OS MAÇONS ARQUITETO DA RAZÃO
Tradução J. Filardo
Por Victor Guerra
Por uma Latomia reformata, semper reformata
Após episódios negros que ocorreram na maçonaria espanhola nesses últimos meses, em que a Regularidade maçônica como se refere, pelo menos seu Grão-Mestre Óscar de Alfonso, deixou um rastro de notícias, ações e rancor, podemos mudar o terço e falar sobre se os maçons somos realmente isso o que o título do post diz: arquitetos da razão
Quando a Maçonaria se afasta dos focos quase comuns dos tópicos usuais, o que pode variar desde considerá-la como uma sociedade de árvores genealógicas rançosas de caráter pseudo-bíblico focada no crescimento pessoal; ou situá-la no outro extremo como o fruto de obras do mal e, portanto, fácil imaginá-la como uma sociedade secreta terrível incrustada nos cantos mais escuros do sistema econômico e político, onde sua suposta inclusão no Bilderberg pode ser um exemplo
E, no entanto, apesar de todas essas especulações imaginárias que foram exploradas desde as próprias lojas maçônicas até os renomados demagogos da Antimaçonaria, como o grande revelador Leo Taxil, e suas chaves para descobrir os grandes segredos maçônicos que manejavam o universo, no entanto, quando se estuda, vê-se, observa-se e vive-se a atividade maçônica que nada mais vê que a tentativa utópica do império da razão.
Se algo foi, e é maçonaria, é necessário dizer sem papas na língua que é uma grande construção humana, e desde a perspectiva da Maçonaria liberal, hoje podemos dizer que é a obra da racionalidade, e onde “sua ação intriga mais que inquieta e é por isso que não foge da mitologia » (A. Keghel).
Quando se sondam as lendas maçônicas, principalmente através das histórias bíblicas, já que elas dão sustentação à Maçonaria na forma de alegorias, além de articular o primeiro universo de referência construtiva que, por outro lado, será consignado nos catecismos da antiga franco-maçonaria das Antigas Obrigações formando assim os arquétipos que moldaram o imaginário maçônico.
Entre essas grandes referências ao trabalho construtivo, há três marcos principais: de um lado, a Torre de Babel, de outro, o Templo de Salomão e, finalmente, a figura do Mestre Arquiteto Hiram Abif.
Toda essa construção arquetípica em conjunto com outras articulações referenciais de menor entidade compõem o grande arquétipo construtivo da maçonaria moderna, que é o que, finalmente, de toda uma jornada terminará por dar origem a uma nova Maçonaria como os Arquitetos da Razão, em uma nova chave como é o Cosmopolitismo.
Uma construção de todos, nascida sob a utopia de 1717 e no calor das tavernas inglesas que reuniam o mundo iconoclasta eclesiástico dos racionalistas, simbolistas e libertinos latitudinários, uma autêntica Torre de Babel humana em busca de uma utopia nebulosa que ensaiava com a organização da primeira Grande Loja de Londres, uma tentativa primária mesmo com a “palavra perdida” de buscar a verdade à luz da razão.
Ao final se queria deixar a estranha certeza da fé e seus servos, e ainda que a necessária concordância de uma busca conjunta ainda não mediatizasse, buscou-se como primeiro passo naquele estágio semirreligioso inglês algo que não fosse além de constituir-se um “Centro de União”.
Mas essa busca será a germinação da semente que inicia uma longa jornada no escrutínio dos caminhos do conhecimento para encontrar a “linguagem universal” que permitisse aos homens livres se reconhecer como tais e, portanto, caminhar em direção àquela construção universalista, mítica e mitológica que simbolizará o Templo de Salomão, do qual tantos nos falam os textos maçônicos e que não deixa de representar outra coisa senão a ecúmeno.
Esse espírito de busca permanente atravessará o Canal da Macha, deixando para trás o imoralismo cínico para se construir como a verdadeira metáfora dos Arquitetos da Razão, colocando uma ênfase maior, não tanto na união com o establishment religioso e político, como aconteceria na Inglaterra e, assim, ser o Centro de União andersoniano que reunisse os crentes, mas muito pelo contrário esse novo caminho deixa parte dessa posição e se dedica a percorrer o caminho de maneira inversa, para construir um novo simbolismo fundamentalmente ligado aos conceitos republicanos e racionalistas que emanavam das Luzes, procurando uma maneira de não converter a nova utopia em uma religião ou filosofia, pela qual “eles se oporão aos sinais nos espaços e tempos de forte polarização nos edifícios espelhados nos sistemas simbólicos” (Pascal Ory).
Desde 1717, ocorreu uma abertura incomparável, quebrando não só as fronteiras espaciais, mas outra ainda mais difícil, qual seja a fronteira intelectual e conceitual da qual os homens são e devem ser desiguais, mas que, apesar disso, o cosmopolitismo maçônico buscará que a partir da dissensão, todos eles “possam reconhecer-se como iguais”, para poder construir não alegoricamente, mas a partir da práxis, o ecúmeno, o cosmos que será fundado a partir da cultura da mobilidade.
Será a partir da maçonaria francesa pré-revolucionária que essa cultura de início e será quando se colocam as primeiras pedras basais e se propaga a “arte de fazer as pessoas iguais sem que nada percam de sua categoria e sua distinção” (Alain Keghel).
Para isso, será necessário construir esse Templo Salomônico imaginário, mas não cheio de colunas, ou artesanatos que tanto Salomão quanto o mítico Hiram Abif haviam construído metaforicamente como um modelo do conhecimento antigo, embora também deva-se dizer que fora levantado a partir dos planos da diferença e da desigualdade.
Agora, os novos arquitetos, deixando de lado a caridade cristã que impede a justiça, já que dessa forma a ordem social das desigualdades é garantida, fundamentando uma possível mudança na esperança, daí que nas lojas em sua evolução para um novo conceito como a caridade, terão que articular todo um edifício simbólico-ritual de livre circulação baseado fundamentalmente em um novo pilar como é a filantropia, que toma como base fundamental de seu desenvolvimento o secularismo, em uma geometria variável que finalmente modelará o movimento maçônico em dois grandes continentes, um da autodeterminada Maçonaria regular representada pela GLUI, e do outro lado aquela que representa o mundo maçônico variado reivindicado como adogmático.
Será nesse último em que existem muitos elementos simbólicos, muitas escolas, muitos ramos do conhecimento, que cimentarão a partir da diversidade geográfica, política, religiosa e mesmo linguística o novo cosmos universalista mitificado em querer e desejar ser o Centro da Unidade, cuja grande obra se unirá na convicção de acreditar firmemente no progresso da humanidade, quem clamam os rituais, mas cimentado todo ele a partir da secularização.
Isto supõe para os maçons abolir um presente quase perpétuo, na medida que hoje a democracia caiu em uma caricatura, por isso os novos Arquitetos da Razão devem repensar seu projeto social e filosófico não caindo no onanismo das lojas e obediências de que nos fala o ex-Grão-Mestre do GOdF: A. Bauer.
Os maçons precisam trabalhar do meio dia à meia noite para salvar essas grandes distâncias, além da Cadeia de União de seus pares, na medida em que seu trabalho é se afastar da religião e, embora seja secular, seu lugar está longe das revelações místicas, ou das pedras filosofais que vemos com tanta frequência em muitos dos perfis maçônicos, tanto dentro da estrutura como sua expressão em Redes Sociais como o Facebook.
Portanto, a nova maçonaria não deve ser o elemento central do crescimento pessoal, mas outro caminho muito diferente que deve conformar a opção de tornar a maçonaria uma Sociabilidade sob a convicção de que a reflexão e a instrução são as ferramentas para alcançar o desejado Centro da Unidade.
Portanto, é necessário passar à ação, que cada um escolha sua decisão por si mesmo, a partir da conceitualidade máxima de um maçom livre em uma loja livre, que não deixará de ser uma opção legítima de ser o Novum organum da República Universal dos Maçons.
Ou como bem se expressava Jacques-Georges Plumet, a nova República Planetária, assim como os irmãos maçons em 1868 da Amis Philathropes, verdadeiro laboratório de iniciativas sociopolíticas e maçônicas, que criaram naqueles momentos de crise os Ateliers Reunis,cooperativa de alimentos apoiada pelo Município na pessoa do burgomestre e maçom Jules Anspach, que naquela época promoveu cemitérios abertos aos livres-pensadores, aos suicidas e aos mortos sem batismo, toda uma filosofia moral de natureza liberal e secular que promovia a construção de um projeto de sociedade.
Talvez nesses momentos tão abertos aos maçons como Arquitetos da Razão, lhes falte uma verdadeira cultura política de combate e crença no progresso, pelo menos da perspectiva maçônica, pois não é em vão, como dizia Brunno Etienne que “a Maçonaria liberal perdeu sua espiritualidade, sua própria identidade e foi persuadida pela esfera política profana, e esse é o grande perigo que corre».
Mas isso não deve significar abandonar a utopia que começou em 1717, com a quebra de um mundo quase feudal e religioso, mas que manter essa firme crença no progresso da humanidade e chegar a ser o Centro da Unidade deverão ser os novos esquadros e compassos para traçar o novo mundo a partir da Razão.
Publicado em https://www.victorguerra.net/
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