OS FRANCOS MAÇONS E OS CAVALEIROS TEMPLÁRIOS
Por Michael Baigent e Richard Leigh
“Apesar das proibições papais, a Franco-Maçonaria Jacobita seguiu seu próprio caminho, ainda firmemente alinhada à causa Stuart e ao sonho de reconduzir os Stuart ao trono britânico. De forma ainda mais explícita do que jamais fizeram antes, os Jacobitas começaram a usar a Franco-Maçonar9ia e a crescente rede de Lojas no Continente, primeiro para recrutamento e depois, após a sua derrota, para apoio e suporte aos exilados Irmãos em perigo. Em 1746, por exemplo, um inglês Jacobita chegou à França trazendo cartas que pediram a todos os franco-maçons que acorressem em sua ajuda.[1]
Mas se os Jacobitas assim exploravam a Franco-Maçonaria para fins políticos, eles também publicamente a reintegravam aos elementos de sua própria origem e herança – elementos, esses, que haviam sido “peneirados” pela Grande Loja. Influenciado por Fénelon, Ramsay reinvestiu a Franco-Maçonaria Jacobita com um caráter místico. Mais importante ainda, ele reintroduziu, em sua “Oração”, uma dimensão especificamente cavalheiresca, ressaltando o papel dos “Cruzados”. Mais tarde ele falaria da tentativa de reconduzir os Stuart tal como nada mais do que uma “Cruzada”[2]. Em cartas trocadas entre as Lojas na época, falava-se muito de “inovações introduzidas...que tinham o objetivo de transformar a Fraternidade de uma Ordem Secreta” para uma “Ordem de Cavalaria”[3]. Folhetos e até relatórios policiais começaram a falar de “novos Cavaleiros” e “esta Ordem de Cavalaria”.
Se a Grande Loja estava evoluindo para um adesivo social, a Franco-Maçonaria Jacobita aspirava a algo marcadamente mais dramático, mais romântico, mais grandioso – uma nova geração de místicos cavaleiros e guerreiros encarregados da elevada missão de reclamar um reino e de reconduzir uma linhagem de sangue real ao seu trono. Os paralelos aos Templários eram por demais óbvios para ser ignorados, e seria apenas uma questão de tempo antes que eles fossem invocados como precursores da Franco-Maçonaria
Não está exatamente claro quando foi que – na privacidade das Lojas, cujos registros, se é que eles existem, desde há muito se perderam – as conexões entre à Franco-Maçonaria e os Templários foram explicitamente estabelecidas. Tudo leva a crer que isso se deu em 1.689, quando David Claverhouse chegou à França, supostamente trazendo a cruz Templária que fora recolhida do corpo de seu irmão e entregue ao abade Calmet. Porém, enquanto podemos apenas especular sobre esse fato, não há dúvida de que na década de 1730, sob os auspícios de Radclyffe e Ramsay, o legado Templário estava sendo propagado. Em 1738, logo após a “Oração” de Ramsay, o marquês d´Argens publicou um artigo sobre a Franco-Maçonaria. Nesse trabalho, ele fala sobre Lojas Jacobitas que tentavam reivindicar para si uma específica linhagem “Templaria”. E, ao longo da década seguinte, os Templários – pelo menos no que tange a todas as formas de Franco-Maçonaria, exceto a Grande Loja – tornavam-se, cada vez mais, o fato das atenções. Em 1743, por exemplo, acredita-se que o assim chamado Grau de “Vingadores” (Vengeance) ou “Kadosh”, tenha sido introduzido em Lyon – vingança a ser cobradas pela Franco-Maçonaria pela morte de seu último Grão-Mestre Templário, Jacques De Molay.
O principal responsável pela divulgação do legado Templário na Franco-Maçonaria foi o nobre alemão barão Karl Gottieb von Hund. Tendo ingressado primeiramente numa Loja em Frankfurt, Hund, um homem do mundo, viajava com frequência, circulando nos meios franco-maçônicos. Entre dezembro de 1742 e setembro de 1743, ele estava em Parias. No início da década de 1750, ele começou a anunciar uma ostensiva “nova” forma de Franco-Maçonaria que reivindicava, especificamente, uma origem Templária. Ao ser pressionado para se justificar, Hund declarou que, durante a sua visita de nove meses a Paris, ele fora introduzido à “Franco-Maçonaria Templária”. Ele chegara seis meses antes da morte de Ramsay, três anos antes da de Radclyffe. Segundo disse, ele havia sido iniciado aos “Graus Superiores” e ao de “Cavaleiro Templário” por um “desconhecido superior”, que se identificou apenas pelo apelido de Eques a Penna Rubra – “Cavaleiro da Pluma Vermelha”. Conforme sua declaração, a cerimônia foi realizada na presença de, entre outros, um certo lorde Clifford (provavelmente o jovem lorde Clifford de Chudleigh, parente de Radclyfrfe por aliança) e o conde de Kilmarnock. Diz Hund que, logo depois de sua iniciação, ele foi apresentado, pessoalmente a Charles Eduard Stuart e que tudo leva a crer que este era um dos “desconhecidos superiores”, se não, de fato, o secreto Grão-Mestre, de toda a Franco-Maçonaria.
A forma de Franco-Maçonaria à qual Hund fora introduzido é aquela que mais tarde seria conhecida como “Estrita Observância”. Esse seu nome é derivado do juramento ao qual ela obriga – um juramento de inabalável e inquestionável obediência – aqueles misteriosos “desconhecidos superiores”. O dogma básico da Estrita Observação era que ela descendia, diretamente, dos Cavaleiros Templários. Os Membros da Estrita Observância achavam que tinham o legítimo direito de se chamarem “Cavaleiros do Templo”.
Para seu próprio embaraço, Hund, ao ser pressionado para dar mais informações e provas, foi incapaz de sustentar as suas reivindicações. Em consequência, muitos de seus contemporâneos passaram a rejeitá-lo, considerando-o um charlatão, e o acusaram de ter inventado a história de sua iniciação, a história de seu encontro com “desconhecidos superiores” e com Charles Edward Stuart, e seu mandado de disseminar a Estrita Observância. A todas essas acusações, Hund apenas podia lamentavelmente responder que os seus “desconhecidos superiores” o haviam abandonado. Disse que eles haviam prometido voltar a contatá-lo para dar-lhe outras instruções, mas isso nunca aconteceu. Até o final de sua vida, ele continuava a afirmar a sua integridade, sustentando que havia sido desertado por seus patrocinadores originais.
Pela retrospectiva história, está claro agora que Hund foi vítima, nem tanto de alguma deliberada traição, mas de circunstâncias que estavam além do controle de todos. Ele fora iniciado em 1742, quando a aceitação Jacobita ainda era boa, quando os Stuart desfrutavam consideráveis prestígio e influência no Continente, quando parecia haver uma razoável perspectiva de reconduzir Charles Edward ao trono britânico. No entanto, em três anos, tudo isso mudou.
Em 02 de agosto de 1745, Bonnie Prince Charlie, sem o apoio francês que originalmente lhe fora prometido, desembarcou na Escócia. Durante um Conselho de guerra, foi decidido por voto avançar em direção ao sul, e as forças Jacobitas, iniciaram uma marcha rumo a Londres. Entraram em Manchester e, em 4 de dezembro, chegaram a Derby. Porém, poucos voluntários uniram-se a eles – apenas 150 homens em Manchester – e os levantes espontâneos que esperavam encontrar, jamais aconteceram. Depois de dois dias em Dervy, ficou dolorosamente óbvio que a única opção seria a retirada. Com as tropas Hanoverianas a caminho os Jacobitas retrocederam, e a sua situação, ao longo dos quatro meses que se seguiram, continuou a se deteriorar. Finalmente em 16 de abril de 1746, eles foram encurralados pelo exército do duque de Camberland em Culloden e, em menos de 30 minutos foram praticamente aniquilados. Charles Edward Stuart, mais uma vez, fugiu para um vergonho exílio, passando o resto de seus dias na obscuridade. Dos proeminentes Jacobitas que sobreviveram à batalha, muitos foram deportados, banidos, ou induzidos ao exílio voluntário. Alguns, inclusive o Conde de Kilmanock, foram executados. O mesmo se deu com Charles Radclyffe, capturado num navio francês no largo de Dogger Bank. O sonho Jacobita de reconduzir os Stuart ao trono britânico estava, assim, acabado de uma vez por todas.
Então, não é de se surpreender que os “desconhecidos superiores” de Hund que eram proeminentes Jacobitas, jamais voltassem a contatá-lo. A maioria deles estava morta, na prisão, no exílio, ou no limbo. Não havia restado ninguém de prestígio que pudesse ajuda-lo a reivindicar suas alegações, restando-lhe propagar sozinho a Franco-Maçonaria da Estrita Observância. Mas, certamente, não parece que ele tenha sido um charlatão, ou ter inventado o relato de sua iniciação na Franco-Maçonaria Templária”. Na verdade, foi apenas recentemente que vieram à luz algumas esclarecedoras provas em seu favor.
Uma parte das provas de Hund, no que concerne à linhagem da Estrita Observância, consiste de uma lista de Grão-Mestres dos Cavaleiros Templários originais, desde os seus primórdios em 1.118. Até recentemente, havia muitas dessas listas, sem existir muita concordância entre elas, sendo todas elas, sob o ponto de vista acadêmico suspeitas. Foi somente em 1982 que nós próprios formos capazes de produzir aquilo que pode ora ser encarada como uma lista definitiva dos antigos Grão-Mestres (até a perda de Jerusalém). Essa lista foi compilada com a ajuda de informações e documentos que não estavam disponíveis ou acessíveis na época de Hund; então, seria impossível que ele tivesse se baseado nas mesmas fontes que as nossas. Ainda assim, exceto pela pronúncia de um único sobrenome, ele produziu uma lista, supostamente recebido de seus “desconhecidos superiores”, que corresponde precisamente à nossa. A lista produzida por Hund somente pode ter vindo de “fontes internas” – de fontes que eram, de fato, privadas à história Templária e/ou de registros que nenhum “estranho” da época poderia ter.
A segunda evidência, uma prova particularmente importante em favor de Hund, envolve a identidade do “Cavaleiro da Pluma Vermelha” que, conforme alegava, o iniciou no Grau de “Cavaleiro do Templo” em 1742. Até agora, a identidade desse indivíduo continuava um mistério e, em alguns lugares, ele era tido como pura ficção. Como já vimos, o próprio Hund inicialmente achava que o “Cavaleiro da Pluma Vermelha” era Charles Edward Stuart. Outros comentaristas sugerem o conde de Kilmarnock, Grão-Mestre da Franco Maçonaria Jacobita na França naquela época; porém, ao fazerem tal conjetura, eles se esquecem, ou preferem ignorar, a afirmação feita por Hund de que Kilmarnock estava presente no recinto no mesmo momento em que também estava o homem daquele pseudônimo. Nós mesmos, num trabalho anterior, sugerimos que o “Cavaleiro da Pluma Vermelha” poderia ser Radclyffe, o qual Hund não diz estar presente. No entanto, agora, é possível estabelecer, de forma quase que definitiva, quem era, de fato o “Cavaleiro da Pluma Vermelha”.
Em 1987, nós tivemos acesso a papéis e documentos de um grupo chamado Stella Templum que, ao longo de 200 anos, ou mais, mantiveram um arquivo de material Templário Jacobita. Nele encontramos uma carta datada de 30 de julho de 1846 – 19 dias antes do centenário da execução do conde de Kilmarnock na Torre de Londres, em 18 de agosto de 1746. A assinatura daquela carta parece ser a de um “H. Shyte” e, abaixo dela, há um lacre de cera com um selo com a forma de uma cruz Templária. O destinatário daquela carta é chamado, simplesmente de “William”. O texto menciona certos paramentos, entre os quais, aparentemente, a própria espada com a qual Hund fora iniciado:
“Observe que a espada e outros itens estão agora ao seu encargo. O conde não conseguiu leva-los, Mr. Grills e pensamos ser você quem pode melhor guarda-los. Pobre velho Kilmanock – que Deus o abençoe – recebeu a espada de Alexander Seton – o “Cavaleiro da Pluma Vermelha”.
Não sei o que acontecerá doravante, queira Deus que você e Gardner continuem por cem anos.
Recorde K, no dia 18 do próximo mês”.
Se essa carta é digna de crédito – e, certamente, não há razão alguma para duvidar de sua autenticidade – o seu autor sabia que o “Cavaleiro da Pluma Vermelha era Alexander Seton.
Alexander Seton era mais conhecido, em geral, como Alexander Montgomery, décimo conde de Eglinton. Em 1600, Robert Seton foi eleito o primeiro conde de Winton. Ele se casou com Ladyu Margaret Montgomery, filha e herdeira de Hugh Montgomery, terceiro conde de Eglinton; e o título Eglinton foi herdado pelo seu filho caçula, tendo os seus descendentes adotado o sobrenome de Montgomery. Assim, o Alexander Seton em pauta era, de fato, Alexander Montgomery, que era particularmente ativo na Franco-Maçonaria Jacobita no continente. Por exemplo, quando o Cavaleiro Radclyffe morreu, em 1743, a sua certidão de óbito foi assinada por Alexander Montgomery (conde de Eglinton), Charles Radclyffe (conde de Derwentwater), Michael de Ramsay (primo do Cavaleiro), Alexander Home e George Leslie.
Por que teria sido Alexander Montgomery (Seton), em vez de Radclyffe.Ramsay, Kilmanok, Charles Edward Stuart, ou qualquer outro, que iniciaria o barão von Hund como “Cavaleiro do Templo”? Sem dúvida porque ele era descendente da família ao redor da qual, na pessoa do misterioso David Seton, os sobreviventes originais dos Templários na Escócia se reuniram quando suas propriedades foram ilegalmente dispostas por Sir James Standilands em 1564. E, caso as informações que recebemos de um membro da família forem corretas, uma “Ordem do Templo” continua existindo entre alguns dos Montgomery de hoje.
Segundo os cálculos feitos sobre a rebelião de 1745, a Franco-Maçonaria Jacobita, como tal, com a sua orientação política e obediência aos Stuart, efetivamente se extinguiu. No entanto, suas variantes purgadas do conteúdo político e temperadas pela moderação da Grande Loja da Inglaterra, sobrevivem. Elas sobreviveram, em parte, por meio dos assim chamados “Graus Superiores” oferecidos por instituições tais como a Grande Loja Irlandesa. No entanto, mais importante ainda, elas sobreviveram na Estrita Observância propagada por Hund – da qual, o mais elevado Grau era o de “Cavaleiro Templário”. A Estrita Obediência haveria de se espalhar por toda a Europa. E, no entanto, mais significante ainda é que ela haveria de encontrar solo fértil entre os colonos – muitos dos quais eram refugiados ou deportados Jacobitas – onde viria a ser os Estados Unidos da América”.
Texto extraído para simples leitura e estudo, do livro O Templo e a Loja, por Michael Baigent e Richard Leigh, Editora Madras.
[1] Chevallier, Histoire de la Franc-Maçonnerie Française, vol. I, p. 70
[2] A New Crusade to Re-Estabilish the True Monarch of Great Brintain”, ibid.
[3] Diz-se que a fonte dessas mudanças teria sido Charles Radclyffe.
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