Maçons, precedido por um resumo da história de Adoniram, arquiteto do Templo de Salomão”, várias vezes reproduzido. Ele acrescentava, sob a forma de narrativa, muitos detalhes não incluídos no questionário de Prichard. Então, em 1742, surgiu “L’Ordre des Francs-Maçons trahi“, do abade Perau, que desavergonhadamente “pirateia” seu antecessor e, como seria de se esperar, não poderia fazer nada muito melhor a não ser embelezar a história com alguns incidentes muito importantes, procedimento este que se perpetua nas sucessivas edições e que enfureceu os “escoceses”, nascidos naquele tempo. Assim, a partir de 1745, se estabelece, ilustrada pela iconografia, a dramatização de um catecismo que se tornou ritual através da adoção de um cenário que revive o assassinato lendário do arquiteto do Templo de Salomão.

Mais conservadora, a Inglaterra ficou próxima de Prichard em termos de sobriedade. Ficou surpresa com a audácia e independência da maçonaria francesa, tanto que a segunda edição das Constituições de Anderson, em 1738, deu apenas uma importância relativa à lenda de Hiram. Os ingleses só a adotaram definitivamente por volta de 1760. Naquele mesmo ano, uma enésima revelação do “The Three Distinct Knocks” acrescentava novos elementos ao desenrolar das cerimônias e, com isso, aprendemos finalmente o nomes dos três assassinos do mestre arquiteto, numa investigação que durou 30 anos!

A origem da lenda é misteriosa. Onde? Quando? Como? Um manuscrito, o Graham (1726), esclarece ligeiramente sua aparição através de uma história aparentemente bíblica, mas para a qual não há correspondência no Antigo Testamento.

Os três filhos de Noé, convencidos de que seu pai, ao morrer, tinha levado com ele um segredo de grande importância, partiram em busca de seu túmulo, na esperança de encontrá-lo nas imediações. Combinaram que, caso não conseguissem, a primeira coisa que encontrariam seria “para eles, como um segredo” recebido do próprio Deus. A inconsistência de uma proposta para substituir um segredo de natureza desconhecida por algo não relacionado a ele, não parece ter abalado o espírito de nossos três personagens. Entretanto, uma vez o túmulo aberto e encontrado o cadáver decomposto, eles pegam um dedo, que desliza, depois o punho e o cotovelo, e levantam o corpo “pelos cinco pontos dos maçons”. Um deles disse: “ainda há medula neste osso” (marrow in this bone), o segundo retrucou, “mas é um osso seco”, e o terceiro diz “ele cheira (fede)”. Com isso, decidiram dar o nome que é conhecido até hoje na Maçonaria”, ou seja, “marrow in the bone“. Foi a primeira vez que se revelou uma palavra de mestre.

Ela sofreu algumas alterações e tornou-se “magboe ad Boe” em “The Whole Institutions of free maçons opened as also their words and signs“, impresso por William Wilmot (1725), que declara explicitamente seu significado “a medula no osso, assim o nosso segredo é guardado”. Ele aparece como “marrow bone” no manuscrito Sloan 3329 e no manuscrito Trinity College Dublin(1711). Sendo assim, cinco anos antes da revelação de Prichard – e talvez ainda mais cedo – o grau de mestre em gestação oferecia a narrativa de um segredo perdido que se tentava trazer do além morte, por uma operação de comprovado caráter mágico, cujo significado e propósito escapava aos seus autores. Não parece que fosse anterior a 1700, embora os cinco pontos do maçom surgidos mais para o final do século XVII deixem supor uma tentativa de inovação nessa direção. A lenda de “Noé” teve algum impacto, porque Anderson, que a ignorara em 1723, a recupera em 1738 ao fazer dos maçons, tornados “filhos de Noé”, “verdadeiros noaquitas, seu primeiro nome de acordo com as velhas tradições”. Por volta de 1744, o grau do Real Arco inglês toma emprestado vários de seus elementos.

Como e por quem se efetua a passagem da lenda incompleta de Noé – incompleta porque lá não há assassinato – para a do Hiram assassinado por maus companheiros, aparecida em sua quase totalidade em 1730? É esta última novidade que atrai a forte reação contra Prichard, tratado como impostor pela Grande Loja da Inglaterra, que na época só praticava os dois graus, aprendiz e companheiro, com um cerimonial bem simples? Sua lenta introdução na liturgia maçônica certamente não favorecerá o estabelecimento de um ritual mais vigoroso que vá além da simples recitação do catecismo de 1730, o que durará até cerca de 1760.

Na França, a recepção de mestre, descrita pela primeira vez por Leonard Gabanon no “Catéchisme des Francs-Maçons“, em 1740, e retomada pelo abade Perau em “Trahi“, de 1742, mostra que a história de “Adonhiram” foi encenada desde a sua chegada no continente. O candidato a mestre era chamado a viver plenamente o drama do assassinato, que repetia em todos os detalhes. Sóbrio no começo, o cenário foi se complicando em seguida em função de detalhes e explicações diferentes uns dos outros. Tudo parece se estabilizar pouco antes da Revolução[26], e assim foi no primeiro quarto do século XIX.

“O recipiendário estava trajado como desejasse, mas sem espada, revestido do avental de Companheiro, com a abeta levantada e abotoada”. Depois de bater três vezes na porta da Câmara de Recepção, entrava a convite do primeiro-vigilante, acompanhado por um “aprendiz, companheiro e mestre que, neste caso, é chamado de Irmão Terrível.” Apenas os mestres são admitidos. “Na Câmara onde se dá a cerimônia é traçado o painel de mestre, que tem a forma de um caixão cercado por lágrimas, sobre o qual se coloca um ramo de acácia, e onde está escrito Jehova, que é a antiga palavra de mestre”. Ao pé do Oriente há um compasso aberto (que na época era o símbolo do Mestre da Loja), a oeste um crânio e dois ossos cruzados, um esquadro e os quatro pontos cardeais. “Ilumina-se este desenho com nove velas, três no Leste, três no Sul, e três no Oeste, e em torno se postam três irmãos, um no Setentrião, outro ao meio-dia e o terceiro no Oriente, que têm, cada um, um rolo de papel escondido sob suas roupas”. No “Trahi“, o crânio e os ossos ficam, respectivamente, em uma extremidade do desenho, e são adicionadas as ferramentas, e “à direita, uma montanha sobre a qual há um ramo de acácia”. Em algumas gravuras a montanha é representada por uma pequena pilha de pedras localizadas em um canto da Câmara, ao lado do Oriente. Um pouco mais tarde, o desenho do crânio é substituído por um crânio real iluminado por dentro por uma vela. “Diante do grande mestre da loja, chamado mui-respeitável, há um pequeno altar, o Evangelho e um pequeno malhete. Os dois vigilantes, chamados de Veneráveis, se colocam voltados para o Ocidente, de frente para o grande mestre, nos dois cantos o Loja, e os outros oficiais, indiferententemente, em volta da Loja com os outros irmãos. Há apenas um que está à porta, dentro da Loja, com uma espada desembainhada em cada mão, uma com a ponta para cima e a outra, apontando para baixo, que ele segura com a mão esquerda para dá-la ao primeiro vigilante”. Na hora da entrada do candidato é feito o sinal do mestre “… colocando a mão direita sobre a cabeça, com o dorso voltado para a testa, os quatro dedos estendidos e juntos, o polegar afastado, levando-a à boca do estômago”.

Queríamos tornar impressionante a introdução do recipiendário na Câmara de recepção. O primeiro vigilante abre violentamente a porta, aponta sua espada para ele, e ordena que ele segure a ponta e a mantenha sobre o seu peito direito. Segura-o com a mão esquerda, o faz realizar três vezes o percurso ao redor da Loja, saudando o Grande Mestre a cada passagem, saudação à qual se juntam todos os irmãos. Retornando ao Oriente, entre os dois vigilantes, o candidato é convidado a se aproximar do Mui Respeitável pela marcha de mestre, que agora lhe é ensinada pelo primeiro vigilante. Ela começa com o duplo esquadro – ou seja, calcanhares unidos, pontas dos pés unidas às duas pernas do esquadro desenhado no chão, em seguida três grandes passos em triângulo, o primeiro à direita, o segundo à esquerda cruzando o caixão, e o terceiro à direita na extremidade deste, com os dois pés juntos de modo a formar a dupla esquadro-compasso. Esta marcha, cujo significado não tem qualquer explicação, é chamada de “do esquadro ao compasso”. A cada passo o candidato recebe um golpe sobre os ombros dado por cada um dos três irmãos que transportam os rolos de papel. Depois disso, ele renova os votos feitos anteriormente, o Grande Mestre dá três pequenas pancadas de malhete em sua testa e, imediatamente após o terceiro, “…os dois vigilantes que o seguram jogam-no para trás, estendido sob a forma do caixão, enquanto outro irmão vem e coloca sobre seu rosto o que parece ser um pano manchado de sangue em vários lugares”. Os irmãos sacam suas espadas, apontam-nas para o corpo do recipiendário (que não pode ver), mantendo esta atitude por um momento, após o que embainham as espadas. Em seguida, vem a cena do levantamento minuciosamente descrita. “O Grande Mestre se aproxima do recipiendário, toma-o pelo dedo indicador da mão direita, apertando com o polegar a primeira junta[27], e, fingindo fazer um esforço para levantá-lo e deixando-o escapar voluntariamente ao sentir os dedos se soltando, e diz Jakim. A seguir, ele, da mesma forma, pega o segundo dedo, que deixa escapar como ao primeiro, e diz: Boz. Em seguida, o toma pelo pulso, apertando com os quatro dedos entreabertos de modo a se fecharem sobre a articulação do pulso, acima da palma da mão, seu polegar passado entre o polegar e o indicador do recipiendário, e então dá o toque de mestre. Mantendo a mão apertada, diz a ele que afaste a perna direita do corpo, e a dobre para que o pé possa se apoiar no chão, sobre o painel – isto é, o joelho e o pé ficam o mais perpendiculares possível. Ao mesmo tempo, o grande mestre aproxima sua perna direita da do recipiendário, de modo que o interior de um joelho toque o interior do joelho do outro, e, em seguida, lhe pede que passe sua mão esquerda sobre seu ombro. O Grande Mestre, inclinado, também passa a mão esquerda sobre o ombro do recipiendário, levanta-o e naquele momento lhe diz Macbenac, que é a palavra do Mestre”.

“Então lhe é tirado o pano de cima da cabeça, e conta-se de memória o que se fez em toda a cerimônia, instruindo-o nos principais mistérios e nas obrigações da maestria mediante as quais será reconhecido entre os maçons como um irmão que já passou por todos os graus da Maçonaria, e não tem nada a desejar além de aprender perfeitamente o catecismo a seguir” (Catéchisme des Francs-Maçons, de 1740).

Como foi feita a transição do simples conto de Prichard para o cenário dramático da morte de Hiram, que termina com seu sepultamento? E qual o sentido a ser dado a este último uma vez que nada vem depois dos funerais ordenados por Salomão? Esta história não poderia permanecer inacabada e então prosseguiu nos graus de vingança do Escocismo, embora tenha sido deixada em suspenso no grau de mestre. Parece que ao longo da evolução da jovem maçonaria especulativa, não são estes os símbolos que aparecem como vetores de ideias, mas as ideias que buscam símbolos através dos quais se expressar. Este processo ao reverso do pensamento analógico, evidente no simbolismo das ferramentas, ocorre também para a lenda. Revela a necessidade inconsciente de dar a ela uma base mais sólida, mesmo carregada de mistério, que aquela de uma busca por um vago segredo perdido, como ilustram os trabalhos ocultistas e alquímicos.

Analisado do ponto de vista do nosso conhecimento atual, trata-se de um rito de morte e ressurreição no alvorecer de sua evolução, uma nova modalidade de um rito ancestral inerente a toda a espécie humana. Mas que, sem querer diminuir a inteligência de nossos antecessores, e apesar de, para alguns, ter uma abordagem semelhante à dos autores clássicos da antiguidade, seria capaz de introduzir tal interpretação nos emergentes rituais do que iria se tornar a Ordem Maçônica? Daí a pobreza, a inconsistência e a insegurança apresentadas pelas raras e breves explicações fornecidas pelos textos há mais de cem anos e que seria desnecessário levantar. Então mais uma vez, por que as lojas?

O século era todo voltado para o teatro, um modo mais adequado de expressão, mais acessível e menos cansativo do que o livro. O tema “A coisa perdida“, em seu contexto dramático, se prestava bem para uma fábula teatral e a oportunidade era uma boa demais para que se deixasse de explorá-la, apimentando o que era, para o segredo dos maçons e o banquete que se seguia, um espetáculo. O conjunto tinha um certo charme. E é assim que se desenvolverão uma sucessão de cenários que, gradualmente, se transformarão em rituais.

Cerimoniais divulgados pelas revelações, revelações que criam cerimoniais ou interação das duas coisas? Certamente ambas. Prichard deu a ideia geral do episódio de Hiram, Leonard Gabanon, o pano de fundo (1740), e o abade Perau completou a encenação do psicodrama em 1742. Gabriel Louis Calabre Perau, nascido em 1700, escritor prolífico, com quarenta livros até sua morte, em 31 de março de 1767. Escreveu, entre outros, 13 volumes da Vie des hommes illustres de d’Auvigny, publica várias edições de Bossuet, em 20 volumes, etc. Isso significa que era especialista no assunto. Ele o comprova, no “Trahi“, também publicado sob o título já usado por Gabanon, de “Le secret des Francs-Maçons“, que inunda o mundo maçônico entre 1742 a 1781. É claro que foi saqueado copiosamente com variações, traduzido para o inglês por J. Burd, em fevereiro 1760, sob o título de “A master Key to the Free Masonry“, o que permitiu com que o autor de “Three Distinct Knocks” lhe tomasse emprestado muitas coisas sem qualquer remorso.

A recepção de mestre de Perau traz duas importantes inovações. As três viagens subsistem (chegam, às vezes, a ser nove), mesmo que ainda se ignore porque são feitas. Durante a caminhada, ele descobre que um mestre está estendido sobre o caixão, o braço esquerdo ao longo do corpo, o direito dobrado sobre o peito, mão aberta sobre o coração, os dedos cerrados, o polegar em esquadro, e coberto pelo avental levado para este fim, com o rosto escondido por um pano manchado de sangue. Assiste ao erguimento deste irmão pelo Grande Mestre, de acordo com os cinco pontos do maçom. O recipiendário, em seguida, começava a marcha na mesma forma apresentada no catecismo de 1740. Um ritual posterior (1780) singularmente esclarece o sentido do cruzamento do caixão. Quando o companheiro entra na Câmara da Recepção, arrancam de repente seu avental, porque ele é suspeito de ser um dos assassinos de Hiram, do que ele se defende. É então convidado a passar sobre o corpo do mestre arquiteto a fim de provar que não é culpado. Estamos aqui na presença de uma provação durante a qual ele cairá morto caso esteja envolvido no crime. A cerimônia continua com a obrigação e, clérigo como é, o abade Perau destaca uma solenidade do juramento, cujo teor não havia sido negligenciado. O candidato ajoelhado, com as mãos sobre a Bíblia, a beija três vezes depois de repetir as punições que o ameaçam em caso de perjúrio. Em seguida, sob três golpes de malhete do Grande Mestre, ele é projetado sobre o caixão, seu avental é levantado sobre o peito, e a cabeça é coberta com o pano ensanguentado. Cercado de espadas, é levantado. É interrogado sobre o papel das ferramentas fictícias representadas pelos rolos de papel que serviram para dar os golpes nos seus ombros durante a marcha “do esquadro ao compasso”, enquanto o assassinato dá lugar à obrigação pelo malhete do Venerável. Mas Prichard (3ª edição, de 1730), indica quais são as ferramentas utilizadas pelos assassinos, que são (traduzindo literalmente) um malhete de assentamento, uma ferramenta para assentamento, um maço para assentamento. Isso não impediu que um ritual (que não é o de “Perau”) trouxesse tijolos, pedra cúbica e malho. Uma edição bem posterior torna ambos os vigilantes e o Venerável responsáveis ​​pelo assassinato, com um golpe na têmpora direita, um golpe na têmpora esquerda, em seguida, um golpe na testa dado por este último, que mais tarde pergunta “o que vocês fizeram?”. “Uma representação do nosso mestre Hiram, morto por ter se recusado a revelar os segredos da Maçonaria.”

O erguimento é feito pelos cinco pontos do maçom após duas falhas com o indicador e o dedo médio, e a palavra do mestre, Mac Benac, é dada em duas etapas: Mac no ouvido direito e Benac no ouvido esquerdo. Mas Perau mudou completamente o significado ao falar, pela primeira vez, na lenda de Hiram, sobre a decomposição do corpo: “A carne deixa os ossos”. Este aspecto não foi tomado da lenda de “Noé”. Prichard e Gabanon tinham feito puxar a ponta dos dedos sem indicar a causa e, segundo eles, Mac Benac significava “O Mestre foi atingido”, que Nicolas Bonneville, em 1788, em sua tradução de “A Maçonaria dissecada” deu como “o construtor foi atingido”, significado que se mantém na Inglaterra. Outra inovação devida a Gabanon e retomada por Perau é o sinal feito com uma mão acima da cabeça e que é o prelúdio para o sinal de horror com ambas as mãos. E quanto ao sinal atual?

A escolha da acácia jamais teve seu segredo elucidado. Sua colocação sobre o túmulo levantou duas explicações, uma para a marcação do local, o outra para decorar, uma preocupação curiosa por parte de assassinos. Ele era “musguenta” de modo visível e a verdura a tornava decente. Sem dúvida, os autores da história cederam inconscientemente ao antigo costume de plantar flores ou arbustos em sepulturas, um resquício das crenças dos antigos de que a alma dos mortos se manifesta através deles.

O ritual de mestre sofreu algumas alterações durante as décadas que se seguiram às suas primeiras codificações, mas incluiam apenas pequenos detalhes que se desvaneceram com o tempo. Estabilizado na década de 1780, seu profundo significado se espalhou muito lentamente e, mesmo assim, só durante o século XIX. Contudo, a história de Hiram, lida quando da recepção, conheceu belos enredos criados por conta da imaginação dos escritores, e já falamos sobre a gênese e evolução dos altos graus, corolários do assassinato do arquiteto de Salomão.

Decorre do exposto que a assim chamada tradição iniciática operativa é estritamente imaginária, e que, neste caso e por consequência, uma filiação “operativos-especulativos” prova-se inexistente.

A ritualística maçônica não nasceu de uma eclosão do Céu. Sua criação é artificial, obra humana, e, como qualquer obra humana, se seu parto ocorreu com alegria e esperança, foi hesitante, sujeito aos erros, às mudanças de todos os tipos, e foi penoso.

Há a “tradição maçônica”, de fato iniciática, mas não no sentido guenoniano[28] da palavra iniciação. Foi a nobreza de nossos predecessores que levou, dia após dia, à constituição de “uma Ordem” retomando o que, nos diversos esoterismos – orientais, gregos, judaicos, cristãos – estava bem além da mediocridade cotidiana. E foi esta mesma nobreza que fez com que eles estabelecessem um princípio e, acima de tudo, aceitassem o esforço de cumpri-lo.

E ela tem a verdadeira “Iniciação”, aquela “que coloca no caminho,” aquela que dá ao virtual iniciado o poder da reflexão, da vontade, da verdade e da esperança acumulados por dois séculos e meio por estes incontáveis e anônimos irmãos ​​animados por uma fé inabalável na humanidade e em seu futuro.

O reverso da medalha é a história e sua verdade cruel.

O anverso da medalha, o homem em sua verdade eterna.

[1] Neste caso, Lojas na sua acepção original, ou seja, deAlojamentos (N.T.)
[2] Traduzimos por revelações o que o texto original chama dedivulgations. Talvez pudesse ter sido traduzido por vazamentos. (N.T.)
[3] Escudeiro, em inglês. (N.T.)
[4] A Guerra Civil Inglesa, na década de 1640 e a Revolução Gloriosa, na década de 1680. (N.T.)
[5] Cabeça do Rei (N.T.)
[6] Louis de Prata (N.T.)
[7] Regras e Deveres da Ordem dos Franco-maçons do Reino da França (N.T.)
[8] Não esqueçamos que Loja significa Alojamento (N.T.)
[9] O texto original diz obrigação (N.T.)
[10] No sentido de “coluna mestra”, “coração” etc. (N.T.)
[11] Old Charges, no original (N.T.)
[12] Imagino, pelo que o autor afirma, que os franceses tenham alguma dificuldade em aceitar que tenham existido lojas inglesas na França (N.T.)
[13] Telhador
[14] Cântico dos aprendizes
[15] Pesquisas sobre as iniciações antigas e modernas (N.T.)
[16] O tonel entornado ou reflexões sobre a alegada descoberta da Ordem dos maçons (N.T.)
[17] A Instrução dos Grande Professos
[18] Não no REAA da GLESP (N.T.)
[19] Queda dos jacobinos? (N.T.)
[20] Uma tábua sob a qual havia bolas e sobre a qual o aprendiz deveria se equilibrar. A balança citada tem a mesma finalidade. É uma tábua com um cilindro transversal em seu centro, sobre a qual o aprendiz deveria caminhar. (N.T.)
[21] Selo Rompido (N.T.)
[22] Talvez o equivalente a N.V.P.D.S.S., mas em outra situação? (N.T.)
[23] O texto original diz “boette d’or” mas o livro de Prichard diz, em inglês “Bone Bone box” (N.T.)
[24] Prichard diz Cabo de reboque de 9 polegadas ou um palmo(N.T.)
[25] Segundo o Houaiss, na Idade Média, armadura completa de cavaleiro europeu N.T.)
[26] Revolução Francesa, ocorrida entre 1789 e1799 (N.T.)
[27] O texto original diz le pouce appuyé sur la première et grosse pointure. Não sei o que significa (N.T.)
[28] Referência à René Guénon (N.T)